Fazia muito frio naquela região, afinal de contas o inverno costumava ser bastante rigoroso por lá, mas especialmente naquela noite as coisas pareciam piores, nem a mais quente lareira daquela aconchegante casa conseguia aquecer o cômodo principal, a bela e ampla sala de estar. O pai estava sentado junto a mãe no grande sofá de couro negro, e sua única criança sentada em frente a lareira e brincando como conseguia diante de tanto frio, com seus brinquedos que se mexiam sozinhos e também faziam barulhos. A criança era muito nova para compreender a conversa de seus pais, estes que pareciam bastante nervosos conforme o papo evoluía.
- Querido.... Você acha que Novel estava falando sério? Precisamos mesmo nos esconder? – Perguntava a mãe.
- Ele nunca nos deu motivo para duvidarmos, não? Após esses dias de frio passarem, vamos procurar outro lugar para viver... – O pai respondia em um tom tristonho enquanto olhava para a criança, que inocentemente continuava firme em sua tentativa de fazer um cavalo de madeira aceitar sua montaria.
A empregada da residência, uma elfa doméstica que utilizava roupas grossas de lã e uma meia de cada cor surgia á eles com uma bandeja com xicaras de chá e alguns biscoitos.
- Meus senhores... – Ela dizia com uma voz rouca enquanto erguia a bandeja de prata por cima de sua cabeça.
- Ah! Bem na hora Gilda, muito obrigada! – A mãe respondia com alívio pela quebra daquela tensa conversa.
– Querido, você tem de provar esses biscoitos da Gilda, são fabul- Ela era interrompida com uma batida forte na porta, tão inusitada que deixara a todos bastante surpresos e assustados, inclusive a criança que agora se agarrava nas pernas de sua mãe, tremendo de medo e de frio.
- Gilda. – Dizia sério o pai para a elfa, que com um aceno de cabeça logo fazia a bandeja desaparecer com um estalo de dedos e então recolhia a criança e aparatava da sala para outro cômodo da casa.
- Querido! – Exclamava a mãe em pânico. O pai então fazia um sinal para que a mulher pegasse sua varinha e se calasse. Então os dois levantaram do confortável e cloroso sofá e se dirigiam devagar até a porta principal, que ficava no hall de entrada da residência.
Gilda tinha levado a criança até seu quarto com certa dificuldade, pois a mesma se chacoalhava freneticamente e resmungava de desespero por ter sido separada tão bruscamente de seus pais, ou por apenas ter deixado seus preciosos brinquedos sozinhos no andar de baixo, vai saber, crianças são o exemplo perfeito da inocência no fim das contas.
Um grande estrondo era ouvido no andar de baixo, como se algo fosse bombardeado por uma forte magia. Gilda enrijeceu e escondeu a forças a criança dentro de seu armário de roupas, e apontando e girando seus dedos para a mesma, a fez ficar muda e paralisada.
- Fique aí por favor jovem mestre, irei ver como estão seus pais e já volto com seus brinquedos... – A elfa lhe dizia em um cochicho fazendo sinal de silêncio com o dedo sobre a boca e então desaparecia, a deixando sozinha e imóvel dentro daquele frio armário.
A criança então passou por alguns minutos de agonia e desespero sozinha, espremida na escuridão e frio daquele armário, ouvindo apenas alguns sons que pareciam mais batidas e raios do que outra coisa, até que um silêncio assustador tomou conta de tudo, e o frio parecia aumentar ainda mais. Então ouviu passos pesados na escada. Depois passos nervosos e rápidos por todo o corredor e portas sendo abertas e fechadas bruscamente até que, era a deu quarto que era aberta com tamanha violência que só ficara silenciosa pela magia de silêncio e imobilidade da elfa.
Então ouviu um vulto adentrar aquele cômodo, mas ele não fazia mais nenhum barulho, era sorrateiro e parecia ter parado imóvel no quarto, o que deixava a pobre criança ainda mais nervosa e apavorada. Lágrimas escorriam por seu rosto, ela desejava gritar de dor e frio, mas não podia, não conseguia, não tinha forças para tal. Porque seus pais e Gilda não vinham lhe ajudar? Porque haviam lhe deixado ali e ainda mais daquele jeito?
Então para seu maior desespero, o vulto se movera, e estava em frente ao armário. O frio aumentava ainda mais e sua fraca respiração parecia cada vez mais difícil, como se o ar estivesse sendo sugado e seu peito cada vez mais congelados. A maçaneta do armário começava a girar.
Como? Como ele sabia que ela estava ali? O que ele queria com ela? O que ele queria com sua família? Quem era ele? Os pensamentos voavam frenéticos em sua mente naqueles milissegundos em que a porta do armário era aberta e seus olhos finalmente se fechavam perante a sinistra figura que se apresentava a ela...