Nerók pegou a mochila, virou ela de ponta cabeça e logo acendeu uma tocha, iluminando uma área pequena da caverna. A primeira coisa que Johan reparou foi em como a caravana havia sido reduzida. Mais da metade morreram ou ficaram do lado de fora, e eles agora não passavam de uma dúzia de soldados, entre eles o capitão da vigília e a própria senhora Arletha. Enquanto o cavaleiro despachava seu escudeiro goblinoide para averiguar o terreno à frente, ele próprio curava as feridas de Ivor com a graça de Tyr.
Ninguém optou por sair de onde estava até Nerók retornar, pois aquela caverna escura não era uma boa sugestão para seguir às cegas. Por fim, após duas horas de espera o goblin voltou alegre trazendo a notícia de que encontrara uma saída nuns túneis mais abaixo. Os doze sobreviventes então puderam voltar a se colocar a caminho, lamentando a morte do restante dos soldados e agora sem nenhuma carroça para transportá-los. A situação deles só melhorou quando alcançaram uma pequena colônia de armadilheiros e caçadores no fim da Passagem da Lua, e os Jalantharanos (que era como esse povo se chamava) emprestaram seis cavalos fortes e de boa saúde para o grupo seguir viagem até Lua Argêntea, além de ter-lhes desejado sorte.
A Grã-Senhora ouve as palavras de Frafur, e abana a cabeça, concordando.
- Você analisou bem a situação, Frafur, como é de seu feitio. Mas infelizmente temo que os dragões sejam um problema muito mais difícil de lidar do que os duergars. Teremos que criar algumas estratégias com Mão de Garra para que sua tribo de Corvos Negros fique a postos caso precisemos dela para uma emergência.
A seguir os membros do grupo foram dispensados, ficando na sala apenas os governantes das cidades signatárias, além do elfo e de Mão de Garra. Mais reuniões como aquela aconteceriam nos dias seguintes.
Dia 28 de Nightal de 1372 CV
O guarda do portão havia parado para analisar o estado de Baraz. O aspecto dele era deplorável, o que sugeria duas coisas: este anão precisava imediatamente de comida; e este anão poderia fazer qualquer coisa para obtê-la. O guarda engoliu em seco, olhou para o seu amigo e mandou-o que ele abrisse os portões. Uma vez lá dentro, Baraz viu o mitral em sua forma mais pura percorrendo as paredes dos túneis que davam acesso à cidade principal. Aqueles eram os famosos rios de prata, o maior orgulho dos anões do Salão de Mitral. A Cidadela Adbar não possuía nem metade do potencial dessa riqueza espantosa, mas em contrapartida era muito melhor preparada militarmente.
Baraz por fim alcançou a cidade que ressoava com o trabalho nas forjas e com os carrinhos de mitral passando para cima e para baixo. O guarda anão que o acompanhava lhe deu algo para comer, e só após muito insistir é que Baraz conseguiu fazer o anão pedir uma conferência com a Grã-Senhora Alustriel, e ela aceitou, já que conhecia Baraz desde os tempos da Comitiva das Fronteiras.
- É bom reencontrá-lo, Baraz – cumprimentou sorridente, embora seu olhar mostrasse compaixão pelo estado do anão. A seguir Baraz contou para ela sobre a retirada de Harbromm da guerra, informação esta que o arauto já havia comunicado ao conselho. – Mesmo assim agradeço você ter vindo até aqui, deve ter sido uma jornada longa. Pedirei para que um dos guardas o leve até um quarto em que você possa descansar.
Baraz só não esperava que o dito quarto fosse onde estava seus antigos companheiros de comitiva.
As reuniões do conselho que antecederam aquele dia foram pouco aproveitáveis. Os batedores enviados para ir à caça dos duergars ainda não tinham retornado, e a Grã-Senhora Alustriel começava a ficar ansiosa. Enquanto as coisas não se resolviam no conselho da Confederação das Fronteiras Prateadas, o conselho da tribo dos Leões Negros havia se reunido para decidir quem seria o próximo líder da tribo, já que Andar Cerne de Madeira morrera na batalha no lado de fora da montanha contra o exército de Obould.
Drago e Sophia foram chamados para a reunião, que resultara na nomeação de Patrevani como o novo líder. A briga entre ele e Hask Machado Sangrento foi parelha, mas por fim o sacerdote venceu a disputa pela preferência da tribo. Patrevani era um sacerdote que apoiava os antigos costumes bárbaros, e com isso ele tinha muitos adeptos e admiradores. O problema aos olhos dos mais sensatos, é que esta nova liderança ia de encontro contrário ao que Cerne de Madeira pregava, o que poderia causar um grande retrocesso à maneira pacifica com a qual eles estavam convivendo. O primeiro discurso de Patrevani perante sua tribo foi firme, mas sem excessos. Ele iria permanecer no Salão de Mitral e continuar a lutar na guerra contra Muitas-Flechas. No fim do discurso, Drago e Sophia viram Skelli Pé Selvagem, a batedora da tribo, amarrar a cara e dizer em voz baixa sem tirar os olhos do sacerdote.
- Torcerei para que um orc enfie uma lança em sua testa e perfure o seu cérebro de ponta a ponta.
Enquanto não obtinha a resposta, Ariel seguia cuidando de sua loja sem se importar muito com a guerra que acontecia contra Obould nas cercanias do Salão de Mitral. Ele estava feliz em seu novo local de trabalho, e para ele era isso que importava no momento.
O grupo foi recebido pelos Cavaleiros em Prata, que os guiaram para o Alto Palácio da cidade, uma magnífica edificação de doze andares acima do solo – e mais doze abaixo dele. Ele era todo construído por blocos de pedra de mármore branco, com torres cujos merlões de suas ameias eram entalhados em forma de imagens de unicórnios. Por dentro ele era tão bonito quanto por fora, com tetos elevados, pisos brilhantes de mármore, tapeçarias e paredes em relevo com figuras de flores, trepadeiras e samambaias. A senhora Arletha e os outros foram encaminhados até o Salão de Audiências, onde foram recebidos pelo Alto Mago Taern, o atual governante da cidade. Enquanto a senhora de Neve Morta contava todos os infortúnios pelos quais eles passaram, o Alto Mago apenas concordava com a cabeça sem dizer nada, e por vezes coçava a sua velha barba branca. Só ao término do relato dela é que Taern disse:
- A situação no Salão de Mitral está pior do que podia se esperar, e eles vão precisar da ajuda de vocês o quanto antes, mesmo que sejam em tão pouco número. Será impossível chegar até lá viajando por terra, com a cidadela cercada como está, portanto providenciarei um meio mais rápido e prático. Antes disso, quero apresentá-los a uma pessoa que irá com vocês – virando-se para um dos criados, ordenou: - Mande chamar a senhorita Isabela Scaletta.
- Senhores – disse Taern -, essa é a senhorita Scaletta. Faz tempo que ela me pede para levá-la até a guerra, e acho que o momento certo é agora.