Fragmentos Digitais
"Todos nós estamos na sarjeta, mas alguns de nós estão olhando para as estrelas."
Oscar Wilde
Oscar Wilde
O apartamento que Luíza divide com Nina estava particularmente silencioso naquela noite. A luz fraca do abajur e o brilho azul do monitor iluminavam as sombras na parede, enquanto Luíza, conhecida pelos Garou como "Arte Fragmentada", se perdia entre suas criações digitais. Seus dedos ágeis deslizavam pelo tablet de desenho, transformando as visões caóticas que frequentemente invadiam sua mente em formas e cores vibrantes.
Na tela, uma espiral de luz se misturava a símbolos arcanos. Era mais uma dessas noites em que o véu entre o mundo físico e o espiritual parecia mais fino. Um sussurro distante atravessava o silêncio, algo que só ela parecia ouvir. Sua conexão com os espíritos da Weaver era inegável, e o headset de realidade virtual ao seu lado pulsava com uma energia estranha, como se estivesse chamando por ela.
Luíza hesitou, a mão pairando sobre o fone. Ela sabia que colocar o headset a levaria para outro nível de percepção, uma realidade que muitos Garou não ousariam explorar. Mas algo estava errado. As visões estavam se tornando mais frequentes, mais intensas. E agora, havia uma urgência nelas, como se os espíritos estivessem tentando avisá-la de algo importante.
Com um suspiro, ela colocou o headset, ajustando-o na cabeça. A interface piscou e, em um instante, o mundo ao seu redor mudou. Estava no meio de uma vasta rede de fios e circuitos digitais, um lugar entre o físico e o espiritual. Espíritos da Weaver dançavam à distância, suas formas etéreas se movendo em padrões geométricos perfeitos.
Então, algo novo apareceu. Uma mancha escura que se espalhava pela rede, devorando dados, corrompendo o fluxo de informações. Luíza tentou alcançar o espírito mais próximo, sua voz carregada de perguntas, mas tudo ao redor começou a tremeluzir e falhar, como se a própria realidade estivesse se despedaçando. Algo — ou alguém — estava invadindo aquele espaço, e não era um Garou.
De repente, uma mensagem piscou em sua visão digital:
Cuidado com a Wyrm nas linhas da Weaver. Encontrar-te-ei no 'Espaço Fragmentado'.
A assinatura no final da mensagem era inconfundível. PhantomByte. Lucas, seu contato hacker, estava tentando se comunicar com ela diretamente no mundo espiritual. Aquilo nunca tinha acontecido antes. Ele sempre fora um gênio com tecnologia, mas entrar nesse espaço espiritual era perigoso, especialmente se a Wyrm estava envolvida.
Luíza tirou o headset com pressa, o coração batendo rápido. Precisava agir rápido. Pegou o celular, ainda ofegante, e enviou uma mensagem para Lucas:
O que você viu? Está aqui dentro?
A resposta veio quase imediata:
Algo está corrompendo os sistemas da Weaver. Encontrei sinais estranhos nos meus códigos. Não sei o que é, mas está se espalhando. Precisamos falar.
Luíza sabia que isso não era coincidência. O espírito da Weaver que tentou alertá-la, a mensagem de Lucas, a mancha negra devorando as linhas espirituais... Tudo estava conectado.
Ela olhou pela janela do apartamento, as luzes de São Paulo piscando na escuridão. Seu papel como Theurge dos Andarilhos do Asfalto não era apenas navegar entre os mundos, mas também entender como o espiritual e o tecnológico se entrelaçavam. E agora, o equilíbrio estava ameaçado.
A porta do quarto de Nina se abriu, e a colega apareceu com um sorriso sonolento.
- Tudo bem por aqui?