Fazia já um tempo que a noite não era fria desse jeito em Vicência, não era um vento fresquinho que vinha com a temperatura baixa nas noites de verão - mas um que castigava a pele acostumada com o calor, de tremer mesmo e juntar todo o corpo pra não travar de frio. Acostumava com o tempo, aí vinha uma lufada e fazia qualquer um tremer mais, igual vara verde - era o que diziam ali, tremer igual vara verde, mas o que faltava era o verde. Tinha muito marrom e amarelo e uns amarelos mais safados do que os outros. A coisa era que, o frio não deixava Gabriela dormir muito bem e ia acordando de tempos em tempos, cada vez que acordava na noite ouvia um bode velho balir.
Béééé.
Béééé.
Virava a cabeça, tentava dormir mais um pouco e um pouco mais, do jeito que dava ou do jeito que podia. Não tinha tempo para insônia - isso era coisa de gente abastada, que quando acordava o mundo já tinha acordado antes, as engrenagens do mundo já tavam girando há tempos na força do povo mais simples. Quem tem que acordar cedo, não tem luxo de não dormir, precisa fechar os olhos e descansar - o dia não espera e o trabalho não quer saber se o olho fechou. Acordar antes do sol exige energia, mas como ter? Logo lá vinha outra chicotada invisível do vento gelado e junto dele, vinham mais balidos da criatura caprina do lado de fora da cada.
Béééé.
Béééé.
Só podia estar com frio também, era possível de se imaginar - bode friorento. Mas de todo modo, tinha o pequeno estábulo pra ficar junto com os outros bichos e se aquecer um pouco - o diabo do bode ficava ali, do lado da janela, balindo e insistindo naquela música desafinada, bé, bé, bé, sem parar. Não fosse o frio e só esse barulho, talvez pudesse tentar dormir um pouco melhor - afinal, com o barulho estava acostumada, mas o vento subindo nas pernas e nas costas, não. Era coisa rara de se ver no sertão.
Béééé.
Gabriééééla.
Era possível ficar ainda mais frio? Não dá pra saber. Mas o que ouviu ali congelou seu coração. Ou estava finalmente tendo um problema do tempo sem dormir e cansaço acumulado do dia ou foi isso mesmo o que ouviu, o bode velho chamou seu nome numa voz grave e profunda que parecia chamador de circo em megafone.
Béééé.
Béééé.
Virava a cabeça, tentava dormir mais um pouco e um pouco mais, do jeito que dava ou do jeito que podia. Não tinha tempo para insônia - isso era coisa de gente abastada, que quando acordava o mundo já tinha acordado antes, as engrenagens do mundo já tavam girando há tempos na força do povo mais simples. Quem tem que acordar cedo, não tem luxo de não dormir, precisa fechar os olhos e descansar - o dia não espera e o trabalho não quer saber se o olho fechou. Acordar antes do sol exige energia, mas como ter? Logo lá vinha outra chicotada invisível do vento gelado e junto dele, vinham mais balidos da criatura caprina do lado de fora da cada.
Béééé.
Béééé.
Só podia estar com frio também, era possível de se imaginar - bode friorento. Mas de todo modo, tinha o pequeno estábulo pra ficar junto com os outros bichos e se aquecer um pouco - o diabo do bode ficava ali, do lado da janela, balindo e insistindo naquela música desafinada, bé, bé, bé, sem parar. Não fosse o frio e só esse barulho, talvez pudesse tentar dormir um pouco melhor - afinal, com o barulho estava acostumada, mas o vento subindo nas pernas e nas costas, não. Era coisa rara de se ver no sertão.
Béééé.
Gabriééééla.
Era possível ficar ainda mais frio? Não dá pra saber. Mas o que ouviu ali congelou seu coração. Ou estava finalmente tendo um problema do tempo sem dormir e cansaço acumulado do dia ou foi isso mesmo o que ouviu, o bode velho chamou seu nome numa voz grave e profunda que parecia chamador de circo em megafone.