Ghak não se sentia bem vinda em Harsga, não tinha como ser - todos os olhares lhe eram estranhos, as vozes abafadas soltavam insultos e reclamavam do que a cidade tinha se tornado, agora, abrigando seres de quaisquer espécies; "essa cidade tá muito diferente, esse caverna trás todo tipo de traste", era um exemplo do que podia ouvir entre dentes cerrados. É claro, a grande maioria era covarde demais para dizer qualquer coisa olhando em seus olhos e nenhuma ameaça de fato havia sido feita, mas o ambiente era bem diferente da capital, Monte Ferro, onde apesar do clima hostil de qualquer local com maior densidade, sua raça era normalizada e aceita, se alguém a odiasse em Monte Ferro era por odiar qualquer outra coisa também, não por conta de ela sua descendência orc.
Os rumores eram mais fortes ali em Harsga, a cidade mais próxima antes do caminho da montanha até as Cavernas de Esmeralda. Parecia haver uma espécia de culto estranho ao artefato - vendiam quinquilharias, estabelecimentos levavam o mesmo nome, como a Bainha de Esmeralda, uma taverna com uma pintura verde forte em todo o seu interior que fazia a bebida parecer ainda pior e ocasionar as piores crises de dor de cabeça da região, ambulantes passavam ou mesmo se aglomeravam perto de multidões vendendo mapas para o local, geralmente mal feitos ou com caminhos que já eram de conhecimento.
Cada um fazia o que podia ali para ganhar algum troco com a fama da espada, era uma cidade turística, de fato - alguns vinham apenas para visitar, mas não se atreviam a chegar perto das cavernas, um caminho tortuoso e difícil, cheio de criaturas perigosas e havia, também, o fato de que ninguém tinha voltado ainda - todas as expedições terminaram em presumidas mortes, o que aumentava a mística em torno do que significava tudo aquilo e claro, o comércio com as quinquilharias da espada crescia com base nessas histórias.
Ghak podia ver que alguns ali estavam dispostos a enfrentar as cavernas, haviam grupos bem armados e preparados para a saída, uma jornada de teste físico e mental. Num plano geral, eram muitas informações disponíveis e tudo ao mesmo tempo. Harsga, era uma cidade pequena, mas tanta coisa acontecia que parecia a própria capital de Bosia. Enquanto observava tudo, ouviu algo sussurrar em seu ouvido. Não parecia vir de ninguém próximo, mas as palavras foram claras.
THERSOS
- Kalivar!
A pequena casamata que abrigava os guardas da cidade era bem simplória, um estabelecimento de dois cômodos - um espaço para atendimento público da população e um quarto maior, onde os guardas podiam descansar e guardar suas coisas. Apesar de Harsga estar sempre cheia de viajantes e turistas, os guardas não tinham muito trabalho - todos que foram convidados para qualquer coisa mais oficial, ou para integrar o exército, foram mandados para Monte Ferro, sendo assim, restou à Thersos continuar ali, servindo como poderia e usando seu porte para ser o seu ganha pão. Ouviu o chamado do capitão - Korve - era já um homem velho, evitava problemas e não gostava muito de se envolver em qualquer tipo de conflito, o que era bom para a guarda, mas ao mesmo tempo - não havia nenhum tipo de desenvolvimento das habilidades de Thersos. Como eram raras as convocações, isso poderia ser algo bom, finalmente.
Ele estava aguardando atrás de uma pequena mesa, outros companheiros estavam próximos.
- Preciso que acompanhe um grupo até o início da estrada para a montanha. Cuide deles pela estrada, mas não mais do que isso. A estrada faz parte da cidade e é nossa responsabilidade, passou daí - é problema deles e eles foram avisados que não seria boa idéia.
A estrada não era muito conhecida por conta de seus problemas e ataques, então era outra atividade de patrulha comum - ficava apenas a dúvida de qual seria a necessidade disso, considerando o que se sabia. Mas era um pouco melhor do que ficar ali sentado esperando qualquer coisa acontecer. Assim que Korve terminou de falar, Thersos ouviu um sussurro atrás de sua cabeça, uma voz arrastada e não conhecida, ao passo que terminou sentiu uma mão em seu ombro, era ao mesmo tempo, um acalento e um calafrio - mas não adiantaria se virar para entender o que tinha acontecido, não teria ninguém ali.
BARASTYR
Havia conseguido um trabalho que poderia lhe dar um caminho à espada. Foi contratado por um lorde excêntrico que desejava a espada acima de qualquer coisa, o próprio lorde tinha uma coleção de armas exóticas vindas dos cantos mais obscuros de Bosia e a lenda da espada esmeralda despertou sua vontade de uma forma curiosa, organizou uma expedição com mercenários de todo o tipo, um custo caro, mas com indivíduos que possuiam habilidades exemplares. Era possível crer que seria uma realidade alcançar a espada esmeralda com um grupo desses. Apesar de ninguém, em toda a história da lenda da espada, ter retornado das cavernas - alguns corpos são encontrados na estrada, às vezes.
Seu contratador, lorde Kvass de Madeirazul, exigiu que pudesse estar no mesmo grupo. Não queria que a espada fosse trazida até ele, mas sim - que ele próprio fosse o homem a retirar a arma de onde quer que estivesse. Obviamente, contando com a força de seus mercenários contratados.
Barastyr devia encontrar o grupo em Harsga, quatro mercenários, mais ele próprio e lorde Kvass. Ele já conhecia Harsga, a espada já era parte de seu plano - mas talvez, se conseguisse ajudar esse lorde, sua recompensa seria o suficiente para erguer de volta o nome de sua família ao patamar de outrora sem precisar da espada em si. Como os trabalhos estavam escassos nos últimos tempos, foi necessário aceitar e seguir com a ajuda ao lorde. Havia sido informado por um criado do lorde de que deveria estar presente próximo do meio dia, na saída da cidade - na estrada que levava à montanha esmeralda. Toda a cidade vivia para a espada e sobrevivia também da espada. Não era difícil de perceber que tudo ali era alguma forma de ganhar dinheiro com a fama do local e do próprio artefato, a cada esquinha tinha um vendedor tentando repassar as quinquilharias mais toscas possíveis aos que visitavam o lugar.
Não teve tempo de organizar seus pensamentos, antes do primeiro passo em direção a estrada, uma voz tomou sua mente, ríspida e direta.
ZALOY
Não haviam muitos grupos promissores que saiam em busca da espada, a maioria eram aventureiros sem muita experiência e justamente por esse motivo - nenhum deles retornava da viagem que era feita até às cavernas na montanha esmeralda. Dessa forma, não era fácil para Zaloy encontrar um grupo que fosse de fato uma chance para alcançar a espada. Recenetemente recebeu a notícia de um lorde vindo da capital de Bosia, ele próprio iria liderar a caravana para as cavernas e trazia junto consigo alguns mercenários que iriam ajudar no trajeto, talvez fosse a oportunidade que precisava para finalmente adentrar um grupo desses. Fica apenas a questão de como deveria proceder, pois certamente o lorde em questão tinha interesse em manter para si próprio a espada e era certo de que o dinheiro investido não passaria por cima de nenhum tipo de convencimento que Zaloy pudesse propor. De qualquer forma, seria um primeiro passo encontrar o grupo e o lorde.
O que sabia até o momento, tratava-se do Lorde Kvass de Madeirazul e um dos mercenários contratados fazia parte de uma família quase tão antiga quanto a de Zaloy, Barastyr de Cedrac compunha a comitiva do lorde.
Notavalmente, os últimos dias estavam bastante movimentados em Hasrga. O pensamento pairou na cabeça de Zaloy por alguns instantes e tão logo, sozinho, como se um vento limpasse sua cabeça tudo ficou claro em sua mente e ele ouviu, como se fossem sussurros, uma voz arrastada e velha. Tentadora, tinha um poder de acalentar ao mesmo tempo lhe causar calafrios. Foi apenas uma frase, veio e foi embora, deixando nada mais em sua mente.
WILLIAM
Ikarus latia sem parar na entrada do teatro, os portões estavam fechados, mas ao conferir o motivo da exaltação do cão - era possível perceber que havia uma movimentação incomum na cidade de Harsga. Os turistas eram comuns, mas parecia que tinham aumentado nos últimos tempos - não só os cidadãos comuns, mas também se via alguns homens armados indo na direção da estrada que dava início à montanha de esmeralda. Provavelmente uma nova expedição, como tantas outras que aconteceram durante o ano. O clima não era dos melhores - já estava começando a esfriar e a expedição teria pouco tempo para chegar e voltar, se é que voltaria - nenhuma tinha voltado durante todos esses anos, alguns corpos, sim, apareciam de tempos em tempos pela estrada, arrastados por animais selvagens.
Quando William se aproximou do portão de seu teatro, o cão se acalmou e retornou para junto de seu mestre. Pôde ver melhor - eram homens com melhor equipamento do que os anteriores, não pareciam ser simplesmente aventureiros arriscando a vida por qualquer coisa, mas homens e mulheres treinados.
Talvez fosse interessante tentar unir-se a um grupo desses, com certeza o caminho seria um pouco mais seguro e as histórias viriam com certeza. De certo, havia alguém pagando por isso tudo e que tinha um real interesse na espada, mas nunca se sabe - pode ser que esse bancador seja um patrono das artes e resolva ouvir a causa de William. Ikarus olhou para cima e ganiu, como se estivesse com dor, daí correu de onde estava entrando no teatro rapidamente, fugindo.
Ao mesmo tempo e sem a oportunidade de ver o que estava acontecendo com seu mascote, William ouviu algo no fundo de sua cabeça. Uma voz estridente.
AHRENS
O jovem acordou de repente. Dormiu demais e o sol do meio já esquentava as frestas da janela, teve um sonho estranho e confuso - um sonho de sangue e morte. Tudo estava muito misturado e era difícil de entender com o que realmente tinha sonhado, só sabia que era ruim, muito ruim - mas ao mesmo tempo, podia controlar toda aquela maldade, de uma forma que era direcionada em seus propósitos, como se pudesse usar o que era ruim no mundo para fazer o bem. Estava bastante suado e levemente febril.
Havia muito barulho do lado de fora, o barulho e a confusão eram comuns em Harsga, mas hoje parecia estar em um nível maior. Os sons já conhecidos misturavam à montarias trotando e pisando no barro, armaduras de batalhas tilintando ferro com ferro e vozes, mais vozes do que o normal. Só poderia ser uma coisa - uma nova expedição estava se formando. Seria sua chance para seguir seu destino, buscar a espada e verificar se realmente os rumores eram verdadeiros, se o artefato realmente poderia curar qualquer tipo de doença.
Antes que pudesse fazer qualquer coisa ou mesmo pensar em sair da cama. Recebeu uma lufada de vento, foi refrescante e ao mesmo tempo, algo percorreu sua espinha. Um som crepitou no fundo de sua cabeça e o som formou palavras, tinha uam familiaridade incrível com o sonho que tinha acabado de ter e as palavras foram claras, rápidas e davam uma ordem.
- OFF:
- Vou enviar no privado para cada um o que ouviram.