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    Irina Marsh - [ ayana ]

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    Mensagem por Lightning Sex Jun 01, 2018 2:49 am



    Irina Marsh - [ ayana ] RFYv6P0

    Irina Marsh e seu filho Thomas vieram até Boriska em busca de abrigo e refúgio. A mulher de 32 anos, sempre sonhou em ser escritora, mas se viu obrigada pela vida a trabalhar como padeira e confeiteira afim de sustentar sua família, sempre em busca de uma vida melhor. Thomas, seu filho, nunca teve uma infância comum, fato que de certa forma preocupava sua mãe, mas isso o fez um garoto forte e até um tanto quanto fechado, ficando longe de ser uma criança mimada. David, por sua vez... Costumava ser o principal âncora do mais famoso telejornal de Boriska, até ser demitido graças ao seu alcoolismo que se agravou após o divórcio de um casamento que durava 20 anos.

    Irina e seu filho vagavam com as notícias da guerra iminente que assolaria Boriska. Os abrigos foram superlotando um a um, sua casa estava localizada em uma área de extremo risco, por isso fora obrigada a abandoná-la e quando tudo parecia perdido... Encontrou David, que após retornar de uma viagem do exterior, encontrou sua grande e luxuosa casa totalmente saqueada e em péssimas condições, mas resolveu abrigar a viúva e seu filho quando os mesmos fugiam de um grupo de bandidos e não tinha onde ficar. Estavam então no início da guerra, no princípio do fim... E só tinham uns aos outros a partir daquele momento.


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    Mensagem por Lightning Dom Jun 03, 2018 3:02 pm



    Irina Marsh - [ ayana ] SiqH35j

    "Se estiver passando pelo inferno, continue caminhando." - Winston Churchill


    15°C ~ 12:45 am

    Irina olha através da janela estilhaçada em seu novo quarto, sentindo o vento frio soprar seu rosto. Consegue ouvir batidas de martelo, pois David - o homem que havia oferecido abrigo a ela e seu filho - estava pregando alguns pedaços de madeira na porta dos fundos que teve sua fechadura totalmente destruída, além de algumas janelas que também precisavam de conserto. Ela até se ofereceu para ajudar, mas David resmungou que só tinha um martelo no local, por isso ele iria usá-lo. A casa, por mais luxuosa que parecesse ter sido um dia, agora estava cheia de marcas de tiros e móveis estraçalhados. Não havia sobrado nada de valor, o local contava apenas com o fogão, geladeira e as camas, que não puderam ser levadas pelos bandidos. O ex-âncora - conforme Irina logo notou - parecia um tanto quanto ríspido e mau-humorado demais, mas ela não esperava menos que isso, visto que ele também se encontrava em maus lençóis e mal podia sair do país, por causa da guerra ter paralisado todos os aeroportos e fechado todas as fronteiras. Thomas estava sentado sobre a cama de casal de sua mãe e olhava para ela com uma expressão contemplativa que levou alguns momentos até ele resolver quebrar o silêncio:

    — Eu não gosto daqui, mas sei que não tem outro jeito. Acha que ele vai deixar a gente ficar?

    O garoto falava em um tom sério e parecia cansado. Você sentia os nervos à flor da pele devido ao início do dia e a perseguição dos bandidos. Ainda estava sentindo o peso do estresse causado por perder tudo o que tinha e a pergunta de Thomas só fez essa sensação aumentar ainda mais, pois não era uma questão fácil de responder, ainda assim você sabia que era uma pergunta bem fundamentada.

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    Mensagem por ayana Sex Jun 08, 2018 1:34 am



    Irina Marsh



    Durante cinco anos a guerra ficou adormecida, mas não desapareceu. Até poucos dias atrás, manifestava-se apenas nos pesadelos de Irina, numa frequência cada vez menor. Era possível até acreditar que o passado não escondia sofrimentos tão grandes. O tempo se encarregava em diluir a dimensão da dor, em apagar memórias que resgatavam o retratado da completa degradação da vida humana. Quando sacrifícios eram necessários para conquistar aspectos inerentes àqueles que viviam em paz. Se houvesse algum saldo positivo da guerra seria o filho permanecer vivo e a esperança de que o pior já havia passado.

    Falsa esperança. O passado estava de volta... a vida de Irina era cíclica e a roda do eterno retorno não havia parado de girar.

    Pela segunda vez, a guerra levou sua esperança e ameaçava levar a vida de seu filho. Era ele quem dava corda para que a roda não parasse de girar. Para que Irina tivesse forças para reviver seus pesadelos. Ele trazia um feixe de esperança em uma tempestade de raiva e de medo.

    "Ainda estamos nos primeiros dias de guerra e é assim que me sinto. Os próximos dias serão cada vez piores", refletia enquanto a tempestade dentro dela começava a transbordar em gotas de lágrimas. Sua mente trazia de volta breves relances da guerra em seu país de origem; uma síntese, como se ela tivesse que contextualizar a tragédia para um leitor de jornal. O atual conflito tinha várias semelhanças com a guerra do passado, o que indicava que a possibilidade de um acordo de paz seria proporcional ao sangue derramado.

    Nina secou as lágrimas na manga da blusa antes de se virar para o filho. Aos olhos de uma mãe, os filhos sempre crescem rápido demais. Ainda mais para aquelas impedidas de acompanhá-los crescer porque a preocupação inicial sempre foi a sobrevivência. Irina talvez tivesse uma vantagem na guerra que levava pessoas como David a condições de vida com as quais ela já estava habituada. O que não queria dizer que a guerra nivelava as diferenças sociais. Para aqueles que tinham muito restava um pouco; para aqueles que tinham pouco não restava quase nada. Irina estava aliviada por pelo menos conquistar um teto.

    - Eu não gosto daqui, mas sei que não tem outro jeito. Acha que ele vai deixar a gente ficar?

    - Eu não sei… - disse com a voz um pouco abatida. Era incapaz de demonstrar qualquer otimismo naquele mundo miserável - Assim como nós, ele está abandonado à própria sorte no meio dessa guerra. A gente pode… aliás, a gente precisa se ajudar mais do que nunca - respirou fundo e fechou os olhos para pedir a Deus que estivesse certa.

    - Olha, filho, é bom a gente prestar muita atenção nele. Ele até parece confiável, mas não se esqueça que estamos correndo riscos o tempo todo. Por mais que eu também não goste daqui, este parece ser o lugar mais seguro por onde a gente passou até agora.

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    Mensagem por Lightning Seg Jul 02, 2018 1:34 am






    Thomas não pareceu muito conformado com a resposta da mulher, mas levantou-se da cama indo em sua direção e lhe deu um abraço silencioso, pressionando o rosto contra seu corpo como se buscasse algum refúgio mesmo já estando em um. "Refúgio". Tal palavra resumia a vida daqueles dois nos últimos anos. O som de batidas continuava até ser interrompida com um grito, acompanhado de um xingamento. David parecia ter se machucado. O som de passos foi ouvido e então a porta cuja tranca estava arrombada, se abria com um som de rangido, mostrando o homem com um sangramento leve mas notável em sua mão direita. Ele olhava para Irina e para o garoto, como se soubesse que estava interrompendo um momento entre os dois, mas não quisesse admitir.

    — Eu... Me cortei com um prego que estava exposto, vou fazer um curativo. Enquanto isso, você deveria continuar o trabalho por mim, já que está escurecendo e parece que vai chover logo. — Ele continuava mostrando uma carranca de mau-humor. Caminhou até a cama, deixando o martelo em cima da mesma e então saiu dali rapidamente. Ao olhar pela janela, a mulher notou que nuvens negras e pesadas se formavam rapidamente. David havia sido homem do tempo antes de se tornar âncora, ele não erraria uma previsão dessas, ainda mais uma tão óbvia.

    — Melhor fazermos o que ele pediu, não queremos problemas. Pode deixar que eu uso o martelo, mãe... Eu consigo fazer isso. — Thomas disparou, separando-se dela e pegando a ferramenta com um olhar determinado.

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    Mensagem por ayana Seg Jul 09, 2018 7:08 pm




    Irina Marsh



    Irina puxou o rosto de Thomas contra o peito e acariciou seus cabelos. Deu um beijo no topo da cabeça dele e começou a cantar bem baixinho:

    "Às vezes no silêncio da noite"

    Durante as noites da guerra passada, na tentativa de acalmar o filho, ela o segurava no colo e cantava:

    "Eu fico imaginando nós dois"

    A música, com um som muito fraco, preenchia o ambiente com uma paz igualmente frágil.  

    "Eu fico ali sonhando acordada
    Juntando!
    O antes, o agora e o depois"

    Ela competia, sem nenhuma chance, com o sons do lado de fora, da guerra, de metralhadoras e explosões.

    "Por que você me deixa tão solta?"

    Impotente, não havia nada que Irina pudesse fazer para encerrar os tiroteios.

    "Por que você não cola em mim?"

    Mas ela conseguiu, vez ou outra, fazer o filho dormir em seu colo, com a cabeça apoiada no ombro dela.

    "Tô me sentindo muito sozinha..."

    Era naquele sono profundo, no ar quente da respiração em seu pescoço, que Nina encontrava sua paz.

    Parou de cantar quando ouviu David soltar um palavrão.

    - Ele deve ter se machucado - comentou com o filho em voz baixa, sem soltá-lo de seus braços. Queria passar mais tempo naquele abraço. Fazia anos que eles não ficavam assim. A última vez foi durante a guerra… mais uma vez a roda viva reconstituía lembranças. Dessa vez, lembranças boas. Havia um lado positivo na guerra: Irina ficava quase o tempo todo ao lado da pessoa amada, que todos os dias ouvia um "eu te amo" sussurrado. Esse último fora abafado pelo rangido da porta se abrindo. Ela olhou preocupada para David que estava na porta.

    - Está tudo bem? - Olhou para o sangue escorrendo na mão direita dele.

    - Eu... Me cortei com um prego que estava exposto, vou fazer um curativo. Enquanto isso, você deveria continuar o trabalho por mim, já que está escurecendo e parece que vai chover logo.

    Nina concordou acenando com a cabeça. Ele deixou o martelo sobre a mesa e foi embora depressa. Pareceu desconfortável ao interromper o momento de mãe e filho, que não duraria muito de qualquer forma porque havia muito trabalho a ser feito. Ciente disso, Thomas logo se desgarrou dela.

    - Melhor fazermos o que ele pediu, não queremos problemas. Pode deixar que eu uso o martelo, mãe... Eu consigo fazer isso.

    Ela respondeu com um sorriso cansado. Se deu conta, mais uma vez, de como ele havia crescido. Agora ele estava mais forte, o que fazia a mãe também se sentir assim. Ela se levantou e foi até ele.

    - Sei que consegue, meu querido - passou a mão nos cabelos dele mais uma vez. - Vamos lá! Eu seguro as tábuas e você coloca os pregos.

    Irina queria observar se Tom realmente estava pronto para se virar sozinho. Pressionou a tábua na batente da porta e mostrou para o filho como deveria bater no prego com um martelo. Enquanto ele executava as batidas, ela não pôde deixar de se lembrar da imagem do ex-marido, pregrando tábuas depois que uma bomba estilhaçou os vidros das janelas de casa. "É como se você, Ed, tivesse voltado pra mim; pra que eu não tenha que lutar sozinha mais uma vez. Veja só como a nossa criança cresceu! Como se parece cada vez mais com você…"  

    Ao se certificar de que Tom estava fazendo o trabalho com cuidado e constatar que só faltava colocar mais alguns pregos para reforçar o bloqueio da porta dos fundos, ela se virou para ele dizendo:

    - Coloque mais um prego aqui, aqui e aqui - apontou para os cantos das tábuas. - Vou ver se nosso anfitrião está bem.

    Ela foi andando devagar pelos corredores, chamando pelo nome de David. A casa era muito grande e ela ainda não havia entrado em todos os cômodos.

    - Com licença, vim ver se está tudo bem com você. Posso ajudar com o curativo se precisar.

    Na verdade, a motivação para o encontro era a velha insegurança, sentimento indigesto que era preciso aprender a tolerar para só assim não se sentir paralisada pelo medo.

    - Já é bem tarde e sei que não estamos seguros aqui. Essa casa grande pode chamar atenção de mais bandidos. Quero saber se sobrou alguma coisa que podemos usar de arma para nos defender essa noite - disse encarando os olhos de David com seriedade.

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    Mensagem por Lightning Seg Jul 30, 2018 2:52 am






    Irina o encontrou na cozinha, usando o conteúdo de uma garrafa para "limpar" o ferimento. O corte parecia ter sido mais profundo do que quando ele lhe mostrara minutos antes.

    — Não, mesmo se você pudesse fazer algo, não é como se estivéssemos cercados de materiais de primeiros-socorros. — Ele então ouviu o restante do que ela disse e tomando a garrafa em sua "mão boa", deu um gole que fez com que a mulher fosse tomada pela surpresa, visto que aquilo era vodka pura. David suspirou e então virou-se na direção dela, recostando na pia. — Não temos nada útil. Os desgraçados que invadiram esse lugar pegaram tudo o que podia ser pego, nós vamos ter que nos virar com o que temos. Eu já vi os armários, temos 4 latas de comida em conserva, só vão dar pra nos alimentar durante essa noite. Tem uma fresta no teto do segundo quarto de hóspedes pela qual podemos colher água da chuva. Deixei um balde lá. Precisamos sair pra explorar a vizinhança, já que muita gente fugiu. — Ele dá outro gole na bebida. — É a única escolha que temos, mas só podemos sair à noite. Durante o dia, temos grandes chances de sermos assassinados. Bem... Durante a noite também, mas as sombras podem ser nossa vantagem. Por enquanto não se preocupe com invasões, os bandidos ao redor devem pensar que a casa tá vazia, pela bagunça já devem ter invadido isso aqui várias vezes. Mas não vão nos deixar em paz por muito tempo depois que descobrirem que estamos aqui.

    O homem tinha um semblante pessimista. Os olhos de Irina foram de encontro às mãos do homem, fazendo com que ela notasse o brilho da aliança dourada na mão esquerda do mesmo que ao perceber o olhar da mulher, bufou impaciente.

    — O que é que você tá olhando? — Resmungou, escondendo a mão dentro do bolso da calça.

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    Mensagem por ayana Ter Ago 14, 2018 9:38 pm




    Irina Marsh




    No primeiro momento, Irina ficou surpresa ao ver David beber a garrafa que usava para limpar o ferimento. "Vodka", foi o primeiro palpite dela, confirmado segundos depois quando sentiu o cheiro de álcool. Calada, ela o observou beber mais de uma vez. A cada gole, ficava mais visível na expressão dela como aquele comportamento lhe incomodava.

    Condições degradantes levam pessoas a beber. Ainda que jamais fosse admitir, Irina sentia vontade de se embriagar para esquecer da guerra por algumas horas. Mas não pediu nem mesmo um gole, consciente de que David não iria se opor caso ambos resolvessem terminar a garrafa ainda naquela noite. Ele era tão famoso que até mesmo uma pobre refugiada conhecia seus problemas de alcoolismo. Como o principal apresentador de jornal do país teve sua carreira devastada por garrafas como aquela.

    Ao descobrir sobre o estoque de alimentos, Irina se deu conta de que sobreviver a este conflito exigiria sacrifícios maiores do que aqueles de cinco anos atrás. Em sua cidade de origem, ainda pôde contar, durante alguns dias, com a solidariedade de amigos e vizinhos. Agora ela precisaria ir atrás de mantimentos ou, em outras palavras, saquear as casas ao redor. E se encontrasse outras pessoas por lá? O que ela faria? Enquanto antecipava tais conflitos, convicta de que sairia naquela mesma noite para garantir que teriam o que comer no dia seguinte, seu olhar se fixou na aliança na mão de David.

    - O que é que você tá olhando? - Ele resmungou.

    - Nada - ela abaixou o rosto e viu os próprios dedos tateando o lugar onde antes estava sua aliança. - Eu também já fui casada até o meu marido se tornar uma das vítimas da guerra… - suspirou e não conseguiu mais falar.  

    Ela sentia que usava uma aliança invisível. Talvez porque sua mente se convenceu disso quando ela teve de vender a aliança para pagar os custos da viagem a Boriska. Nina voltou a pensar em Ed, o ex-marido. Em como não havia restado nada que pudesse conectá-la à existência dele. Restaram lembranças que poderiam muito bem ser afogadas com vodka, em vez de regadas por lágrimas mais uma vez. Seus olhos voltaram a cruzar com a garrafa de bebida e então… ela prestou atenção no barulho de marteladas, cadenciado com as batidas de seu coração.

    Não poderia haver conexão maior com Edmund do que essa. "Nosso garoto, Ed..." - o pensamento trouxe um sentimento de gratidão pelo ex-marido - "está trazendo o que havia de mais bonito em você" - e se manifestou em um discreto sorriso.

    Sempre que era necessário lutar, o filho se fazia presente em seus pensamentos. Não foi diferente dessa vez. Ela preferia sair sozinha para procurar por comida e assim evitar que Thomas ficasse sozinho em casa. Estava no primeiro dia, o que tornava impossível saber se, dessa vez, havia encontrado um lugar seguro para ficar. Irina tinha pressa de sair, até porque em breve viria a chuva.

    - Olha, você pode ficar aqui, cuidando desse ferimento, terminando de fechar a casa. Eu quero garantir o quanto antes que teremos o que comer amanhã de manhã. Vou lá ver se sobrou alguma coisa nas outras casas.

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    Mensagem por Lightning Sáb Set 01, 2018 9:11 pm





    Pensar em Thomas e em tudo o que tiveram que passar juntos para sobreviver chegando até ali encheu Irina de determinação, mas também sabia que para sair dali teria que deixar seu filho com um estranho, estava disposta a fazer algo assim? Talvez fosse a única opção, mas David a encarou como se estivesse se sentindo ofendido.

    — O que te faz pensar que eu deixaria você se arriscar sozinha lá fora? — A voz do homem soou um tanto mais alta do que deveria, talvez por efeito repentino do álcool. — Me... Desculpe. — Ele se retratou, parecia não ser tão grosseiro afinal. — Eu só não posso permitir que você faça algo tão perigoso quanto sair assim sem ajuda nenhuma. Seria melhor eu mesmo fazer isso, eu viajo muito mas conheço um pouco da vizinhança e posso procurar algo enquanto você descansa com o garoto. Amanhã você sai e eu fico.

    Ele parecia sério em sua proposta. Repousou a garrafa ao lado da pia como um ato responsável para mostrar que estava disposto a cooperar. Aquele homem não parecia nem um pouco previsível... Em um momento exibia sua expressão carrancuda que parecia a de um velho amargurado, já em outra... Parecia um tanto protetor. Ou talvez só estivesse querendo se certificar de encontrar algo interessante para si mesmo, você não tinha como saber ao certo. O fato é que ele não estava disposto a simplesmente deixar sua hóspede sair sem mais nem menos, porém a decisão ainda pertencia a Irina.

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    Mensagem por ayana Dom Set 09, 2018 9:07 pm




    Irina Marsh





    - O que te faz pensar que eu deixaria você se arriscar sozinha lá fora?

    Irina arqueou as sobrancelhas como se não tivesse entendido a pergunta. A expressão que, a princípio, traduzia perplexidade logo foi ofuscada pelo olhar flamejante de uma loba impedida de retomar a liderança da alcateia. Ela não estava pedindo permissão a David. A proteção que ele poderia oferecê-la era um detalhe secundário porque na guerra todos os civis são fracos. Muitos vão morrer e, enquanto ela mesma não fosse uma das vítimas, iria garantir que seria capaz de se virar sozinha. Uma condição indispensável para alguém cujo único objetivo era proteger o filho.  

    - Não estou pedindo sua autorização - respondeu contrariada.

    David pediu desculpas e se justificou, dando a entender que sentia uma preocupação verdadeira pelo bem-estar da refugiada. Ainda assim, não era possível se assegurar de que ele era confiável, não apenas pela desconfiança geral concebida pela guerra, como também nas demonstrações de instabilidade em seu temperamento. Deixá-lo sozinho com Tom, embora inevitável, não era uma ideia que a agradava. Mas para qualquer decisão, os riscos são inerentes; e deixar o filho com um estranho parecia a opção mais sensata, se estava decidida a sair.

    - Vai ser melhor eu sair agora e você ficar aqui e cuidar desse ferimento. Você sabe melhor do que eu o que precisa ser feito para nos protegermos na sua casa. Tom pode te ajudar. Ele já é bastante maduro e responsável para a idade dele. - Ela voltou a olhar para a mão dele ensanguentada. - Se eu tiver sorte, também vou trazer curativos e medicamentos.

    Por não dever nenhuma satisfação a David, convencê-lo foi uma tarefa fácil. Mas o mesmo não era de se esperar, quando Irina fosse conversar com o filho. Na melhor das hipóteses ele aceitaria sem muitos protestos, sem que a mãe tivesse que demonstrar autoridade aos berros. Para isso, a abordagem precisaria ser delicada como colar cacos de um vaso de porcelana. Antes de entrar no assunto, ela elogiou o trabalho na porta, ficou de joelhos e deu um abraço tão apertado que era possível sentir no peito as batidas do coração dele.

    - Querido, eu vou sair para buscar comida e quero que você fique aqui para ajudar o David no que ele precisar. Ele fica com aquela cara fechada o tempo todo, mas acredito que ele realmente se preocupa com a nossa segurança. Por isso tente se mostrar mais prestativo. Lembra que eu te disse que a gente precisa se ajudar o tempo todo?

    Ela segurou a mão dele com as duas mãos, olhou em seus olhos e disse:

    - Não se preocupa comigo, tá? Não vou muito longe e volto assim que encontrar alguma coisa pra gente comer.

    Nessa situação, ela sempre se dava conta de como era difícil partir e perder o filho de vista. Uma voz baixa, com tom desesperado, sempre ecoava em sua mente, trazendo à tona o medo indescritível de eles não voltarem a se encontrar. A voz reivindicava algumas precauções. Nina apertou a mão de Tom para que ele prestasse atenção no que ela iria dizer. Primeiro, que ele ficasse atento a David, principalmente, se o visse bebendo. Também combinou um ponto de encontro, não muito distante dali, onde Tom poderia se esconder e esperar pela chegada dela, caso precisasse fugir.

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