Diana Redford - A Voz

08:45 AM - 7 de novembro de 1981

Diana mal havia acabado de chegar na estação local. O trabalho com as transmissões se dava no próprio local, dado que era onde ficava a maior antena e maior capacidade para reproduzir os sinais - com isso, e com a necessidade do dia a dia, o trabalho ali era caótico. Todo mundo fazia um pouco de tudo. Algumas coisas caíam no colo de Diana por ter um histórico militar na família e hoje, foi um desses dias. Assim que sentou-se na cadeira, o dono da estação abriu a porta e colocou a cara para dentro. Havia um sorriso. Empolgação. Incomum para a situação pela qual a cidade estava passando. Imbecil. Não sabe se ouviu uma voz falar isso, ou se ela mesmo pensou. Mas independente de onde tivesse vindo, estava certo - Lloyd Campbell realmente era um imbecil. Completamente movido por dinheiro, a rádio mais passava propagandas do que informação. Mesmo os noticiários eram entupidos de anúncios a cada 30 minutos.

- Diana! Prepara suas coisas, o tio do moleque tá aqui e concordou em dar uma entrevista. Faça o papel da entrevistadora triste e arranca tudo o que puder! Entreamos ao vivo em alguns minutos.

Podia simplesmente dizer não. Mas talvez fosse uma oportunidade boa para conseguir algumas informações.

Lloyd tirou a cara da porta, que se fechou logo em seguida - era um vidro vazado, então era possível ver o suposto tio do garoto do lado de fora conversando com Lloyd. Apertaram as mãos rapidamente. O homem mantinha o semblante sério, não tinha o sorriso fácil como o dono da rádio, mas ao mesmo tempo havia um ponto na expressão dele que não era tão fácil de entender. Aquilo era apenas impressão e a primeira sempre é bastante marcante, mas não parecia o semblante de um homem que eatava sofrendo. Era até compreensível, podia ser uma relação distante e estava ali tentando fazer sua parte pela família, mas ainda assim - teve uma impressão estranha com essa primeira vista. Podia conversar e entender melhor o que ele tinha a dizer, claro.

Alguns segundos depois, a porta se abriu novamente - Lloyd e o tio de Elijah.

- Senhorita Redford, esse é Liam Walker. Tio do Elijah, por parte de pai. Ele aceitou nos ceder alguns minutos do seu tempo para dar uma entrevista e ajudarmos a polícia na investigação desse terrível desaparecimento. Sr. Walker, por favor, fique a vontade. A srta. Redford irá lhe passar as instruções.

Imbecil. Mais uma vez, não se sabe se foi uma voz ou ela mesmo pensou. Mas, como antes - ambos certos.

(OFF: Ele é o tio do Elijah, Elijah é o menino que sumiu).

- Certo, entendido. Se possível... Eu gostaria de falar algumas palavras sobre nossa família ao final da entrevista, talvez possa ajudar.

E então, se manteve em silêncio - aguardando o retorno de Diana. Com aqueles poucos segundos, ouviu mais uma vez "imbecil". Bom - não era seu chefe, ele já não estava ali na sala e com essa última intromissão mental das vozes, algumas memórias vieram em seguida. O sentimento ainda era distante, mas foi se aproximando e finalmente chegou. Liam Walker. O nome era estranho, até que não era mais - ele tinha concorrido para o cargo de prefeito há 3 anos contra o atual prefeito e fez uma campanha terrivelmente suja, inventou mentiras, envolveu a família do seu adversário político e fez o possível e o impossível, mas perdeu - e não por pouco. Teve apenas 6% dos votos. Mas embora a enorme maioria o tenha rejeitado, ele parece ter ficado com um gosto amargo na boca que os anos não tiraram.

- Pode começar quando quiser, srta Redford.

Ele manteve o semblante sério durante todo aquele período inicial da conversa, mas num dado momento e este momento exatamente quando Diana lhe pediu que falasse de sua campanha no passado e de como isso poderia ter influenciado o desaparecimento de Elijah, ela viu um brilho nos olhos do homem e talvez ele próprio tenha percebido, com isso corou de forma breve e tossiu, talvez tentando disfarçar o desconforto próprio com a situação. Se ajeitou na cadeira, puxando a parte de trás da camisa e só então voltou a falar.

- Claro. Eu acho que muito do que aconteceu tem a ver com política... Não quero apontar dedos, mas a minha derrota foi uma grande articulação do senhor que ocupa a cadeira de prefeito hoje.

O prefeito atual, Clayton Dubois ou como era conhecido e chamado pela maioria da população, Clay. Não parecia ter muitas inimizadas, a não ser o próprio Liam. Considerando Clay como uma entidade separada, ele era reconhecido e até certo ponto, tinha o apoio da população, assim como era bem quisto. Do que conseguia trazer na memória, não havia nenhum problema com a forma na qual ele administrava a cidade, mesmo que fosse uma cidade pequena e ela por si só não gerasse problemas graves ou que exigissem alguém muito exemplar com administração pública. De qualquer forma, Liam era um ávido crítico de qualquer medida que Clay fizesse, seja a inauguração de uma pequena praça pública ou a forma como os gastos do ano seriam divididos, para que os serviços pudessem atender a população. Desde que perdeu a eleição, Liam manteve um foco e uma obsessão em criticar Clay e em boa parte das vezes, criar factoides.

- Depois de ter fraudado as eleições e ter me vencido de maneira desonrosa, ele sabe que pretendo concorrer novamente e eu tenho convicção de que o podre Elijah foi uma vítima para desestabilizar minha família. Não estou dizendo que o sr. Dubois tenha algo a ver com isso, mas as coisas se encaixam.

Aquela voz sussurrou novamente na mente de Diana, enaltecendo o óbvio: "não se encaixam".