CAN YOU HEAR ME? #002
Quando Lexie chegou ao Acampamento estava completamente assustada. Deixar pra trás seu pai, que sempre foi o melhor amigo de todas as horas, por descobrir repentinamente que era “meio-sangue”, o que quer que isso significasse (e ela não entendia muito bem), era muita coisa pra lidar. Tinha também seu cãozinho Bóris e seu melhor amigo Tom. Sempre foi só Tom e Lexie todos os momentos desde que começou na escola primária. Agora ela não pode sequer manter sempre contato com eles para não colocá-los em situação de risco. Se comunicava com seu pai através de cartas semanais que eram enviadas pelo sistema interno do local. Sempre achou um saco não poder usar a internet como uma adolescente normal - o que de fato não era -, mas de certo modo até entendia que era para sua proteção e dos seus.
Lexie nunca teve lembranças sobre sua mãe Afrodite, já que ainda era bebê quando a Deusa partiu de volta para o Olimpo. Seu pai jamais conseguiu superar aquele amor todo, era completamente hipnotizado pela Deusa e isso o prejudicava até mesmo para prosseguir com outros relacionamentos amorosos. A primeira - e única - mulher que Peter apresentara à filha como sua companheira foi há dois anos e está com ela desde então. Jenny era legal, divertida e carinhosa, mas Lexie jamais conseguiu ter um olhar maternal para ela. Era simplesmente a namorada do papai e pronto, mas o que queria mesmo poder experimentar como era ter uma mãe de verdade em todos os sentidos, o que achava pouco provável.
Durante todo esse mês a garota se esforçou para tentar apreender todas as informações que recebia sobre si mesma, sobre seus poderes e habilidades, bem como sobre os perigos que corria e tudo que precisava saber sobre o local onde estava. Mas era muita coisa e muitas coisas ainda se emaranhavam em sua cabeça, principalmente no que tange aos traços mais marcantes dos filhos de Afrodite que Lexie, por sua vez, acreditava não ter. O que ela não sabia era que muitos garotos a observavam encantados, justamente pelo seu jeito imponente e destemido, além de sua beleza tão delicada que, ironicamente, contrastava com os traços que sua personalidade apresentava.
Depois de receber as boas vindas e descobrir que o garoto com quem conversava já estava ali há três anos até que se sentiu mais confortável. Afinal não era de todo tão ruim assim, ele parecia receptivo e sua visão sobre os filhos de Afrodite não a ofendia nem um pouco, já que era a mesma visão que tinha. Ouvia atenta as palavras dele e brincava com seu ioiô enquanto isso.
- Seria incoerente demais dizer que penso exatamente como você? Acho uma baboseira cultivar o exterior quando o interior é mais podre do que uma tumba. - sinalizou afirmativamente enquanto voltava o olhar para um ponto qualquer à frente. - O que quero dizer é que de nada adianta existir neste mundo louco para não buscar ser melhor, nem pra ser feliz por fazer as pessoas felizes também.
Lexie desviou o olhar para o garoto no exato momento em que ele sorriu e, inconscientemente ela já estava sorrindo também com as bochechas novamente rosadas. Aff, as vezes é um saco ser tímida, tudo a gente fica vermelha e isso entrega fácil nossas emoções! Resmungava em pensamento.
Quando o menino falou sobre amor, os olhos de Lexie brilharam. Era estranhamente bom ouvir aquelas palavras, principalmente quando se conectavam exatamente com tudo que sempre pensou.
- Isso ninguém pode mudar ou criar. O amor vem de dentro, não é algo que nada externo possa fazer acontecer de verdade. Aliás, eu odeio tudo que tente manipular isso. Afinal, a gente simplesmente ama, não é? - falava enquanto permanecia com os olhos nele. - Eu vim pra cá, porque estava entediada. Tô sempre sozinha, já que não consegui ainda encontrar o “meu grupo” por aqui. Definitivamente não me sinto parte daquele chalé e, se eu pudesse, estaria em qualquer outro. - desabafou, exprimindo em seu rosto o descontentamento com o que falara por último.
- Na verdade, pra ser sincera, eu tô com uma baita saudade do meu pai e do meu cachorro Bóris. Até quando isso dura? Porque me deixa realmente triste. - desviou novamente o olhar para evitar que seus olhos lacrimejassem.
Uma das piores coisas que existem para Lexie é estar onde não se sente bem. Ela não é do tipo de pessoa que se molda ao ambiente, apenas é o que é e pronto. Busca melhorar por si mesma, não pelos outros. E pensava que talvez o grande problema da humanidade seja o fato de as pessoas tentarem moldar as outras conforme suas próprias convicções, esquecendo de que a verdadeira nobreza reside em respeitar o outro exatamente como ele é, com virtudes e defeitos. Ninguém é igual (ainda bem).
- A propósito, me chamo Lexie, mas pode me chamar de Lex. E você, como se chama? - inquiriu curiosa.
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