Após a queda do Salão de Mitral perante os orcs e do ataque dos dragões negros à Lua Argêntea, a guerra havia dado um tempo. O tempo estava servindo para a Grã-Senhora Alustriel trabalhar na reconstrução da sua cidade e no espírito de seus habitantes. Com tanto a fazer, a maga não entrou mais em contato com Johan ou com nenhum outro membro da Comitiva que ele tinha conhecimento. O próprio cavaleiro, então, resolveu se dar um merecido descanso, instalando-se na hospedaria no centro da cidade e por lá ficando até que houvesse trabalho de verdade a fazer.
Os dias se passavam de forma lenta e monótona, para não dizer chata e entediante, mas numa noite isso mudou com a chegada de estranhos visitantes à hospedaria.
Era tarde da noite e Johan era o único hóspede acordado. As chamas da lareira estavam quase se extinguindo, e apenas o pavio de uma vela ou outra teimava em manter-se acesa. O estalajadeiro havia ido para os fundos do estabelecimento para pegar a chave que trancaria a porta da hospedaria, e ele já ia retornando ao saguão quando viu a porta ser aberta abruptamente e uma rajada de vento frio passar por ela e adentrar o lugar.
Um homem adentrou o Lar dos Desobedientes numa postura arrogante. Seus olhos pequenos sob pesadas olheiras perscrutou cuidadosamente o local como averiguando se aquele seria um bom lugar para recebê-lo. Sua atenção não se deteve mais do que por dois segundos em Johan, e então ele se voltou ao estalajadeiro e disse com uma voz enviesada.
- Você não estava querendo nos trancar lá fora nesse frio, estava?
Jörmund era o nome do estalajadeiro, ele era um velho veterano de guerra, mas que naquele momento não mostrava muita confiança. O homem que entrou em seu estabelecimento portava uma lustrosa armadura negra, com cravos grandes saindo das ombreiras e cravos menores saindo pelos antebraços da armadura. Além disso, o homem portava uma espada larga às costas. Logo em seguida entrou uma segunda figura no Lar dos Desobedientes. Essa não portava armadura alguma, mas ao invés disso estava usando um manto marrom que lhe cobria dos pés a cabeça. Por debaixo de seu capuz só era possível ver o negrume da sombra.
- Não temos mais dormitórios disponíveis por hoje, senhores, se vocês quiserem poderão dormir no saguão – havia dito Jörmund. O seu olhar não parava de recair sobre a espada do cavaleiro de armadura negra.
O homem sob a armadura bateu com o punho sobre o balcão num ato de irritação.
- Não nos trate como quaisquer pedintes. Viemos de muito longe para resolver os problemas que vocês enfrentam, então eu quero o melhor que você tiver para passarmos a noite.
Jörmund pareceu que perderia a fala por um momento, mas ele olhou para o seu machado que mantinha pendurado na parede da estalagem atrás do balcão como a lhe lembrar os velhos tempos e ele então ganhou confiança.
- Sinto muito, senhores, mas devo dizer novamente que não temos quartos disponíveis. Todos estão ocupados, e não posso...
Ele parou de falar no momento em que viu o homem retirar uma adaga da bota de sua armadura. O cavaleiro girou a pequena lâmina entre seus dedos, uma brincadeira bastante insinuante sobre o que poderia acontecer dali para frente se o estalajadeiro mantivesse a sua postura.
- Ficaremos com o seu dormitório então, e você pode dormir do lado da lareira – disse o homem. Jörmund voltou a ficar sem palavras. Eram dois contra um, e seu machado estava a alguns metros de distância.
Enquanto o cavaleiro de armadura negra dava os primeiros passos em direção aos fundos do estabelecimento, a figura sob o manto esticou o braço e Johan viu uma mão esquelética sair por baixo do pano e despejar uma moeda de cobre sobre o balcão.
- Este é o seu pagamento – disse a figura, logo em seguida soltando uma risada aguda e fria.