Conversas Cotidianas

O som de armas se chocando era constante n'O Bastião.

Sede do governo e da milícia de Bryn, O Bastião é um conjunto de prédios completamente cercados por muralhas altas de madeira. Os pavilhões usados pela milícia foram construído ao redor do velho  Casarão Callahan, construído 90 anos atrás por Morcant Callahan, mago e  fundador de Bryn, hoje usado como sede do governo, e tem um pátio interno usado para prática diária, mas o espaço limitado fez que os oficiais, com o tempo, permitissem que a área além do pátio, mas delimitada pelos prédios, fosse usada para prática. Gloki estava no refeitório, que fica no prédio anexo ao edifício original da milícia, construído quando a cidade precisou de mais milicianos, mas não havia lugar para todos eles. A refeição hoje era a de quase todos os dias: pão não muito duro, ensopado de carne com legumes e água.

Apesar de ter sido aceito na milícia, o goblin não é exatamente bem-vindo. Gloki é respeitado por sua habilidade em combate e determinação, mas poucos ali consideram o goblin realmente um deles e ainda menos numerosos são aqueles que veem no pequeno companheiro de pele esverdeada alguém em quem possam confiar. Muitos já declararam abertamente que acreditam que Gloki está em Bryn apenas para espionar a cidade para a tribo que vive nas montanhas. Apesar da meia verdade nessas palavras – afinal, Gloki é da tribo Rhuulaac Rhuukaan, Ossos Quebrados em comum – a acusação foi ignorada pelos comandantes. Era por isso que Gloki quase sempre comia e fazia suas rondas sozinho e conversava apenas com um punhado de companheiros. O único momento em que a companhia de Gloki era disputada por todo eram durante as práticas. A ferocidade do goblin era um desafio grande o suficiente para a maioria dos homens ali, que viam nisso a forma mais rápida de aprimorar suas habilidades em combate.

Gloki estava comendo sozinho em uma das longas mesas. Havia outros guardas comendo, alguns fazendo um intervalo dos afazeres, outros por não terem outro lugar para comer. O goblin não era o único membro da milícia que não tinha parentes ou amigos em Bryn, e foi um desses que Gloki viu se aproximar dele. Kerwyn era um rapaz de 23 anos de Iria, uma cidade do extremo norte de Cuige Laighean, já próximo do reino de Midhe, e acabou morando em Bryn por ter conseguido um trabalho que julgou mais promissor. Kerwyn não era um exemplo de sagacidade, mas não era um completo idiota e se esforçava para aprimorar suas habilidades. Ele se sentou em frente ao goblin com seu cabelo cacheado e espesso caindo sobre os olhos também pretos. Ele colocou sua espada sobre a mesa, entre ele ele e Gloki, e pegou um pedaço de carne, mas não comeu imediatamente.

– Você soube que a filha do velho Duncan sumiu noite passada? – Kerwyn gostava de ficar informado sobre o que acontecia na cidade e sempre dizia tudo o que descobria para seus companheiros, o que era uma boa coisa, mas podia incomodar de vez em quando – Ela acordou na floresta ao norte, sozinha e – o rapaz baixou a voz – disseram que completamente nua. O que será que pode ter acontecido com ela?

Gloki estava comendo com sua típica cara emburrada, não era dos mais simpáticos e também não muito sociável, pouco se importava se os outros queriam ou não estar com eles, mas valorizava os que eram próximos de si e Kerwyn era um desses, o problema é que o garoto vivia com mexericos para todos os lados, ele sabia de tudo e de todos, e sempre que descobria algo, mesmo que fosse algo insignificante ele estaria lá, fofocando.

-Garoto, cê sabe que é um dos poucos que considero aqui deste quartel, mas as vezes essa tua mania de contar tudo que acontece incomoda...Se o velho não veio nos procurar para resolver o problema da sua filha não é de meu interesse... E nem deveria ser do teu.

Dizia ele enquanto arrancava um pedaço de carne e mastigava com a boca escancarada sem muitos modos.

-Cê tem alguma notícia que preste aí? Soube de outra coisa realmente interessante?

Dessa vez ele arrancava um pedaço do pão.

Os anos na milícia fizeram Gloki buscar melhorar sua pronúncia na língua comum, ele sentia-se estranho falando tão mal e juntamente com os mais próximos buscou aprender, afinal, se ele queria galgar os altos cargos da milícia, tinha que pelo menos saber ler e escrever bem. Nas suas folgas ele sempre tirava um tempo pra estudar.

Gloki percebeu que o rapaz ficou decepcionado pelo goblin não querer supor com ele motivos para a filha do velho Duncan ter acordado nua na floresta. Kerwyn era mesmo um bom rapaz, mas esse vício dele não incomodava apenas Gloki, mas muitos outros membros da milícia. Apesar disso, ele sempre vinha com uma história nova para contar. Depois de encher a boca de comida algumas vezes, deixando o som de espadas dominar o ambiente mais uma vez, Kerwyn disse com a boca cheia de pedaços de legumes cozidos.

– Leofric e Godiva começaram a se ver novamente – parecia que o conceito de interessante era bem diferente para Gloki e Kerwyn – Da última vez isso não deu muito certo. Você sabe... Toda aquela confusão com o pai dela proibir o romance deles e tudo mais.

Gloki ja começava a se irritar com o rapaz, a noticia do romance conseguia ainda ser pior do que a filha do fazendeiro perdida nua na floresta, pelo menos essa tem um ar de mistério, mas a proibição do romance entre Leofric e Godiva eram infinitamente mais desinteressante e melosa demais para o goblin. percebendo que se cortasse um assunto outro pior viria meio a contra-gosto ele volta ao assunto da filha do fazendeiro nua:

-Melhor voltar a falar sobre essa história ai da filha do fazendeiro...pois a o romance de Leofric e Godiva para mim são mais insuportáveis que se entupi de favo de mel de abelha...Então, o que o povo diz ai sobre esse sumiço ai?

– Eu não sei, acabei de saber disso – Ouvir que Kerwyn não sabia nada além de que a menina tinha acordado na floresta foi um tanto frustrante – ainda não tive tempo de falar com ninguém fora do quartel, e as pessoas daqui parecem não saber de nada!

O rapaz come mais duas colheradas do ensopado e começa a falar com ansiedade, ainda com a boca cheia.

– Morven não é visto há vários dias – um escriba que morava em Bryn, Moven era um homem recluso. Vivia sua vida de forma tranquila, dando muito mais atenção aos seus livros do que às pessoas – Ele ia todos os dias comprar alimentos frescos, mas faz quase uma semana que ninguém o vê e que ninguém atente à porta em sua casa.

Gloki ouve as palavras do garoto que sabe da informação mais não dos detalhes, isso é meio frustrante, mas nada que um estímulo não o ajudasse a descobrir. E quando Gloki achava que ele tinha acabado as noticias solta mais uma sobre desaparecimento.

-Omng...olhando direito até que algumas fofocas desse garoto desperta um certo interesse...mas um sumiço... Pensava ele consigo enquanto guardava na memória as informações.

-Otro sumiço!?, Essa vila ta muito mais agitada do que devia...Ei garoto, porque não procura detalhes dessas coisas aí? Se você conseguir mais informações pode ser até de valor pru quartel. E ainda podemos ir verificar...Quem sabe conseguimos uma moedas...Isso aqui ta muito parado, não costumo gostar de calmaria, me irrita.

Dito isso, Gloki dá uma grande golada e arranca mais uma pedaço de carne em seguida de pão, enchendo muito bem sua boca de modo que sua bochechas ficassem inchadas.