A manhã nascera áspera, elevando rapidamente a temperatura. Um despertar ríspido para um dia preocupante.
Não havia vento algum correndo, apenas o zumbido silencioso que se propaga no nada. Mas mesmo este ia evanescendo aos poucos, perdendo espaço para os ruídos de rotina da Arca: trabalho, reclamações... .
Havia duas pequenas comitivas reunidas, mas nem a Anciã e nem Argoro apresentavam-se naquela alvorada. Ao contrário, quem estava lá para se “despedir” era Marduk.
A mulher tinha uma postura “militarizada” que dividia opiniões: algumas viam-na como uma pessoa compromissada com a sobrevivência do bunker, uma mão à qual podiam entregar-se com fé. Se tomasse decisões duras, não o seria por capricho ou crueldade, mas porque se fazia necessário, o "mal menor". Mas havia quem a encarasse apenas como mais uma com ambições desmedidas de poder, uma ameaça disposta a usar de qualquer agenda, fosse influência, fosse força bruta, para alcançar os próprios objetivos.
Era sabido que não nutria amores por Argoro, por mais que ele tentasse fazer um jogo político de elogios e bajulações, tentando colocar que, ao menos da parte dele, não havia desavença alguma.
A facada sutil era a mais eficiente.
De qualquer forma, talvez por ela estar lá, o ardiloso tenha optado por não aparecer.
Marduk jogou um olhar torto para Heckyl e Priscila, obviamente vendo com maus olhos a projeção que estavam tendo com aquele circo todo. Quanto a Izu... não pareceu nem ao menos notar a presença dele. Ela era uma soldada, e a arrogância dos bravos costumava cegar-lhes diante da importância dos sábios.
De poucas palavras, limitou-se a invocar um nome.
- Não pretendiam sair por aí sem um stalker, não é? - disse uma aparição mascarada a qual reconheciam como “Rudaho”.
Havia algo de arrogante naquela colocação, alguém tão seguro de si que se acha indispensável, insubstituível. Mas não mentia: a pior decisão que se podia tomar era a de entrar na Zona sem alguém com as capacidades de um stalker. E, infelizmente, ele era bom no que fazia. Teriam de engolir o companheiro. Mas não só isso, uma vez que ele era da gangue de Marduk e bastante fiel a ela. Não importa o quê, estaria lá representando os interesses dela.
Ao menos a "chefe" em si não acompanharia aquele movimento. Estava organizando a outra aglomeração, designando tarefas no reforço da lataria e na formação de um grupo de caça.
“Heckyl? Quantos pretende levar consigo?”, perguntara um homem ocupado a fazer contas diversas. Estava separando para cada um comida suficiente para 4 dias, contando ida e volta. Se resolvessem ir para além disso, teriam de se virar por conta própria. “Sabem se alguém mais vai se juntar à comitiva?”.
Tão logo que aquilo foi decidido, partiram pela fenda nas montanhas. Mas, por insistência de Rudaho, não pegaram a passagem em si, evitando o largo corredor pelo qual pretendiam, em pouco tempo, estar atravessando com o “trem”. “Preciso ter uma visão do alto, entender o que há do outro lado”. Sendo assim, tiveram que pegar subidas e áreas de escalada, o que não era exatamente fácil para todo mundo. “Vamos. Não temos todo o tempo do mundo. E nessa velocidade... . Se alguém acabar ficando pra trás, não posso fazer nada”. Aquela era uma óbvia indireta aos “mais fracos” do grupo.
Quando finalmente encontraram-se diante do outro mundo, um misto de excitação e apreensão tomou conta de todos. “Ainda dá tempo de desistir”, brincou ele de maneira sarcástica. Desenrolou uma folha em branco, prestes a começar a tomar notas.
A desolação à frente era aterradora.
"Aqui é o Ministro da Defesa
Escadas e paredes é tudo o que sobrou
Buracos de morteiros deixam o ar passar
Crianças fazem a mesma coisa por toda o lugar
Eles espalharam grafites em árabe
E sacodem gravetos em merda humana
Aqui é o Ministro das Sobras
Latas de refrigerante e revistas
Vidro quebrado, um osso maxilar branco
Seringas, giletes, uma colher de plástico
Cabelo humano, uma faca de cozinha
E o fantasma de uma garota que corre e se esconde
Riscado na parede, em caneta esferográfica:
É ASSIM QUE O MUNDO IRÁ ACABAR
Há a garagem de ônibus à direita
Igualada a um canteiro de obras
Esses são as súplicas das crianças vindo da escuridão
Essas são as palavras escritas debaixo do arco
Riscado na parede, em caneta esferográfica:
É ASSIM QUE O MUNDO IRÁ ACABAR
Não com um boom, mas em um leve choro"
Escadas e paredes é tudo o que sobrou
Buracos de morteiros deixam o ar passar
Crianças fazem a mesma coisa por toda o lugar
Eles espalharam grafites em árabe
E sacodem gravetos em merda humana
Aqui é o Ministro das Sobras
Latas de refrigerante e revistas
Vidro quebrado, um osso maxilar branco
Seringas, giletes, uma colher de plástico
Cabelo humano, uma faca de cozinha
E o fantasma de uma garota que corre e se esconde
Riscado na parede, em caneta esferográfica:
É ASSIM QUE O MUNDO IRÁ ACABAR
Há a garagem de ônibus à direita
Igualada a um canteiro de obras
Esses são as súplicas das crianças vindo da escuridão
Essas são as palavras escritas debaixo do arco
Riscado na parede, em caneta esferográfica:
É ASSIM QUE O MUNDO IRÁ ACABAR
Não com um boom, mas em um leve choro"