Estrada para Redenção
Solomon Boheme havia sido proibido de exercer suas funções como rabino pela Rabanut (Rabinato Chefe), sucedendo ao exílio, mas não por falta de fé ou coragem, mas pelo chamado que clamava em sua mente e espírito, maior que qualquer arbítrio por parte dos homens.
O rabino havia sido conduzido por sonhos enigmáticos, levando-o a despertar durante a estadia na Alemanha, seu mentor Shmuel Levi, o acolheu e instruiu sobre o verdadeiro caminho, elucidando a única e legítima missão do mago, as Tradições, o Coro Celestial e o que significava ser um dos Templários desse novo mundo que se desdobrava para Boheme. Seu tutor e ele próprio, sentiram a escuridão que se aproximava da humanidade à cada dia, muito antes da eclosão da 2ª Guerra Mundial.
O mago, que comportava em si o avatar do próprio Rei David, havia recebido um sinal de HaShem em seus sonhos. Visões nítidas e futuras, instruções em formas de enigmas que somente uma alma iluminada poderia comportar, uma mente treinada para não enlouquecer com o toque divino em sua existência, em seu padrão primordial, como havia aprendido com Shmuel. Podia ver Rotterdam queimando, mas a vontade do Eterno estava voltada para Amsterdam, é para lá que ele deveria peregrinar.
A dupla se mantinha firme em Berlim, mesmo com toda a perseguição aos judeus na ascensão do Partido Nazista, indo ao auxílio dos que não podiam se defender sozinhos. Todavia as coisas mudariam, eram os sonhos, seu mentor deveria ficar onde estava, enquanto sua hora havia chegado, era o momento de retornar.
Semanas depois aqui estava Solomon Boheme, vagando pelas ruínas da outrora belíssima Rotterdam, os alemães haviam destruído a cidade com seus bombardeios, deixando milhares de mortos e desabrigados, se espalhando pelo país para sobreviver. O corista margeava o perímetro urbano, optando por viajar pelas estradas secundárias, para diminuir as chances de ser visto pelas tropas alemãs e evitar problemas, usando o familiar para ter uma vantagem aérea da percepção local.
As solas dos sapatos gastas e lameadas, o fôlego apresentando os primeiros indícios da fadiga pela longa peregrinação, desde que passara pela fronteira da Alemanha para os Países Baixos, foi quando encontrou os refugiados e suas carroças, no final do entardecer, rumando à Amsterdam, carregando o que haviam conseguido salvar, além das próprias vidas e uma profunda tristeza. Judeus, cristãos e protestantes, nesse momento eram todos holandeses devastados pela guerra, reunidos em uma mesma fila e com o mesmo propósito, sobreviver.
A gaiola coberta em que levava Yossel nas costas começava a balançar, mas não deveria ser impaciência, visto que ainda estava anoitecendo e seu companheiro havia ficado "solto" o dia anterior por completo, algo estava para acontecer. Ao forçar a visão, podia notar poeira sendo levantada no horizonte, eram carros vindo na direção do grupo de refugiados pela estrada barrenta.