But with you I've found the key To open any door I can feel my love for you Growing stronger day by day And I can't wait to see you again So I can hold you in my arms....
Naquele dia, a vida de Seraphine havia mudado completamente... E ela nem teve tempo de raciocinar o quão grave e maravilhosa seria aquela mudança. Após o seu novo dragão voar da praça, onde matara tantas pessoas, os habitantes começaram a olhar como uma desconhecida. Não era mais a filha dos Guias mais antigos da vila de Áries... Não era mais a amiga que ia até a escola... Ou a moça que ajudava os comerciantes. Ela era a domadora que parou o dragão... Ou será que ela o havia mandado?
Murmúrios... Muitos maldosos. As pessoas começavam a se aglomerar... Os guardas ficavam de pé, alguns já vindo em sua direção, tentando tocar seu corpo nu para a prender. Somente a voz da Imperatriz os impediu... Mas não impediu a falação do povo, um povo que pensara conhecer. Precisava de tempo para pensar. Sorriu para Dominiana, que tentava acalmá-la, mas não podia ficar ali no momento. Ouviu o chamado do seu dragão e sabia exatamente onde ele estava, embora não o visse.
Saiu correndo, desviando das pessoas, sem se importar com os olhares ou com as palavras. Sem se importar com os pés machucados quando chegou na área montanhosa e com a pele cortada pelos galhos das árvores da floresta. Só parou, exausta, quando viu o dragão e montou em seu dorso. Não precisou dizer nada, naquele momento. O dragão levantou voo, e ela sentiu o próprio corpo esquentar, apesar do vento batendo em sua pele desprotegida.
Era instintivo o controle do dragão, ao tocar nele com a mão da marca... Mas não era algo fácil. Por fim, não tentou controlar... Apenas voou com ele, ambos compartilhando a visão que o animal tinha. Ela sentindo o vento bater nas asas que não possuía e o calor na garganta, prestes a cuspir fogo. E cuspiu, a sensação era maravilhosa... Sentia como se o poder do dragão fosse o seu.
[...]
Voou por tanto tempo que acabou perto dos domínios de Touro. Não percebeu o quanto a ligação com o ser místico sugava a sua energia, só se libertando dele quando Bolcán o fez por própria vontade. Nesse momento, sua cabeça rodou, a visão voltando a si, o corpo também... Mas o equilíbrio, este não voltou. Não sabia como montar um dragão, não sabia onde segurar... Como havia chegado ali sem cair?
Como se ouvisse seus pensamentos, o dragão baixou o voo um pouco, voando rente às águas da praia... E logo subiu, íngrime, fazendo ela rolar pelo seu corpo enorme, conseguindo segurar apenas na calda do animal, ficando pendurada pelas mãos. O rugido dele foi tão alto e tão sarcástico que ela começou a xingar, com as mãos machucadas pela calda cheia de escamas pontiagudas. Tentou subir, conseguindo “montar” na calda, mas o dragão deu uma pirueta, mudando de direção e jogando ela pra longe... Fazendo a domadora despencar no mar.
Não estava alto o suficiente para morrer... Era só uma quedinha... Mas o dragão não tinha como saber que ela não sabia nadar... Ou tinha?
[...] Ethan havia acabado seus afazeres naquela tarde e resolveu cavalgar com Delfos, na costa. O dia estava lindo e era verão, por isso conseguiriam ver o por do sol maravilhoso da praia, após o passeio.
O cavalo trotava freneticamente pela areia fofa, aparentemente satisfeito com o vento batendo na crina... Mas, de repente algo mudou, uma sombra surgiu no céu. Delfos se empinou, ao ver o dragão voando tão perto, logo acima da água, tendo de ser domado pelo cavaleiro.
O taurino veria todo o espetáculo da domadora sendo lançada aqui e ali. Era engraçado... Talvez fosse uma criança aprendendo?.. Quando viu que era uma mulher adulta e nua, talvez aquilo começasse a chamar ainda mais a sua atenção.
Que diabos tava acontecendo ali?
A brincadeira pareceu ficar um tanto perigosa quando o dragão não conseguiu pegar a mulher e ela caiu no mar. Ele continuava rondando, mas não podia entrar ali. Voou na direção do cavaleiro e seu cavalo, rugindo alto e indicando a direção da domadora.... Que subia e voltava da água, mas não parecia se aproximar da praia.
- É, meu caro Delfos, merecemos uma trégua agora, não acha? - falou Ethan enquanto acariciava a crina muito bem penteada do seu cavalo. Era um cavalo negro, muito bem cuidado, cujo pêlo reluzia ante os reflexos de luz que lhe alcançavam. O trato com os cavalos era uma das qualidades de maior destaque entre os cavaleiros Descendentes de Touro. Não só com relação a aparência daqueles animais, como também todo o adestramento e treinamento para as mais diversas situações. Era importante que estivessem bem preparados para qualquer surpresa que pudesse surgir, nunca se sabe quando algo de estranho pode acontecer, ainda mais em Signum.
- Praia? Certo, vamos pra lá ver o sol se pôr então! - era inexplicável a conexão entre os dois, conversavam e realmente conseguiam se entender. Ethan sabia ler todos os sinais que Delfos lhe dava. Dispararam por entre a floresta para alcançar o litoral. Delfos desviava com maestria de todos os obstáculos que apareciam diante dele e sua agilidade era notável. Ethan sempre sentia-se cheio de vida ao montar em seu cavalo, impossível definir em palavras aquela sensação.
Chegando à praia, Delfos trotava na areia e arfava de satisfação. Ethan apenas sorria, sentindo-se feliz por satisfazer seu amigo. Depois de tanto trabalho e esforço que fizeram durante o dia, era o mínimo que poderia lhe proporcionar. Estava tudo bem, até que uma sombra pairou sobre os dois. Ethan logo percebeu que era um dragão e Delfos se agitou, empinando e soltando um longo relincho. O cavaleiro seguiu a sombra e ao ver a jovem adulta despida escorregando do dorso do dragão, se sustentando pela cauda do mesmo, ele não acreditou.
Quando se deu conta, a mulher de pele clara e cabelos quase brancos, já havia caído no mar. O dragão lhe indicou o caminho e o rapaz logo entendeu. A moça parecia não saber nadar e imediatamente Ethan saltou de Delfos, correndo e deixando pelo caminho partes da sua armadura, restando apenas as calças em couro envelhecido em seu corpo. Qualquer metal iria lhe atrapalhar naquele momento.
Ethan correu por entre as águas e quando bateu no seu quadril ele mergulhou, dando braçadas largas ao voltar para a superfície, alcançando rapidamente a moça já quase desfalecida. Ele a apoiou por sobre suas costas, segurando-a com um braço, enquanto o outro remava. A correnteza ajudou e não demorou muito até que conseguissem alcançar a areia. Ethan imediatamente a deitou e fez um movimento frenético no peito da moça para acordá-la. Não surtiu muito efeito, então ele encostou a boca na dela, fazendo respiração boca a boca com o intuito de encher novamente os pulmões da desconhecida com ar.
Em questão de segundos ela engasgou, tossiu e colocou pra fora a água que havia engolido. Seus lábios já estavam pálidos e, por estar nua, seu corpo tremia. Ethan imediatamente correu até a sua capa que tinha deixado pela areia enquanto corria e a envolveu na mulher para aquecê-la. Delfos se aproximou curioso e arfou encostando o focinho na cabeça do seu dono, como se quisesse lhe dizer alguma coisa. Claro! Ele tinha que perguntar como a mulher estava! Ethan não sabia bem o que fazer em situações como aquela que exigiam dele mais tato com as pessoas, mas ainda bem que tinha Delfos para ajudá-lo com isso, o que é bem irônico por tratar-se de um cavalo.
- Você está bem? - perguntou com um ar de preocupação.
Seraphine nunca gostara da água. Principalmente se fosse água corrente, diretamente da natureza: nunca se aventurara em rios, mar e cachoeiras... quando criança costumavam até zoar ela por isso. E, enquanto a domadora caia ao mar, se amaldiçoava por nunca, nunquinha, ter aprendido a sequer boiar na água.
[...]
A água do mar estava gelada e abraçou o corpo quente de Seraphine como a morte abraça a alma ainda viva. Ela afundou... O balanço da água salgada a trouxe de volta à superfície.... Ela afundou... E o ímpeto de viver fez ela emergir. Ela afundou... E tentou voltar, mas estava ficando ainda mais cansada, devido ao corpo sem muitas forças após o voo com o dragão. Quando pensou em desistir, sentiu o corpo ser abraçado por alguém...
[...]
Quando a água do mar entra em seus pulmões, arde e queima, como se os órgãos estivessem pegando fogo... Mas, quando é obrigada a sair de lá, aí que você sabe o que é dor. Como um monstro rancoroso, ela passa pela sua via respiratória sem dó, arranhando e queimando, como se quisesse deixar marcas por dentro de seu corpo.
Após Ethan fazer a massagem e a respiração boca-a-boca na menina, ela sentiu tudo isso... E o ímpeto de respirar. Abriu os olhos, puxando o ar rápido demais, ficando tonta pela hiperventilação. Não chegou a ver, de primeira, o homem a sua frente... Nem se deu conta da nudez recém escondida...
O dragão havia pousado na areia, não muito longe dali, batendo as asas, parecendo agitado. Delfos ainda não parecia muito feliz com a presença do “monstro”, batendo os cascos, relinchando, antes de ir até o cavaleiro. Ethan provavelmente devia estar pensando como uma tarde potencialmente alegre havia se tornado aquilo.
Após o taurino perguntar se Seraphine estava bem, ela finalmente conseguiu fixar o pensamento em algo. Os olhos, ironicamente da cor do mar, se fixaram nele, piscando algumas vezes até conseguir focar Ethan.
- Eu... Ai – disse, a voz rouca. Sentiu a garganta arder. Apenas assentiu, sem dizer nada. Ao tentar se sentar, teve a ajuda do outro... E olhou para o mar, depois para ele – Obrigada... – murmurou... E observou o dragão ao fundo, estreitando os olhos.
De ímpeto, tentou se levantar pra ir tirar satisfações com o animal, mas perdeu o equilíbrio, derrubando o cavalheiro, que estava se levantando, consigo. Xingaria alguma coisa, mas a voz não estava funcionando bem. Apenas deu uma risada, sem conseguir se conter.