Escrito numa língua estranha
Salvo erros e dificuldades de tradução
Segue a história
Conforme nele contada
DO FIM DAS ERAS
Traduzidas do
LIVRO AZUL DO MARCO DO VALE CENTRAL
Pois a noite era escura e não se via sinal de Tilion, servo de Oromë, e seu arco de prata. A Lua, como os mortais chamavam a nau na qual ia a luz da Flor de Prata, último resquício da primeira das grandes árvores de Valinor, Telperion, era conhecia por servir a vontade daquele capitão de estranhos humores e lógica própria. Costumava a, num complexo padrão, deixar o breu tomar de tudo conta ou mesmo a disputar espaço com o Sol. Mas era aquela uma hora estranha, diferente do que era o costume.
Assustadoras nuvens encobriam o resto das estrelas de Varda, apagando, aqui e ali, a própria Foice. Eram formações pesadas, quase pegajosas, cujo interior queimava em vapores rubros, estalando em constantes raios, pequenos ramos brancos que mal produziam barulho para além de um persistente ruminar.
Também em vermelho ardiam chamas nos topos das montanhas, dedos feridos tentando escapar para o alto, agarrando-se ao nada, mas só conseguindo nele arranhar, ensanguentados.
Era assim às vistas de um jovem que despertara, confuso e nu, sobre um chão de terra escura, queimada. Tremulo, respirara, como há muito não fazia, o ar do descampado. Este parecera-lhe rançoso, apesar do espaço aberto, e em sua mente não demorara a pergunta: onde, pelos poderes do Oeste, me encontro?
Fora então que lembranças começaram a penetrar-lhe a mente. Uma briga, uma faca, uma dor profunda no peito. Recordara-se de que não tivera muito tempo para se despedir enquanto o mundo dissolvia ao redor dele. Tombara, ou assim lhe parecera. Sobrevivera, então?
Com certa dificuldade e músculos frios, levou a mão ao local da ferida. Não encontrou sinal nem de curativo, nem de perfuração ou cicatriz. Teria sido um sonho mau? De toda a forma, a dúvida persistia: onde, pelos poderes do Oeste, se encontrava?
Ergueu-se, tentando cortar o negrume ao redor. Fosse lá onde estivesse, era uma devastação como nunca vira antes. Não que o rapaz conhecesse muito da Terra Média, mas não estava, definitivamente, em casa. Não naquele horror. Mordor?
O chão era irregular, com pedras fendidas por todas as partes, como se roladas das montanhas e espatifadas, partindo-se em ângulos afiados. Arbustos ásperos pareciam mais interessados em atrapalhar o caminho do que em decorar a paisagem. Era o fundo de um vale largo, de modo que sair era uma caminhada algo ascendente, mesmo que não muito íngreme. A imensidão do cenário o fazia parecer pequeno e abandonado. Ele não tinha ideia de em qual direção seguir.
Sonhar. Tinha a estranha impressão, no fundo da cabeça, de que estivera noutro lugar antes dali. Como numa fantasiosa viagem do sono, cujo despertar varre da mente. Incerto, ensaiou alguns passos e, como se a garganta estivesse desacostumada de usar a voz, tentou chamar alguém. O resultado fora um desarmônico “olá” que se perdera pouco depois de ser pronunciado.
Infelizmente, aquilo fora o suficiente.
Descortinando as sombras, uma besta saltara, cravando-lhe amarelados dentes à garganta. O cão-fera estava faminto e furioso, sacudindo e espirrando sangue para todos os lados. Os olhos sem vida do rapaz miravam sem ver o mundo ao redor conforme a cabeça pendia para um lado e outro como um brinquedo quebrado. Fosse a primeira ou a segunda vez, encontrara rapidamente o fim.
Vísceras espalhavam-se quentes pelo solo enquanto a criatura lambia-se satisfeita com a refeição. Entretida, parou apenas para farejar algo no vento.
Não fora rápida o bastante.
Caindo sobre ela como um relâmpago, uma faixa prateada separou o corpo sarnento da assustadora cabeça. Aquele amontoado pelos e presas não tivera tempo nem de grunhir, tombando ao lado da própria vítima.
- Cão pestilento... – cuspira a voz abafada que, surgindo da dura vegetação com uma fraca tocha à mão, eliminara o monstro.
Examinara rapidamente o cadáver daquele moço, atentando ao fato de que não havia roupa alguma cobrindo-o. Sem ter mais o que fazer, lamentou não ter chegado mais cedo e limpou a arma no pelo do animal. Mas não a embainhara, seguindo a vigília até parar novamente.
“Droga”, exclamara ao perceber que mais figuras jaziam espalhados pelo vale. Julgou-as de início mortas, outras vítimas do cenário hostil. Mas, talvez atraídas pelo brilho do fogo, começaram a piscar num lento, frio e desnorteado despertar... .