Ato I - Ariel, Johan, Aeltlas e Baraz

Aço e Magia

À beira da rua, displicentemente posicionada, estava uma banca. Talvez uma mistura de banca e carrinho, difícil dizer. Uma série de gemas de muitos tipos e formas, algumas delas cobertas de inscrições estranhas, estavam expostas em sua superfície, e um mostruário apoiado em seu lado expunha amostras de lâminas de diversos tamanhos e formas, além de manoplas, arcos e algumas lanças, tudo de excelente qualidade. No outro lado, uma mesa repleta de cuias e cestos continha ervas, frutos, sais e fluidos de uma miríade de tipos. Atrás da banca, sentado em um banco e apoiado num canto vazio de produtos, um jovem que parecia beirar os 17 anos lia um grande e aparentemente pesado livro, completamente distraído dos seus arredores, e não muito interessado em promover sua mercadoria.

-...e mesmo resolvendo o fluxo térmico, a energia cinética também seria virtualmente impossível de conter e direcionar. A sequência de Harlang é uma solução promissora, mas duvido que ela pudesse conter os vetores hermeticamente, eles provavelmente escapariam no eixo y e... olá?

Os olhos muito verdes cobertos por óculos com armação de osso se ergueram para depositar-se na mulher à sua frente. Ela não estava fazendo uma pergunta, então Ariel não ia responder. Ela trazia dois tipos que batiam bem com estereótipos de aventureiros, e ela também não estava nem um pouco longe disso. Ariel ficou imediatamente curioso quanto a essa empreitada.

O jovem tinha cara de mago. Jeito de mago. Cheiro de mago. Ele era pequeno e magro para um homem, e sua aparência jovem discordava do brilho furiosamente inteligente de seus olhos. Ele tinha pele alva com algumas poucas sardas, cabelos muito ruivos e olhos muito verdes. Vestia um colete de couro cru por cima de uma túnica azul arroxeado, com calças de lã e botas, além de luvas leves e resistentes. Um par de óculos de proteção de vidro grosso e escuro com amarras de couro pendia em seu pescoço e ele conseguia transmitir um ar de profundo desinteresse e ávida curiosidade numa só expressão.

- Toda pessoa é útil, desde que esteja disposta a ajudar.

Johan se aproxima da barraca e de seu proprietário, observando-o com calma e atenção. O cavaleiro não diz nada ao homem, ficando ao lado de Arianna e esperado que ela faça o convite. Enquanto isso, Johan, mais de perto, percebe que o homem na verdade aparenta ser apenas um rapaz pequeno e mirrado; claramente uma pessoa que deve fazer juz ao grande livro que tem no colo. Aparentemente Arianna, Aeltlas e ele próprio são bons combatentes, e um apoio arcano seria inestimável nesta missão.

Aeltlas presta atenção em cada detalhe do pequeno rapaz, embora este não consiga ver seus olhos, devido ao capuz negro e pesado que fica sob a sua cabeça. Acha que esse garoto não ajudara a combater orcs, ele é muito novo!

- Nao me leve a mal garoto, mas vocês tem certeza? vira seu rosto calmamente para Arianna e Johan. - Ele não deve ter mais que 15 invernos. Nossa estrada é gelada e vamos lidar com orcs, não com livros em uma biblioteca.

Aço e Magia

O jovem mago deu um sorriso ao ouvir o comentário do homem a cavalo. Típico de alguém que não vê além do alcance de seus olhos. Ele vira as páginas de seu livro, aparentemente ao acaso, e se levanta do banco.

-Seus olhos o enganam a respeito de mim, e vão continuar a enganá-lo a respeito de tudo mágico. Não encontrará um arcanista mais habilidoso que eu num raio de muitas milhas. Nem arcanista, nem artífice. Está em meu poder fazer coisas que suas lâminas e flechas nem sequer sonham. O fogo, o aço e a mente dos fracos são meus brinquedos. Eu poderia lhes dar uma prova de meu poder, mas acho que isso atrairia espanto desnecessário...

Ele aponta para as gemas em seu bacão.

-Basta dizer que fui mandado para cá para suprir esta cidade por meus bens superiores. Uma mago não pode construir nada capaz de fazer algo que ele mesmo não possa, nem com mais eficiência.

Johan vê que Arianna amenizou o clima de forma muito mais sutil que ele, e o cavaleiro aproveitou para falar com o mago, sempre com sua voz rouca e contida.

- Meu nome é Johan Filho da Ruína, servo de Tyr e membro da Ordem dos Cavaleiros do Julgamento Sagrado. Qual o seu nome, rapaz?

Aeltlas escuta o que o jovem disse com atenção, e pensa consigo mesmo: Um mago desta idade? Não tinha tido muitas experiencias com arcanos, no maximo xamas orcs, e isso despertou a sua curiosidade em aprender mais sobre isso. Mas é claro que não cederia a sua opinião facilmente.

- Veremos, diz Aeltlas.

- Sobre a demonstração, Arianna, acho que o guri vai ter a oportunidade de demonstrar mais pra frente. Afinal, atirar uma flecha em um alvo parado é fácil, agora atirar uma flecha em um orc investindo na sua direção com um machado de duas mãos não é tão simples. As mãos começam a tremer, o suor começa a escorrer pelo rosto, o medo começa a bater...diz Aeltlas.

Após os comentarios de Johan, Aeltlas tambem se apresenta. Ele levanta seu capuz, mostrando um rosto com algumas cicatrizes, a maior sobre um dos olhos, que é branco. Seus cabelos são longos em tranças presas por tiras de metais. Não possui uma aparencia muito carismatica, e aparente ter uma idade proximo aos 30 anos.

- E eu sou Aeltlas guri. Espero que faça mais do que ler livros no campo de batalha, diz Aeltlas, com um leve sorriso não de desdenho, mas de bom humor.

Ariel ouviu os três aventureiros e manteve o sorriso.

-Não me entenda mal, eu não preciso provar nada, a proposta foi em resposta ao comentário de seu companheiro. - ele olha ao redor, para sua venda - Será um prazer ir com vocês nessa aventura, com uma condição: o chefe desa tribo carrega um fetiche pessoal. Eu o quero. Se estiverem de acordo, apenas me deem o tempo para guardar minhas coisas e os acompanharei.

Johan não se espanta ao mago falar sobre algum artefato mágico, e nem fazia questão de descobrir como ele soube disso, mas o que mais lhe importava já havia sifo respondido: a razão pelo qual o jovem mago decidiu acompanhá-los. Não era nada muito honrado, mas dificilmente ele os atrapalharia.

- Eu estou de acordo. Você só não nos disse seu nome.

O jovem mago, tomando o silêncio dos dois aventureiros de couro por consentimento, começa a guardar suas coisas, desmontando lentamente a banca em o que começava a se assemelhar a um carrinho de mascate.

-Bom, tecnicamente sua amiga também não disse o nome dela. - ele esboçou um sorriso amigável e sarcástico, completando - Mas eu sou Ariel Dimagno: Arcanista, Artífice e Alquimista Extraordinário, e agora, suponho, aventureiro, ao seu mais humilde dispor.

Ariel interrompe momentaneamente a arrumação para fazer uma curta mesura, e retorna ao trabalho.

-Mas, já que eu tenho que guardar essas coisas, aproveitem o tempo e me digam, a quanto tempo de viagem está a tribo, e quantos orcs vocês esperam encontrar lá?

- Seja bem-vindo, Ariel. - Johan retribui a mesura do mago, mas fica em silêncio após sua pergunta, deixando que Arianna o respondesse.

Aeltlas nada fala, fica imovel esperando Arianna responder.

O jovem mago empurra o carrinho até um prédio próximo, semelhante a um galpão, fecha a porta e a tranca. Retornando, ele a põe no bolso. Ouvindo a pergunta de Arianna, ele checa os bolsos e sacolas de novo. Não havia esquecido nada, levava consigo tudo que achava que seria útil de sua loja. Tinha agora uma bolsa atravessada no corpo, e o pesado livro de couro com detalhes em aço na capa amarrado a ela, e nas costas, uma mochila. Estava tudo pronto, e ele já se sentia agitado de antecipação.

-Estou com tudo que preciso, mas se querem uma sugestão, porque não dividimos os cavalos? Se montarmos cada dois de nós em um cavalo, estaremos limitados apenas pela velocidade dos animais, que com certeza é superior à nossa. Seria mais desconfortável, e com certeza não poderíamos montar o dia inteiro, mas me parece eficiente.

Johan aguardava com paciência Ariel se preparar. O cavaleiro estava ansioso em partir, mas não havia necessidade de apressar o rapaz. Após o comentário sobre como viajar, Johan é sucinto.

- Não é necessário viajarmos deste jeito. Aetlas possui sua própria montaria, eu também. Você e Arianna podem viajar na charrete.

O mago observa o paladino, curioso, tentando entender a confusão. Porque ele viajaria de charrete? Quer dizer...

-Ah! Verdade, eu me esqueci por um momento que nenhum de vocês é usuário de magia arcana. Desculpem, eu me distraio as vezes. Eu tenho uma montaria também, mas estou limitado a algo em torno de dez horas com ela por dia, então vou esperar que comecemos a andar para convocá-la. Suponho então que Arianna possa alugar um cavalo, assim todos iremos rápido.

- Vamos para partir, então.

O tom na voz de Johan era quase solene, e seus olhos ganharam um brilho levemente avermelhado com a idéia de partirem à caça dos orcs. Enquanto caminhavam até o portão onde estava a charrete de Arianna, o cavaleiro faz uma pergunta a mago.

- Ariel, você sabe algo sobre o líder desta tribo que não seja sobre o item que ele carrega?