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- Vou sentir tanta saudade – minha mãe diz pela centésima vez com o queixo apoiado em meu ombro enquanto me aperta em um abraço apertado e me beija sucessivamente na bochecha, o que estava começando a me dar vergonha, era óbvio que sentiríamos saudade, mas tinha que ter tanta demonstração de afeto no meio do aeroporto? - Eu também vou sentir saudade, mas se você não me soltar, eu vou perder o voo e ninguém mais vai sentir saudade de ninguém – ela me dá um último aperto e se afasta pra me olhar, agora que eu conseguia ver seu rosto vejo que seus olhos estão marejados de lágrimas, mas embora seu sorriso esteja fraco é possível ver em seu rosto o orgulho por eu ter sido selecionado para o programa de intercâmbio. - Não se esquece de me ligar assim que der – ela ordena limpando as lágrimas e me puxando para um ultimo beijo. Dou um passo para trás e me viro para Emma com os braços abertos, sei que por dentro ela está feliz por mim, mas seu semblante é triste, dois anos de namoro e agora ficaríamos afastados por quase 800 quilômetros por no mínimo 6 meses, e caso eu tivesse um desempenho satisfatório poderia ficar ainda mais, ela estava insegura, assim como eu. Ela pula em cima de mim e joga seus braços em volta de meu pescoço enquanto eu a seguro pela cintura e selamos nossos lábios em um beijo, o ultimo que daríamos por um bom tempo. - Volta pra mim está bem? – sua voz saiu em um tom de súplica, seus olhos olhando fundo nos meus. - Sempre – acaricio sua bochecha secando a lágrima que estava lá e aproveitando pra gravar suas feições antes de ir. Passageiros do voo 182 com destino à Londres por favor se dirijam ao portão de embarque. Me viro e dou um último abraço em minha mãe antes de ir pro embarque. Se eu estava nervoso? Mas é lógico, era a primeira vez que eu faria uma viagem de avião, que eu saia do país e que ficaria tanto tempo longe de casa, era muita primeira vez de uma vez só, mas eu estava indo, para Londres, minha casa pelos próximos meses. [...] Primeira coisa que você nota ao sair de seu país é a falta de pessoas falando a sua língua, eu entendia o que eles falavam, mas a todo momento eu esperava ouvir alguém pra começar a falar em alemão, mas não, era tudo em inglês desde que eu sai do avião e pus os pés no aeroporto, este que por sua vez era gigantesco. Fui revistado (mais uma coisa pra lista de primeiras vezes) e embora sempre tenha imaginado que fosse horrível a sensação, era ainda pior, reviraram toda a minha mala e me apalparam em lugares que nem sabia existir, ainda bem que já tinha sido avisado sobre essa possibilidade, então acabei por não arriscar trazer nada. Me deixaram em uma sala com uma tv, ninguém lá sabia me informar que horas que viriam me buscar, apenas falaram pra eu ficar à vontade e esperar. Aproveitei parte do tempo livre pra escrever mais algumas linhas do código que eu estava criando, mas quando tentei sair pra esticar as pernas fui barrado, pelo visto estavam com medo de que "eu me perdesse" no aeroporto, então eu estava preso ali dentro sem chance nem de um telefonema, porque meu chip da Alemanha não funcionava aqui. Depois de uma eternidade 3 horas um casal chega, e depois de alguns minutos de conversa descubro que eles eram brasileiros, sendo que a garota, Bárbara, estava fazendo o mesmo curso que eu, então provavelmente estaríamos na mesma sala em algumas matérias. Após certo tempo ficamos apenas sentados assistindo ao noticiário que estava passando na tv com alguns comentários ocasionais, era estranho ter que falar em inglês por tanto tempo. Por ter virado a noite me certificando que não tinha esquecido de por nada na mala, eu me retiro para um dos sofás, onde caio no sono enquanto alisava minha aliança, que eu tinha comprado 2 semanas antes pra Emma se acalmar em relação à viagem. Acordo 2 horas depois quando dois africanos chegam, eles e os brasileiros estavam se apresentando, mas eles falavam alto demais, acabo desistindo da ideia de voltar a dormir, já tinha dado pra recuperar um pouco da energia graças a essa soneca. Enquanto eu dormia tinha chego mais um garoto, Mark, um americano. Demoraram mais duas horas até que chegasse o último dos intercambistas, não demora até Gael entrar e se apresentar, felizmente ele mesmo sugere para irmos comer, o que pra mim é a melhor coisa que poderiam ter me oferecido, aquele lanche que serviram na sala era além de ruim, pouco, minha barriga estava com sérios problemas pra conter seus protestos pela falta de alimento. Pelo o que parece, nenhum de nós teve problemas com a bagagem, então vamos seguindo pra fora do aeroporto quando Mark começa a sussurrar sobre Gael ser gay. Estava tão cansado que nem tinha percebido, mas era bem possível, o jeito como ele andava, se vestia e talvez até seu perfume denunciasse isso. Não consigo conter uma pequena risada da imitação do garoto. - Se estiver muito interessado eu posso pegar o número dele pra você Mark – embora tenha achado engraçado a imitação do garoto, eu não era muito fã de humilhação pública, uma coisa é uma piada interna em um grupo de amigos, outra é uma zoação de desconhecidos no meio de outros desconhecidos, de alguma forma isso fazia sentido pra mim.
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