[!ON!] Aline Pires

A semana sempre começava agitada para você e aquela parecia estar ainda pior.  Além das aulas, você estava aprendendo a rotina administrativa da escola, o que parecia sobrecarregar bastante e deixar nenhum tempo livre para sua vida pessoal.  Até mesmo a academia que você gostava de fazer, no horário do almoço, estava sendo prejudicada, afinal, você tinha de aproveitar os minutos preciosos para adiantar o trabalho.

***

Naquela manhã, você recebeu uma mensagem logo cedo da sua chefe.  Nunca era coisa boa quando isso acontecia.

“Preciso que fique até mais tarde hoje, temos uma reunião marcada”

Era tudo o que dizia, sem explicações.   Como você reage à mensagem?

***

O dia estava relativamente tranquilo. Vocês estavam recebendo um grupo de investidores na escola, por isso boa parte das pessoas estavam ocupadas com alguma função diferente da habitual.  Você, por exemplo, além de tudo o que fazia normalmente, havia ficado encarregada de preparar os comes e bebes, devido  aos seus talentos culinários.

E assim você o fez, sem poder questionar muito. No seu horário de almoço foi preparar os aperitivos e voltou para mais uma jornada de aulas... E, quando, por fim, pensou que ia para casa, se lembrou da maldita reunião que aconteceria após o horário comercial.

***

Não te deixaram entrar imediatamente na reunião. Alguns dos investidores entraram antes, conversando por quase meia hora com a sua chefe. Depois chamaram você.  A sala de reuniões não era grande, mas tinha lugares o suficiente para os três investidores, sua chefe e você. Tinha também uma TV, que estava para em um slide que tinha sua foto e seu currículo atualizado com os feitos ali na escola.


- Bom dia, senhorita Pires – a única mulher entre os investidores disse, ela tinha alguns papéis nas mãos e um sotaque muito carregado que indicava que ela não era do Brasil, mas falava muito bem o português.  – Sente-se, por favor. Gostaríamos de conhecer um pouco você.


Sua chefe assentiu, indicando para você se sentar de frente para eles.  Logo falou – Essa é a senhora Marsha Burton, nossa representante na franquia dos Estados Unidos, e esses são o senhor Jonas Burton, marido dela e investidor – indicou o homem de terno preto e em seguida o homem de terno cinza – e o senhor Matheo Dornan, um amigo do Sr. Burton que veio avaliar a possibilidade de um negócio aqui no Brasil. Marsha?

- Senhorita Pires, nós estamos avaliando a possibilidade de abrir um curso para estrangeiros estudarem o português e vocês, daqui do Brasil, poderem estudar com falantes nativos de todo o mundo. Não será aqui, será em uma cidade vizinha, mas de acordo com as nossas pesquisas as chances de isso se expandir é muito grande.  Para isso, precisaremos de pessoas para dar aulas para os nossos estrangeiros... E até mesmo para os nossos professores, que virão de outros locais. Meu marido, como a senhorita já sabe, é investidor dessa escola,  resolveu pedir uma ajuda da sua chefe para selecionar as melhores pessoas para isso. Ainda é um assunto confidencial, afinal, você sairá dessa franquia e irá para a nossa, caso aceite.

A mulher estendeu os papéis que segurava,  com informações sobre a nova escola, a proposta,  o piso salarial. Era realmente uma boa proposta, principalmente pelo horário mais flexível e a possibilidade de trabalhar com pessoas de diversos lugares do mundo, além de viajar também.

- Nós avaliamos currículos aqui na escola e somente o seu e de mais um colega de trabalho atenderam os nossos critérios.  A senhorita terá tempo de ler a proposta com mais calma, mas precisamos de pelo menos uma resposta parcial do que a senhorita achou da proposta. E que assine esse termo de confidencialidade para os assuntos tratados aqui hoje, sendo um sim ou um não.

Os dois homens conversavam baixo entre si, em inglês, sobre o seu currículo. Você entendia que boa parte do que lia os agradava. Matheo não parecia nativo da língua estrangeira que utilizavam. Após Marsha falar tudo aquilo e você concordar em assinar o termo, Matheo falaria finalmente, em inglês, talvez em um teste sobre a sua fluência.

- Boa tarde, senhorita Pires. Antes de você ir, nos conte um pouco sobre seus sonhos na profissão de Professora. Procuramos pessoas que queiram voar cada vez mais alto...

Aquela nova rotina não estava parecendo nada agradável, mas era tudo uma questão de escolhas então tinha que aguentar, pois a promessa de que algo seria melhor no futuro lhe dava um pouco de motivação.

Receber uma mensagem da chefe logo cedo era meio que natural, afinal as pessoas muitas vezes não têm noção de quando parar de trabalhar e também nem de quando começa e a chefe era igualzinha.

A mensagem faz com que um suspiro escape por entre os lábios, já que não gostava muito de ter que sair mais tarde ainda mais de um dos poucos dias que conseguia sair mais cedo..

“Fazer um pouco de banco de horas não estava nos meus planos mas vamo né... fazer o que...”

E então simplesmente mando uma mensagem de ok como resposta.

E o dia seguiu, tirando as novidades que estavam acontecendo. Ir atrás de salgadinhos e improvisar de última hora não era algo nada agradável, mas dava para ser feito então era hora de exercitar a criatividade e preparar 4 bandejas diferentes de canapés usando o dinheiro do caixa para comprar os preparados.

Como eram apenas canapés foi fácil de tudo se resolver. Alguns patês, alguns temperos frescos, tomates, um ou outro legume e mini torrados. Tudo foi preparado com o mais capricho possível apesar de ter sido um pouco improvisado. As 2 senhoras da limpeza ajudaram com tudo e junto com as bandejas de canapés foi servido chá, café e suco.

Achou que depois de deixar tudo arrumado na sala, iriam permitir que ficasse por lá, ainda mais porque havia sido chamada. A segunda estranhesa estava no slide que fora colocado com a minha foto e meu currículo. Para que tudo aquilo sem poder estar ali dentro?

“Estão querendo me matar de vergonha ou hoje é o dia de malhar o judas e esqueceram de avisar que eu seria o judas...”

Quando finalmente foi liberada a sua entrada para aquele local, aquela mulher começou a falar pedindo para se sentar. A situação era pouco comum para mim, então existe uma certa desconfiança no ar. Chego a olhar para a minha chefe sobre aquilo, afinal de contas eu e minha chefe muitas vezes conseguimos nos comunicar muito bem apenas pelo olhar e ela apenas assentiu que eu sentasse na frente daquelas pessoas.

- Bom dia. Tudo bem...

Minha chefe apresentou o presentes naquela sala e deu voz para a mulher, de nome Marsha. Ela e o marido formavam um belo casal e o outro rapaz, o de nome Matheo Dorman era um belo rapaz que chamava atenção. Apesar de não ser esse o motivo que me levou alí, olhar e achar o rapaz bonito não fazia mal nenhum.

“eita... 50 tons de cinza... rssss....”

E então foi sendo explicado todo o mistério e as razões para aquela visita. Era tudo muito surpreendente e um pouco difícil de acreditar. Dava muita vontade de se levantar e procurar por câmeras dentro da sala, pois parecia clima de “pegadinha”. Será que era mais uma oportunidade de ouro em seu caminho?

E um ponto crucial havia chegado, o que deveria assinar um termo de confidencialidade e dar uma resposta parcial para aqueles 3. No primeiro momento, olho para minha chefe com a famosa cara de “é isso mesmo?.. e sério? Posso responder mesmo?” Como minha chefe apenas me olha e não fala nada, eu apenas digo:

-Muito obrigada e parcialmente eu digo sim, desde que minha chefe dê o consentimento para tal...

Com esse tipo de resposta pelo menos eu tiro o meu da reta de poder ter algum problema futuro por ter aceitado algo contra a vontade e planos dela ou que pior ainda, prejudique a rotina da escola de alguma forma.

E então o rapaz bonito de terno cinza de nome que parecia mais italiano do que inglês começa a falar em inglês. A pronuncia do rapaz era mito bonita mas seu sotaque parecia mesmo que não era americano. Será que era Italiano mesmo? E então respondo no idioma que ele usou:

- Não sei se posso considerar isso um sonho mas eu queria que ninguém tivesse que ficar preso em uma país e em uma só cultura ou até mesmo sofrer para tentar aprender um outro idioma. É tão bonito você poder ampliar seus horizontes e conhecer o mundo só porque você fala outro idioma. Viajar para onde quiser, ser livre e independente. Conhecer o mundo... conhecer outras pessoas...

Quando você entra e procura o olhar de sua chefe, ela parece tranquila.  A princípio, aquele parecia um  ambiente agradável tanto para ela quanto para os três desconhecidos ali. O único momento de tensão que aconteceu ali foi, após o discurso de Marsha, quando ela pediu para que assinasse o termo de confidencialidade.  Afinal, tanto para sua chefe quanto para o senhor Burton, uma informação vazada dali poderia causar problemas na franquia da escola.

Após você dizer sim e concordar em assinar, todos voltaram a ficar tranquilos. O casal Burton falou algo entre eles e olharam para a sua chefe, que prontamente assentiu com a cabeça.

- Por mim está tudo bem... – Não dava pra saber se ela ia ganhar algo com aquilo, mas provavelmente sim.  Pelo que você conhecia da sua chefe, ela não perderia uma boa profissional ou faria algo contra as políticas da escola se não considerasse muito vantajoso.

Marsha sorriu e logo Matheo tomou a frente, fazendo a pergunta sobre seus sonhos.  Após sua resposta, o homem olhou os outros sócios, com um sorriso leve e olhou de volta para você. Será que aquilo era bom?


- Parece que você soube selecionar as pessoas para nos apresentar – ele falou para a sua chefe e em seguida para você – Está tudo bem, senhoria Pires. Você pode ir agora. Obrigada pelo seu tempo  -  Não disseram quando entrariam em contato para uma resposta final, talvez no dia seguinte ou muito depois. Você precisava sondar sua chefe para saber.

Após sair, várias coisas começaram a passar na sua cabeça, mas uma que te encucou foi o fato de ter mais um possível colega que trabalharia nessa tal nova escola. Quem poderia ser?

Depois de olhar bem para a própria chefe viu que tudo parecia de boa e bem normal então por mais que toda a situação fosse bem estranha para si própria, o melhor a fazer é seguir a música que tocava naquele momento.

O olhar daquele tal de Matheo para os outros dois era estranho, mas o sorriso que ele mostrava parecia autêntico. Vários pensamentos passavam na minha cabeça, se ele estava me achando o ser mais bobo e ingênuo do mundo ou se por acaso parecia divertido demais os meus devaneios... enfim... nada seria falado.. apenas observado no mais puro silêncio.

Até que simplesmente acaba.

”que!? É só isso? Depois de eu quase infartar agora é pra cair fora? Aff...”

Faço sinal positivo com a cabeça e saio do local com o coração quase saindo pela boca.

“Se eles não comerem meus canapés eu juro que enfio no nariz da Débora...”

Volto a fazer minhas coisas bem indicada com tudo. Por mais que tenham outra pessoa em mente, isso não iria me incomodar, pelo contrario, seria bom dividir o peso já que talvez fosse muito para uma única pessoa.

“Não vou jogar sujo... O que tiver que ser será.. deus sabe das coisas e se eu tiver que ganhar algo, que seja por mérito meu..”

Ps: Débora é o nome da minha chefe.

Havia um burburinho sobre os visitantes, mas ninguém começou a fofoca enquanto o trio estava lá... Afinal, todos sabiam que as paredes na escola tinham ouvidos. Sempre que um comentário era dito, mesmo que baixinho, ele ia parar nos ouvidos das pessoas que não podiam saber.


O expediente se estendeu um pouco para você e para o pessoal do administrativo.  Isso não era novidade, mas tinha tanta coisa na sua cabeça, após aquela reunião, que se concentrar para resolver os pepinos dos alunos estava sendo bastante difícil.

Quando estava quase no fim, Bruna deu uma risadinha da outra mesa, enquanto olhava o celular.  Ela era uma jovem de vinte e poucos anos, sobrinha da diretora. Era uma boa menina, mas claramente estava ali  pelo “incentivo” da tia.

- Amiga! – disse, arrastando a cadeira com rodinhas até a sua mesa -– os professores do francês tão num bar aqui perto com as outras bitches daqui – riu, não muito interessada nas professoras que estavam lá também -– Vamo dar um pulo lá? ...Não faz essa cara, vai, não posso aparecer lá sozinha...

Os professores do francês da escola eram cobiçados, um grupo que não tinha o que botar defeitos, pelo menos em aparência. Você sempre ouvia das outras meninas de lá histórias sobre eles, algumas boas, algumas só de galinhagem... Será que valia a pena os conhecer mais de perto, além do profissional?

Bruna te olhava com aquela expressão pidona.

O expediente se estendeu e os bocejos de cansaço estavam começando a ficar incontroláveis apesar da quantidade de coisas que passavam na cabeça após aquela reunião.

“O que será que vai acontecer a partir de agora? Vou ter um treco de ansiedade com as notícias... >__< isso sim....”

Olhar os grupos de besteiras no WhatsApp era a única coisa que as vezes ajudava durante o dia. Quem sabe às vezes acessar o Youtube e ouvir alguma coisa, ou ver algum filme, escolher algum episódio aleatório de algum seriado que nunca vi na vida ou até mesmo acessar meu mais novo vício, audio books.

Quando tudo estava acabando, ouço aquele barulho das rodinhas de cadeiras rolando pelo chão de porcelanato e se aproximando de mim. Era umas das colegas de trabalho bem mais nova, a Bruna, sobrinha da diretora, cutuca de maneira curiosa para falar sobre os professores de francês.

“Lá vém... gente que não tem o que fazer é f... não tem lição pra corrigir não!? Porque eu tenho mas to de bode hoje...”

Definitivamente os professores de francês eram cobiçados por todas e todos, simplesmente pela ausência de defeitos que eles têm, mas sempre me pareceram gays ou no máximo bissexuais. Era difícil disputar alunos de Francês com aqueles belos rapazes, mas é vida que segue, pois as contas não vão se pagar sozinhas.

A garota queria porque queria companhia para ir para o famigerado bar atrás deles e provavelmente estaria atrás de mim só pelo fato de ter carro para tal. Não é de me surpreender que isso possa ser a única verdade do assunto.

Geralmente eu costumo inventar qualquer desculpa, mas, apesar dos bocejos de tédio e um pouco com o coração na garganta de ansiedade, sinto que preciso ir para o tal bar e levar a criança. Vai ser bom distrair um pouco e relaxar, pois, mesmo que eu não beba nada alcoólico, comer algo diferente me parece interessante, então aceito ir...