24 de Janeiro de 2012 - 00:39 p.m. - Toronto General Hospital - Old Town District - Toronto
Protegida pelos vidros grossos da sala do necrotério do Hospital Geral de Toronto, era possível que Leah observasse a neve clara caindo e cobrindo os veículos e ruas. Em intervalos de horas, era possível ver também os limpa-neves fazendo seu trabalho e mantendo o acesso ao principal hospital da cidade livre para toda e qualquer emergência.
Aquela visão fazia você lembrar de sua terra natal, quando brincava com seus irmãos na neve fofa que caía no Fountain Park, enquanto seus pais bebiam café forte com whisky para afastar o frio que se alastrava, vocês quatro corriam livres e sem medo do frio, seus corpos infantis geravam a energia e calor necessário para que apenas a adrenalina das brincadeiras fosse sentida pelos seus cérebros em desenvolvimento e adaptação. Se lembrava do dia em que Lena havia caído de cima da árvore e quebrado um dos dedos, ou o primeiro beijo de Vincent sob a neve com uma garota da escola ou do dia congelante em que Zachary havia saído de casa em direção ao exército, fato aquele que mudaria a vida dele e também a sua.
Haviam tantas lembranças de uma época que não voltaria mais, mas que nunca seriam apagadas da sua memória, porque ela existiria para sempre. Assim era a vida cainita, sentir a humanidade dentro de si nos menores e mais singelos sinais da forma pura da existência.
Você fechava os olhos, tateando o vidro gelado da janela, as luzes noturnas distorcidas em meio aos flocos de neve que caíam. Quando de súbito seus pensamentos eram levados para longe, com o barulho de uma das portas duplas do necrotério se abrindo e o som familiar das rodinhas de uma maca.
Era Timothy, o auxiliar que haviam designado a você, ele tratava de buscar os cadáveres que morriam nos andares de cima e tentava algumas vezes aprender uma coisa ou outra com Leah. Embora os estudos de Leah levassem a outros objetivos, a patologia ainda era mantida no hospital, afinal o vitae não estava presente nos cadáveres, ele era transformado no interior de todo cainita após beber o sangue de suas vítimas.
O lugar era muito grande, talvez o maior necrotério que você tenha tido a oportunidade de estar. Pelos seus cálculos, cerca de oitenta cadáveres poderiam ser armazenados lá sem problemas e em superlotações, acreditava que uma média de 150 ainda poderia permanecer lá.
O turno da noite era vazio, você era a única profissional no local e agia sem supervisão, durante o dia era muito movimentado, ainda mais pelos internos da University Health Network, maior faculdade de medicina da cidade.
Sua única companhia eram aqueles cadáveres e o jovem Timothy.
Ele parava a maca no lugar de sempre, olhava pouco para você, afinal não representava nada atrativo aos olhos dele em se tratando de beleza feminina e aguardava as instruções ansioso, pois muitas vezes precisava virar ou segurar os cadáveres e isso lhe garantia alguns tímidos sorrisos e pensava que "participar" o agradava.
- Dra. Leah, boa noite. Este é Omar Haufner, motorista de caminhão, foi encontrado na beira de uma estrada. Apresenta diversas escoriações, trauma toráxico de grande proporção e um quadro hemorrágico grave.
Disse o jovem lendo o prontuário que estava pendurado na maca.
- Timothy: