Palavras Perdidas

Também não havia ninguém na casa de Morven.

O velho escriba era outro amigo Harald Althaus que G'eldrae procurava para tentar descobrir o que tinha acontecido com seu Althaus, mas mais uma vez a drow não teve sucesso. O que estava acontecendo com os escribas de Erin? Orlyana visitou Edd Mataverde, famoso historiador e romancista que vive em Lochgarman, foi até a casa de Daividh Cook e de seu irmão Monty, ambos estudiosos do Multiverso, um assunto deveras enfadonho para G'eldrae, na cidade litorânea de Brevis, dois dias ao norte de Lochgarman, e foi até a casa de Margh Henrik, um homem do reino de Ereborn, no continente do outro lado do Mar Fomoraig que adotou Erin como sua terra e que hoje vive em Aunios. Margh é conhecido por catalogar e estudar criaturas sobrenaturais, um assunto muito mais interessante que o dos Irmãos Cook. Mas, independente disso, nenhum deles estavam em suas casas, e agora o mesmo com Morven. Isso é demais para ser coincidência.

G'eldrae tinha consigo a carta de Harald, assim como o manuscrito em que ele trabalhava, e aquilo parecia pesar. A drow sentia o corpo e a mente exaustas da viagem e da preocupação com o amigo e, agora, somou-se o sumiço de outros cinco escribas, todos amigos de Althaus. O sol brilhava forte no céu e, apesar do vento frio que ajudava a amenizar os efeitos e trazia lembranças gélidas da terra natal de Orlyana, o incômodo da luz intensa em seus olhos era maior. G'eldrae conhecia Bryn bem o suficiente para saber que haviam bons lugares para comer e passar a noite, caso fosse preciso. Algo ainda fez a drow bater uma última vez na porta da casa de Morven mas, como já era esperado, não houve resposta alguma.

Olhando pela janela, G'eldrae não vê nada além de móveis no escuro da casa. Pelo jeito a drow teria que usar sua "chave" para conseguir informações mais concretas sobre o que estava acontecendo.

Ela se posiciona cautelosamente atrás da casa, onde havia uma entrada menos visada e observou em volta vendo que estava relativamente segura pôs-se a trabalhar na porta.

G'eldrae precisou dar a volta em três casas e passar por uma pequena praça com a estátua de um homem no centro antes de chegar aos fundos da casa. Oito casas, incluindo a de Morven, formavam um beco não muito estreito. As duas menores casas, uma delas enfiada no vão entre a casa de Morven e um sobrado que havia ao lado, tinham suas únicas portas voltadas ao beco, o que fez a drow se precaver ao máximo antes de tentar abrir a porta da casa do amigo de Harald.

O silêncio no beco era grande e, ao contrário de tranquilizar Orlyana, a deixou um pouco nervosa, mas a fechadura era extremamente simples e a drow não teve problema em abri-la, entrando na casa com as ferramentas ainda nas mãos e fechando a porta rapidamente atrás de si. G'eldrae viu, enquanto guardava suas coisas, que estava na cozinha, e imediatamente a elfa notou o cheiro de comida azeda. A comida parecia ter estragado a não mais do que uma semana e também havia um cesto sobre a mesa com pães e frutas, todos mofados ou com manchas escuras e moles. A parede que dividia a cozinha da sala não tinha porta, apenas uma cortina preta feita com um pano pesado. No outro cômodo, G'eldrae não notou nada que lhe chamasse a atenção além do pó que se acumulava sobre tudo. Subindo as escadas, Orlyana chegou até amplo cômodo que servia de local de trabalho e quarto; não haviam paredes e duas amplas janelas decoravam as paredes norte e sul. A cama estava arrumada e, além dela e da mesa onde Morven trabalhava, todo o resto do cômodo era decorado por estantes abarrotadas e pilhas de livro sobre banquetas. Do teto pendiam dois lustres com espaço para muitas velas, mas nenhum deles tinham mais do que cinco, e todas derretidas além da metade. Sobre a mesa, havia o que parecia ser uma pilha sem fim de livros e papéis, penas de todos os tamanhos e vidros de tinta cheios e vazios. Um candelabro com duas velas maiores que as dos lustres estava quase no centro da mesa.

Procurando entre os papéis, G'eldrae não encontrou nada que se assemelhasse aos símbolos que Althaus lhe enviou, mas a ladina encontrou no chão, entre a mesa e uma das estantes, um pequeno livro de couro e papel amarelado.


Ele tinha muitos textos e anotações e, após um breve correr de olhos da drow, o assunto das duas últimas páginas escritas chamou a atenção de Orlyana. Eram trechos de texto e sugestões de tradução de palavras com grafias semelhantes às que haviam nas notas de Harald.

Ela lê com um pouco de atenção para ver se consegue entender algo e depois vai olhar o resto da casa em busca de mais pistas e sempre na furtividade é claro.

G'eldrae não consegue compreender nada do texto que está  escrito na mesma língua das anotações de Harald e não encontra mais nada de interessante na casa.

Hmmm  pensa em voz alta Creio que não será aqui que vou encontrar pistas talvez nas outras casas?
a ladina drow então pensa que talvez seja bom fazer a mesma vistoria que fez aqui nas outras casas dependendo de quanto isto possa demorar ela se retira da casa e se houver algo que chame a atenção e valha a pena embolsar porque não?

Orlyana sai da casa com um colar cravejado de pedras e o livreto no bolso. A drow já conhecia Bryn, tinha vindo outras vezes na cidade também por causa de Morven, mas em situações mais “tradicionais”. Dessa forma, G'eldrae se dirige até O Barril Cheio, uma taberna que gostava por ter um bom preço, uma comida descente e ninguém ficava bisbilhotando a vida dos outros.

A fachada d'O Barril Cheio era simples. Madeira sem pintar, as janelas estavam sempre abertas – eram fechadas apenas no inverno – e a porta sempre fechada. A placa da taberna, esculpida no formato de um barril, ficava pendurada sobre a porta e o ferro que a segurava rangia sempre que o vento fazia a placa balançar. O lugar estava quase vazio a essa hora, havia cinco ou seis pessoas, Cizar, o dono do lugar, e um bardo que conversava com uma garota. O cheiro de cerveja e madeira velha, algo que nunca mudava, inundou o nariz de G'eldrae assim que ela entrou na taberna.

– Boa tarde, G'eldrae – Cizar disse sem nenhuma animação na voz – Fique à vontade. Vai querer uma cerveja?

- Vou querer a de sempre. - Diz após pagar - Estou numa maré de azar, caro emissário do álcool e meus clientes sumiram sem deixar vestígio e isso não é bom. - Diz sentada em seu assento perto do balcão.

Cizar vai até um dos barris de carvalho atrás dele e enche uma caneca de cerâmica com uma cerveja amarelada.

– Sumiram... Como? – O taberneiro pergunta enquanto serve Orlyana – Antes de te pagar?

– Isso é estranho – Cizar disse com o cenho franzido – Eles não podem ter se reunido em algum lugar para debaterem ou algo do tipo?

Cizar pensou por um ou dois minutos antes de responder.

– Não sei dizer, mas já faz alguns dias. Ele não vinha muito aqui, mas eu sempre o via comprando algo no mercado ou comprando peixe do Pintado – Cizar parou o que estava fazendo e colocou as duas mãos sobre o balcão – Será que aconteceu algo?

- Muito provável.  Mercado? Peixeiro... Vale a pena dar uma olhada. - Diz G'eldrae se levantando do banco de madeira e com um movimento ela arrumou a dobra de sua roupa e mexeu o cabelo.  - Pela prosperidade de sua casa e saúde. - Diz e vai para o mercado.

Cizar se virou antes que G'eldrae se levantasse e a drow já estava na rua, em frente à porta da taberna, quando ouviu Cizar gritar de dentro d'O Barril Cheio.

– Ei, ei, ei! Você não pagou pela cerveja, G'eldrae!

Orlyana não viu outra alternativa a não ser voltar, mas quando a elfa negra se virou para a porta, uma mulher trombou com a drow, fazendo as duas caírem. G'eldrae mal teve tempo de entender o que havia acontecido e a mulher já estava de pé, completamente vermelha e suada. Ela voltou a correr antes mesmo de se levantar, empurrando terra com os pés e as mãos.

– O cão... – a mulher balbuciava – o cachorro do Oswine se soltou de novo!

G'eldrae não sabia quem Oswine era, mas a mulher, que terminou de se levantar aos tropeções, continuou a correr para longe dali, erguendo a barra do vestido com as mãos. Sem entender, Orlyana procurou por algo na direção de onde a mulher tinha vindo e, instantes depois, um animal enorme surgiu correndo na direção da drow. Ele devia ter pelo menos um metro de altura, era coberto por pelos escuros e não tinha uma expressão amigável.

G'eldrae teve uma fração de segundos para compreender o que passara desde do momento que tentou dar o "cachorro" na conta até se dar conta que vinha um de verdade e nada amigável.


- Mas que mer... -

G'eldrae consegue se levantar apenas para ver o cachorro saltar em sua direção. A drow tenta se desviar, tenta segurar o animal, tenta se virar para evitar a mordida, mas no fim, o cachorro consegue morder o braço de Orlyana, entre o pulso e o cotovelo, e a dor é imensa! Além da mordida, o animal tenta balançar a cabeça para os lados ainda com o braço da elfa entre os dentes, mas desiste e solta G'eldrae enquanto recua alguns passos para tentar outra mordida.

- Mas de onde é que vem essa coisa?  e dá uma estocada com sua espada.