[!ON!] Mercado de Fez

Conversava com o mercador, e enfiava um anel no dedão claramente feito pra mãos maiores, mais dignamente africanas, mas ficava lindo em qualquer mão que fosse, com o mesmo dedão ele apontava em direção de Mu-Za sem sequer vê-lo.

Recebia do homem um saco que logo enfiava no bolso interno do colete de couro que usava, ele parecia chamar alguém de dentro da loja com as mãos e logo se virou pra direção de Mu-Za, sorriu quando o viu, só se virou pro mercador, recebendo um papel de suas mãos e apertou as mãos.

Se aproximou do velho e da moça que ele não conhecia - Mu-Za seu véi lazarento da porra, que mundo pequeno, tava pensando em tu no caminho pra cá! – dizia em tom jocoso enquanto fazia menção de que eles os acompanhassem enquanto atrás vinham quatro caras braçais grandes carregando uma caixa de madeira grande selada – Prazer, Shinji. – Ele estende a mão pra moça se apresentando, com um sorriso branco, não dignamente africano, mas ainda assim branco e com o rosto que era perfeitamente alinhado e exótico, tão logo estendia a mão pra Mu-Za em cumprimento.

- Alguma chance de eu te arrastar até Córdoba? – dizia brincando com o anel grosso de ouro no dedão, um claro sinal de que os negócios iam bem.

Ele parou perto do caminhão e abriu a parte traseira do baú, enquanto os quatro sujeitos iam e voltavam colocando caixas e mais caixas seladas dentro.

- Ei assim não! – Por algum tempo pareceu dar umas instruções aos sujeitos – Se colocar assim essa porra vai tombar e vai dar merda! – Os caras não pareciam ter a menor noção do que estavam fazendo, era nítido que eles nunca tinham tido contato com o transporte, passado o estresse se voltava ao velho e a moça enquanto os caras permaneciam enchendo o baú do caminhão.

- Desculpa pela falta de atenção, dia cheio! Então, o que me diz, ruínas? Córdoba? Aquelas peças que eu preciso? – falava de uma maneira tentadora, até mesmo pra um velho que gostava mais do interior que outra coisa.

O sorriso, o maldito sorriso nunca sumia do rosto, era enervante e ao mesmo tempo parecia manter tudo em ordem, a conversa fluindo divertida.

Era verdade os “shinglings” tinham o cabelo mais sedoso que os brancos do norte, e Shinji parecia gostar de chamar atenção com os seus deixando as pontas oxigenadas ficando com aquele tom loiro, a resposta vinha num bate pronto engraçado – Você que sempre teve mal gosto e se mete com puta feia. – o sorriso se transformava em gargalhada, mas sumia no exato instante quando as coisas se voltaram pra um tom de negociata.

- Olha só eu tenho que deixar essa carga em Córdoba. – a pé seria uns dias de viagem, de caminhão umas boas horas, não que Shinji fosse explicar isso. – Você sempre fala que quer ir pro interior, veja bem, lá é longe o bastante de qualquer grande centro, portanto é interior. – era o jogo de palavras malicioso. – Além do mais meu contratante falou que tem umas ruínas lá que seu pessoal não explorou, ISHALÁ muito ouro!!! E tem mais, o caminhão vai tá puro, tu pode tacar o que quiser aí dentro da carroceria, pode trazer todas a bugingangas e traquitanas que achar melhor, minha única condição é que se tu achar alguma peça que eu to procurando ou sucata de caminhão é minha, de resto tu fica com a sucata que for. – Olhou dentro dos olhos esbugalhados do velho e deu um sorriso – O filho da puta que tá enchendo meu caminhão tá pagando pra lucrar dez vezes mais, essa porra vai salvar a pele dele com o banco e vai com certeza dar uma rota melhor pra ele no próximo leilão!  Não quer lucrar dez vezes mais sucata e me dar só a comissão, Mu-Za? – arqueou uma das sobrancelhas e olhou em seguida pra Cala – E eu tenho espaço pra mais um se a senhorita tiver interesse, heim, se dar bem com o cartel, virar a chefe da porra toda, achar até barra de ouro enterrada e botar banca pra cima dos libs safados. – o desgraçado era bom com as palavras, não era atoa que os negócios iam bem.

Estendeu a mão pra cima deles, não tinha nada a perder, nem eles também.

Shinji jurou que o velho ia cuspir o pulmão depois da porrada, a mulher não era nada simpática, não que Adimu fosse muito melhor, mas pelo menos ele não saia dando porrada.

Não esquentou, não deixou o sorriso e a face simpática se deixar levar embora, até mesmo enquanto via o velho transtornado falando um monte de palavra que ele não fazia ideia do que significavam.

Shinji respondia à pergunta dele sobre a comissão, de novo! Com toda paciência do mundo. – O de sempre, peças de caminhão e tipo aquelas outras poucas que você achou da outra vez, de helicóptero. – balançou a cabeça em negativo – Todo mundo ainda acha que eu sou um sonhador ou doido por tá tentando fazer um treco desses voar de novo, mas eu vou fazer, e quando isso acontecer a gente vai voar por cima daquelas plantas do capeta e vai pra onde quiser. – ficou pensativo por um momento – Ah sim e salitre, isso vai ser difícil mas se por um milagre tu acha eu te prometo que te faço uns balotes praquela sua espingarda véia porcaria. Aquela porra ainda vai explodir na sua cara...

Ele se recostava no caminhão – Relaxa, tu pode ir no baú eu boto um balde pra vc cagar lá. Não sabia que além de gosto pra puta feia tu gostava de beber mijo. – a gargalhada vinha em seguida acompanhando a de Mu-Za.

- Se bobiar vai ter mais um com a gente, duvido que tu não conheça ele, primo da minha esposa, Heb, o maior negão que eu já vi na vida, rapaz eu não sei o que diabos a mãe dele pôs na comida dele quando ele era pequeno ou se foi vodu, só sei que ele dá medo, aquilo não é normal não. – era a única hora em que ficava sério durante aquela conversa toda, ficou olhando pra Adimu como se esperasse a reação dele, era difícil não notar um cara como Heb. Era bem provável que Fez inteira conhecesse o sujeito.

Achava interessante como o velho sucateiro tinha mais sabedoria nele do que parecia, se ligava no japonês voador, Japão era uma nação que já havia se ido há tanto tempo que ele só sabia que existia pelos livros de história e pelo que falavam no clã.
Shinji observava Adimu e o sorriso voltava pro rosto, ele era totalmente fora da casinha, mas sabendo lidar era inofensivo e engraçado até. – Não cara, ele é primo da minha esposa, ele não é nenhum daqueles retardados não – ele dizia rindo, mas o sorriso sumia rapidamente do rosto – Na verdade ele mata esses malucos, o cara é um anubita e dos brabos! – Ele olha intensamente pra Adimu só pra ter certeza que ele entende a gravidade da coisa. – Cara ficar de piadinha entre a gente beleza, mas com ele não, vai dar merda isso. – era um aviso amigável.

Ele tranca a boleia do caminhão deixa um dos caras do carregamento responsável pela carga, e promete estar de volta em no máximo uma hora, possivelmente até lá eles já teriam terminado.

- Minha esposa tá visitando ele, bora lá na casa dele, aí a gente aproveita, almoça e parte, beleza? – a pergunta era retórica, Shiji já falava aquilo se direcionando ao interior do mercado, já na rota pra casa de Heb, mas deixava uma pergunta pra Mu-Za no caminho. - Se não tem nada, então por que os anubitas querem ir tanto pro Cairo? - Olhava pro velho com um olhar de espertinho e arqueava uma das sobrancelhas.

Dormir era algo que fazia pouco, fosse pelas noites na estrada, ou pelas “obrigações” de recém casado. – Noites bem dormidas pra mim são raridade, mas eu não te invejo. – levantava uma das sobrancelhas e jogava um sorriso sem mostrar os dentes e seguia com o pessoal.

A caminho do restaurante ele escuta atenciosamente a proposta de Heb – A parada em Córdoba eu garanto, afinal é pra lá mesmo que tô indo, se tudo correr bem a gente chega lá de noite – Aquilo meio que respondia a pergunta da esposa. - Agora essa coisa que você quer eu não sei, eu acho que dificilmente vamos estar procurando a mesma coisa por lá, por mim sem problema, mas nessa aí você ainda tem que se entender com o Mumu ali. Mas se você vai ajudar ele, acho justo. – Já dava um novo apelido pro velho, típico.

Prosseguia na conversa dando atenção quando seu pai virava assunto – Se acabou de matar meu pai foi? – a pergunta tinha um nítido som de piada – Era não, ainda é, todo dia ele ainda levanta cinco da manhã, treina com espadas do café da manhã até a hora do almoço, pra depois do almoço treinar mais com espadas, só que aí ele ensina a molecada. – ele fazia a cara e voz de arremedo de novo – “Filho, eu sou de uma época em que os caminhões não existiam, seu pai tem que passar o conhecimento e manter a tradição.” – apesar do jeito brincalhão, era certeza que ele jamais faria algo assim na frente do clã e que de uma forma ou de outra ele respeitava aquilo – Então como meu pai é um sujeito muito, muito motivador, eu corri pros caminhões mesmo. – Ele dava uma risada alegre. – Deixa as espadas pros meus irmãos, ele que lutem!!! Afinal, alguém tem que trabalhar pra por comida na mesa né mesmo? – No entanto ele meneia em positivo sobre os homens serem lançados a provação e se matarem até não sobrar ninguém, ele concordava que aquilo era uma questão de tempo, Adimu não veria aquilo acontecer certamente, e possivelmente ele próprio também não, mas um dia aconteceria.

Quando finalmente a mesa está disposta o estômago ronca tava faminto e feliz por não estar perto do banheiro o bastante pra aquele almoço ser acompanhado do cheiro da cagada de Adimu.- Por favor e obrigado, “shushu” – não dava pra saber se a palavra era algo no dialeto dos shingling ou apenas um apelido carinhoso, mas Zuri sabia que aquilo era pra ela e só pra ela.

Ele come devagar, a coisa é quente demais pra ser devorada com facilidade, mas ele parece apreciar a comida, comida do tipo que faz a gente suar e de sabor forte – Na verdade num geral eu prefiro ir pro interior também, geralmente os fretes são melhores pra lá – Respondia a Mu-Za – Mas é que as coisas por lá não vão bem não, a coisa tá violenta, e eu fiz uma promessa, e promessa não se quebra. – ele olha dentro dos olhos de Zuri só por um instante. - Nossa passagem em Córdoba é o tempo de você achar algo que preste por lá, ou seja amanhã, por que amanhã é domingo e eu não dirijo domingo, é a única regra. – ele parecia bem sério sobre aquilo.