[Conhecendo Quem Manda Aqui] Samuel

- Aham, já já você aparece vestido igual uma barbie. - Resmungou Ronny, enquanto movia-se para fora. Eles tiveram que fazer o mesmo esquema para ir embora: caronas. Por sorte, Ronny parecia bastante carismático ou simplesmente muito bom de papo e conseguia caronas relativamente fácil e logo estavam de volta à Bray.

O dia não era muito convidativo, cinzento, mas ainda não estava tão frio quanto provavelmente estaria à noite. Ronny moveu-se pelas ruas conhecidas bem pelos dois, Ronny catou um café para os dois com uma senhora numa das esquinas e continuou a andar até voltarem ao bueiro onde Samuel tinha sido apresentado aos demais algumas semanas atrás.

Eles desceram as galerias e abaixo da cidade, encontravam outra cidade, aquelas destinadas aos esquecidos e excluídos. Lá em baixo, as coisas eram mais calorosas, as pessoas eram mais unidas e uma precisava da outra, não havia orgulhos inflados ou egos inflamados. Havia compaixão e camaradagem.

E havia a lenda.

Samuel tinha escutado uma vez ou duas, a respeito de quem realmente comandava por ali. Sabia se tratar de uma Ahroun, sabia se tratar de uma mulher e sabia que ela não era a das mais amáveis pessoas do mundo. A mulher chamava-se Omelete - porque segundo diziam, ela gostava muito de quebrar uns "ovos" e nessa parte eles riam -, e segundo as histórias Omelete era aterrorizante: ela era capaz de peitar cara a cara um Ahroun Cria de Fenris, não baixava a cabeça para os Presas de Prata e não se intimidava diante dos Senhores das Sombras.

Omelete era respeitada e temida. Mas também era querida por aqueles que estavam a sua volta. Defendia seus irmãos e irmãs com unhas de dentes - e às vezes, de forma literal - e assim, tinha subido no conceito dos Roedores e tomado a posição de líder deles naquele local. Ela não era uma Ancião, era uma Athro, mas ainda sim, tinha grande respeito e consideração entre todos eles.

Omelete era uma lenda e Samuel iria conhecê-la.

Ronny lhe deu algumas dicas de como lidar com Omelete: não faça piadinhas, não toque em nada e tente manter uma postura mais séria e pelo jeito que Ronny falava, era possível sentir certa tensão no ar, no modo como a figura de Omelete era bastante importante.

Eles dobraram algumas "esquinas" nas galerias e finalmente chegaram no cafofo da sujeita Omelete, Ronny bateu ali e a porta foi aberta, uma leve conversa trocada e a pessoa que abriu a porta indicou onde Omelete estava. Ronny e Samuel seguram para ela.

Dentro da "casa", eles entraram numa espécie de "escritório", na verdade era uma jocosa piada em referencia aos escritórios chiques e pomposos dos Presas e dos Senhores. As coisas eram feitas de caixas de papelão e tinha uma teve velha lá, além de uma cadeira de escritório, escorada por livros já que não tinha mais as rodinhas.

A cadeira estava virada de costas para a entrada, a TV ligada, num noticiário qualquer.

- Omelete! Garota, quanto tempo. Olha quem eu trouxe, nosso recém cliath. Samuel, acho que te falei dele. Mas não é por isso que estamos aqui... Bom, Samuel recebeu um convite... Inusitado... Um Presa de Pratas quer ele na matilha e tal...

- Um Pratinha? - E a voz da Omelete era meio... Estranha. Parecia meio adolescente demais. A cadeira se virou para eles e era difícil realmente acreditar: As roupas eram MUITO maiores que ela, usava uma jaqueta militar velha e desbotada uns três tamanhos do dela, seus cabelos loiros, estavam raspados nas laterais, formando um "moicano" meio relapso. Ela tinha um cigarro na boca, mas não era exatamente isso que chamava atenção...

Omelete era pequena. Não era aquele pequena de "ela é um pouco menor que todo mundo", Omelete era pequena do "ela parece uma adolescente de 13 anos", ela não deveria nem ter um metro e meio, provavelmente tinha lá por volta dos 1,45, no máximo 1,46. (Defeito baixinho),  mas a Fúria nela pulsava (Fúria 7), afinal era uma Ahroun, ela olhou Samuel de cima a baixo, antes de se levantar: os tênis eram diferentes, um da Hello Kitty e um Adidas qualquer, muito maiores que seus pés.

Na mesa, Samuel pode ver um taco de beisebol, com algo escrito na madeira: Compaixão.

- Por quê? - Questionou ao fim, olhando para Samuel.

Omelete:

Era bom estar de volta ao lar. Samuel passou pelas galerias cumprimentando o pessoal que o conhecia. Muitos lhe perguntavam o resultado do teste e ele respondia "Pavio-Curto agora é meu nome!" E recebia as congratulações com tapinhas nas costas e risadas calorosas. 
 
Sentiu-se tenso ao se aproximar da sala de Omelete. Repetiu em sua cabeça as instruções de Ronny. Sem gracinhas, isso ia ser difícil, mas ele deveria se controlar. Respirou fundo e adentrou o "escritório". 
 
A voz de Omelete era suficiente para deixá-lo intrigado, porém quando a cadeira girou e ela apareceu, Samuel teve que travar cada músculo do seu rosto para não sorrir... Omelete era... Fantástica! A Roedora que botava medo em qualquer um que tivesse juízo tinha menos que um metro e meio!? Isso é incrível! Ela era o tipo de pessoa que Samuel queria grudar e aprender tudo que ela tinha para ensinar. 
 
Ao ouvir a pergunta da Ahroun, Khan demorou um pouco para responder. Não parecia ter competência para abrir a boca em uma conversa entre seu mestre e uma lenda, mas assim que entendeu que era com ele disse: 
 
-Estranho né? Por que? Eu tenho algumas teorias. Ele tem esse papo de "mostrar para nação que os Garou podem se unir", então tentou unir todos os novos Clitahs em uma matilha bem heterógena. Isso me leva ao ponto número dois: Necessidade de liderar. Vai ver ele tem uma necessidade de liderar, sendo um Presa, mas precisava de alguém que ficasse abaixo dele. Como ele tem mais experiência que o resto da matilha, pode ser que tente pegar o papel de líder. Por fim, a última teoria é que ele viu em Samuel "Pavio-Curto" Khan um Ragabash com um potencial de ser o bixão da Irlanda. Qual é Ronny? Eu estou indo bem, cara!

Omelete ajeitou as mangas do casacão que usava, tendo que dar ao menos três dobras para que suas mãos ficasse de fora das mangas, ela parecia pensativa, enquanto coçava a cabeça em uma das laterais raspadas, ouvindo o jovem Ragabash falar sobre o tal Presas de Pratas. Quando Khan terminou de explicar, Omelete revirou os olhos.

- Mesma merda de sempre, dia diferente. - Afirmou, gesticulando com uma das mãos. - Eles adoram apontar para nós e dizer: está vendo? É isso que acontece quando vocês não seguem a tradição, agora nós, poderosos Lideres teremos que descer do nosso Trono Imponente para salvá-los, pobres cachorrinhos. Por que como lideres, temos que manter a Nação unida, e bláblábláblá.

Omelete perambulou pela sala então se aproximou da mesa e pegou o taco, segurando com uma das mãos, ela o batia na outra com a palma aberta. - Todos eles tem uma necessidade de liderar e geralmente é por causa dessa necessidade que fodem as coisas com muita frequência: nessa parte eu até tenho que concordar com os esquentadinhos dos Fenris. Quem diabos quer seguir um lider mané? É muito fácil lidar com os Presas de Prata, sabe? Você deixa ele ir na frente, ele vai foder tudo, procurar alguém pra por a culpa e então você faz o que tem que fazer.

Ela parou, virando-se para Khan, ignorando a última parte do que tinha sido dito, enquanto pensava nas possibilidades daquelas coisas. - Mas isso vai ser interessante, não é todo dia que temos o "privilegio" de ter um Prata tão perto... Isso pode ser vantajoso pra nós. Porque enquanto eles e os Senhores das Sombras se matam em suas rivalidades, a gente pode tirar algo de util da situação e fazer alguma coisa de verdade nessa luta. Você entende onde quero chegar?

Samuel franziu o cenho, tentando acompanhar o raciocínio de Omelete. Quando ela direcionou a pergunta, respondeu: 

-Nas ruas, e com meus mestres, aprendi a sempre ficar com os olhos e ouvidos mais abertos do que a boca. Essa proximidade minha com os Pratas vai me permitir descobrir informações que possam nos auxiliar de alguma forma, porém me parece que você está um passo além disso, não é? 

Khan fitou o taco. Imaginou alguém pedindo compaixão enquanto era espancado pela Arhoun de um metro e meio. Era um humor estranho, ao estilo dos Roedores.

Omelete voltou a coçar a cabeça, dessa vez aquilo parecia mais uma mania do que uma real necessidade. Ela estava quieta, caminhando para lá e para cá, o taco batendo na mão e a cabeça funcionando a mil. Observou o jovem Ragabash por cima dos ombros, tinha no olhar um peso característico do posto, mas era estranho, porque apesar disso, Khan não se sentia tão intimidado quanto se sentira na assembleia, cercado das Tribos mais tradicionalistas: isso era reflexo de como a "sociedade" Roedora funcionava.

- Mais ou menos isso ai. Veja só: se um Presas de Prata ou um Senhor das Sombras dá um passo, nós temos que dar dois, entende? - Era uma matemática simples, Omelete achava. Eles precisava ser espertos os suficiente para sobreviver e sagazes o suficiente para fazer algo a respeito de todas as outras coisas. - Tem coisas muito estranhas acontecendo ultimamente. Parente Prata dormindo com Senhores das Sombras... Fiannas em silencio para as politicagens correndo solta... Crias de Fenris calados e mais reclusos... Tem alguma coisa acontecendo, entende? E não quero que os meus sejam pegos no raio da explosão que essas coisas costumam causar. Então você entra nessa matilha e fica de olho nas coisas.

Ela se aproximou de Khan e lhe deu três "tapinhas" com o taco no ombro, e inferno, aquela porra parecida ser feita de metal! Era impossível acredito, porque ele tinha a aparência de madeira... Mas o peso dele, mesmo naquele toque nada violento era de algo feito de metal.

- E você tem que ter a serenidade para aceitar o que não pode mudar, tenacidade para mudar o que pode e boa sorte para não fuder tudo com muita frequência. Porque a gente não pode parar os cães da guerra, garoto.

Samuel tentou decorar as informações que lhe eram passadas. Informação não ocupava espaço em sua mente. Arregalou os olhos ao sentir o peso do taco de metal. Put* Merd*! Aquela garota realmente era um apocalipse em miniatura. 
 
Ouviu então os conselhos que ela tinha para dar. Moderação não era um dos melhores atributos de Pavio-Curto, porém para o bem da Tribo era necessário que isso mudasse. Gaguejou um pouco para responder: 
 
-Eu vou trazer sobrevivência a tribo. - Pensou em dizer orgulho, porém orgulho era algo muito superestimado pelos Presas e não queria ser associado a eles no momento - Então, Omelete... Nesse seu escritório você tem algum telefone que eu possa te ligar?... Caso eu descubra algo importante, claro.

Omelete trocou um rápido olhar com Ronny, quando o garoto Samuel falou, depois ela voltou a se mover ela pequena sala, até sentar-se de novo na cadeira. Houve silêncio entre eles, após as palavras de Samuel, um silêncio contemplativo e pouco amigável. Omelete pegou um papel e riscou alguma coisa e entregou para Ronny que por sua vez o deu para Samuel: era um número de celular.

- Fica ligado, garoto. - Disse a pequena, e aparentemente a conversa tinha acabado. Ronny indicou a porta, para que eles saíssem.

Samuel olhou para o papel com o telefone escrito. Todos os dígitos! Oh yeah baby, Sammy é o cara com mais lábia (e coragem) que já pisou nesse planeta. 
 
Rói-com-Rancor indicou a porta, era hora de ir. Tudo bem, qualquer coisa em excesso faz mal, porém ele precisava de dois segundos a sós com Omelete. Abriu a porta para seu mestre e deixou-o passar, fazendo uma cortesia exagerada. 
 
-Estou treinando pra me camuflar no meio dos pratas.  
 
Deixou Ronny ir na frente e quando fechava a porta se deteve no meio do movimento (já do lado de fora) e disse:  
 
-Omy... Preciso perguntar uma coisa...Você acredita em amor à primeira vista ou eu devo passar aqui de novo? 
 
A reação de Khan seria proporcional à da Ahroun. Se ela sorrisse ou tivesse qualquer reação positiva, daria uma piscadinha mas sairia. Mulheres não gostam de homens grudentos. É que nem caçar leão, joga a isca e corre.  Se a reação fosse levemente negativa, como uma negativa com a cabeça ou algo assim, só fechar a porta, vamos com calma  Agora, se por algum motivo ela pegar o taco, mudar de forma ou o chamar pelo nome completo. Samuel "Pavio-Curto" Khan ia correr mais do que estudante atrás de ônibus. Usain Bolt ficaria com inveja do rastro pardo que ele deixaria ao passar.

- Você não tem que se camuflar, na verdade tem que fazer questão de que eles saibam que você está lá. - Disse Omelete, agora voltando a prestar atenção em outras coisas. Então o garoto falou de novo, e Omelete levantou a cabeça para olhá-lo, tinha o cenho franzido, a sobrancelha meio arqueada...

- Eu vou contar até dez e se você estiver aqui quando eu terminar, vou te mostrar o que Compaixão pode fazer por você.

Ela pôs a mão no taco, e começou a se levantar. - Oito... Nove... - Começou a contar, ignorando os outros números. Hey, ela tinha dito que ia contar até dez, não que ia começar do 1!

Samuel deu um curto sorriso amarelo ao ouvir a resposta de Omelete, bem, não era muito diferente de suas outras declarações para suas paixonites.  
 
Bateu a porta, correu alguns metros, tirou o papel com o número da garota e o estendeu como um troféu: 
 
-1 a 0 e a torcida vai a loucura, amigos! A definição de artilheiro no dicionário vai dizer: "Pavio-Curto" 
 
Pensou nas palavras da Ahroun. "se você estiver aqui quando eu terminar de contar..." Bem, ele não estava mais ali, mas Ahrouns de forma geral não prestam muita atenção nas cláusulas de contratos verbais, era bom continuar atento. 
 
Se ouvisse a porta abrir ou qualquer coisa semelhante correria o mais rápido que pudesse tentando despistar uma provável Garou enfurecida.

Ronny do lado de fora revirou os olhos quando notou o que o garoto estava fazendo. Achava que Samuel tinha tido sorte e pego Omelete num bom dia. Deixou que o moleque corresse à frente, enquanto acendia um cigarro e movia-se para emparelhar com o garoto.

- Você perdeu a porra da cabeça, é? - Mas não esperou resposta, antes de continuar falando. - O que você tem pra resolver antes de ir lá encontrar os almofadinhas?

Samuel olhou para seu mentor. 
 
-Eu não posso perder o que nunca tive... Ei! Você está fumando!? E depois reclama que eu pareço um suicida, isso vai te matar um dia cara! Os narcóticos anônimos se reúnem na igreja toda quarta à noite. Alias, eu nunca entendi por que esse nome "anônimos" se a primeira coisa que você faz quando chega lá é falar "oi, meu nome é Samuel".  
 
O jovem Roedor adorava quando sua mente divagava assim, tantas possibilidades, onde iria parar? Mas ainda não tinha respondido a pergunta. 
 
-Eu preciso de um celular, Ronny. Por que esse número aqui não vai se ligar sozinho. Acha que conseguimos arranjar algum?

Ronny deu um trago longo no cigarro, antes de voltar os olhos na direção do moleque. Deixou a fumaça sair pelas narinas, enfiando a mão livre novamente no bolso.

Revirou os olhos levemente ao ouvir Samuel falar sobre o cigarro. - No dia que um cigarro matar um Garou, esteja preparado, o apocalipse finalmente chegou. - Resmungou o sujeito.

Então ficou calado, ouvindo o garoto falar, andando e pensando enquanto deixava o refugio dos Roedores para trás. Ronny estava pensativo, muito pelo que Omelete tinha falado a pouco.

- Isso é fácil. - Afirmou e assim, Samuel e Ronny voltaram para o 'mundo de cima'. A primeira parada foi para comerem algo e achar um lugar pra tomar um banho. Essas duas tarefas não tinham sido exatamente difíceis, já que Ronny sabia onde ir e com quem falar.

Já era fim de tarde, quando Ronny tinha deixado Samuel num ponto de ônibus e falado pro garoto esperar ali, ele voltou mais ou menos uma hora depois e jogou um celular meio velho e xexelento pro garoto.

- Tá aí. Agora se manda porque você tem que encontrar os engomadinhos. Não me envergonhe e não morra.

Samuel já estava cansado de esperar quando Ronny apareceu, ouviu o que seu mestre tinha a dizer e respondeu: 
 
-Eu sempre fui um fã de IPhones, mas este dá pro gasto. Não se preocupe, se for pra envergonhar alguém eu envergonho eu mesmo.  
 
E então se dirigiu ao local designado para a reunião.

Ronny não respondeu, apenas exibindo o dedo do meio para o jovem Roedor, antes de despachá-lo para onde ele precisava ir: não ia acompanhar o moleque, aquele tipo de coisa era algo que se deveria fazer junto a futura matilha, achava também que os Fiannas iam providenciar ajuda aos novatos, no final das contas.

Samuel precisou de um pouco de paciência e perseverança, diferente de seu amigo Ronny, não tinha sido tão fácil para ele conseguir carona para os lugares em que precisava ir. Mas com algum esforço, ele chegou lá. E se deparou com o seguinte cenário:

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