O Flint, ao ouvir as palavras de Jone, permaneceu imóvel, seus olhos estreitando-se como fendas de aço. O cavaleiro Felinight não havia se curvado, nem recuado diante das provocações, e isso, de certa forma, pareceu despertar algo no líder do clã: uma mistura de respeito relutante e desprezo endurecido pelo tempo.
Por um instante, o silêncio se instalou, pesado como o frio das montanhas. Thergon, o Urso, ao lado de Jone, manteve-se quieto, mas seus olhos se moviam entre os dois homens, sabendo que a tensão na sala poderia se transformar em algo mais violento a qualquer momento. O Flint finalmente descruzou os braços, os músculos ainda rígidos pela raiva contida.
— Conquistaram, sim — admitiu o Flint, com uma voz grave e seca
— Mas não sem a bênção dos Stark. E não sem as intrigas e os favores dos que se consideram mais civilizados. Aqui nas montanhas, não jogamos esses jogos. Não esquecemos.Ele olhou para Jone, avaliando o cavaleiro de novo, como se tentasse decidir se suas palavras sobre honra e conquista valiam algo naquele cenário.
— Capricho? Rancor? Talvez — disse o Flint, sem hesitação, como se a acusação de Jone não o perturbasse
— Mas você foi jogado em nossas montanhas, e agora será nossa decisão o que faremos com você — Um leve sorriso curvou os lábios do líder do clã, um sorriso que não trazia nenhum calor
— Entretanto, suas palavras merecem ser ouvidas por mais pessoas do que apenas eu.Ele fez um gesto brusco com a mão e alguns dos homens presentes saíram da sala, presumivelmente para convocar mensageiros. A notícia da chegada de um cavaleiro Felinight nas terras dos Flint era algo que o líder pretendia usar, e Jone percebeu que seu destino não seria decidido tão rapidamente quanto esperava.
— Você ficará aqui. Os chefes dos outros clãs das montanhas serão convocados. Wulls, Norreys, Burleys, Liddle, Knotts, Harclays. Todos têm algo a dizer sobre as terras que um dia compartilhamos. Todos têm uma opinião sobre os Felinight.Ele se levantou de sua cadeira de pedra, sua presença ainda imponente.
— E todos gostarão de ouvir o que você tem a dizer sobre conquistas e disputas.Com isso, o Flint deixou a sala, e Jone foi escoltado para fora, conduzido até uma cabana simples onde passaria a noite sob vigilância. Thergon, o Urso, acompanhou-o em silêncio, sabendo que os próximos dias seriam decisivos.
Os dias que se seguiram foram longos e tensos. Os chefes dos clãs das montanhas começaram a chegar à aldeia dos Flint, cada um trazendo suas próprias preocupações e ressentimentos. As reuniões ocorreram no grande salão de pedra, e cada clã tinha algo a dizer sobre a Casa Felinight e sua presença no Norte.
Os Wulls, poderosos e orgulhosos, argumentavam que os Felinight haviam ultrapassado seus limites, crescendo demais e se expandindo além do que era aceitável.
Os Liddle e
os Knotts, mais isolados, estavam menos inclinados a provocar conflitos, mas ainda ressentiam-se da invasão de suas tradições.
Os Norreys e
os Burleys eram menos fervorosos, mas não viam com bons olhos a influência que os Felinight, com seu crescente poder e proximidade aos Stark, estavam exercendo sobre as terras ao redor de Breakstone Hill.
Entretanto, foi
Thergon Harclay, o Urso, quem trouxe a voz mais razoável ao debate. Conhecendo Jone e tendo viajado com ele, argumentou que o cavaleiro não representava uma ameaça direta e que os Felinight, embora tivessem suas ambições, não eram os responsáveis pelos problemas dos clãs das montanhas. Thergon sabia que a questão era mais complexa, mas ao menos tentava evitar o derramamento de sangue.
Os debates eram acalorados e intermináveis, muitas vezes quase descambando para insultos e ameaças, mas sempre retornando ao mesmo ponto: o ressentimento profundo contra os Felinight e sua ascensão. Após dias de discussões e desentendimentos, ficou claro que nenhum consenso seria alcançado.
O Flint, percebendo a falta de acordo entre os clãs, finalmente tomou sua decisão.
Na última reunião, quando o salão estava tomado pela exaustão dos debates infrutíferos, o Flint se levantou, sua figura imponente dominando a sala.
— Não chegamos a acordo algum — disse ele, com voz grave, e os outros chefes murmuraram em concordância
— Mas não sou tolo. Mandaremos este cavaleiro de volta para os Felinight, para o Castelo dos Sussurros. Não será hoje que derramaremos sangue, mas deixaremos claro que essa questão não está resolvida.Ele se virou para Jone, que havia permanecido firme durante todo o processo.
— Você voltará ao seu castelo, cavaleiro. Mas diga a seu senhor que as montanhas não esquecem. Quando Beron Felinight voltar ao Norte, ele terá de lidar conosco. E não haverá lugar seguro para ele ou para os seus se continuarem a desafiar os clãs.Com isso, o Flint deu o veredito final. Jone seria libertado, e sua jornada de volta ao Castelo dos Sussurros seria permitida. Mas o ressentimento dos clãs das montanhas havia sido despertado de novo, e o futuro prometia novas tensões e possíveis confrontos.
Jone não poderia se iludir; embora estivesse livre, sabia que a paz entre os clãs e os Felinight era frágil, e o retorno de Beron traria novos desafios.
Indicaram-lhe o caminho para descer as montanhas e cederam-lhe uma mula já bem velhinha mas bem acostumada com os caminhos montanhosos.
E assim Jone desceu finalmente das montanhas de volta para o Castelo dos Sussurros, semanas depois de sua expedição pelas cavernas das minas caçando os salteadores.