Jone engoliu em seco quando o líder do grupo disse que o levariam para sua aldeia, mas não fez qualquer objeção. Ainda não estava claro o que seria dele, embora não houvesse qualquer sinal de hostilidade partindo do grande homem à sua frente. Surpreendeu-se, inclusive, quando os homens o cercaram, em um sinal feito pelo líder deles, para escoltá-lo.
“Não faça nenhuma merda, Jone…” - pensou o Felinight
A jornada era extenuante, não tanto pela distância em si, mas Jone já estava em seu limite. Frio e fome o agoniavam desde que saíra das Minas. Em algumas horas fecharia um dia desde que partiu do Castelo dos Sussurros, cedo pela manhã. Repensou, durante a marcha, como as coisas desandaram a partir do momento em que entraram nas Minas, quase como se aquela fosse uma sina de mal-agouro. Perguntou-se se Finn teria organizado os homens e ido à sua procura, mas em seguida, também questionou se o próprio homem teria sobrevivido ao desmoronamento. Beron certamente ficaria irritado se soubesse que um de seus mais antigos aliados fosse encontrado morto.
- …Imerso em seus pensamentos, ao longe pôde ver a aldeia citada pelo homem, onde luzes e fumaça ao menos davam a certeza de que aquela caminhada estava, finalmente, chegando ao fim.
***
Ao adentrarem no Grande Salão do Clã Harclay, Jone percebeu o respeito que o líder carregava consigo, digno de grandes senhores de grandes casas. Havia uma organização ali, um esmero pelo que tinham, ao qual o Cavaleiro notava pela forma que tudo ali parecia ser extremamente pensado e colocado em cada lugar com um propósito específico. A grande lareira, por exemplo, não estava em um canto exclusivo do Salão, mas sim ao Centro do mesmo, de forma que seu calor atingia tudo e todos de forma igualitária, sem necessariamente servir mais para uns do que para outros.
Alexyus escreveu:- Tragam-no aqui, perto do fogo, - ordenou Clay, sua voz firme ecoando pelas paredes do salão.
- Ele precisa se aquecer e recuperar as forças.
Os guerreiros não titubearam diante da ordem, seguiram conduzindo Jone até que ficasse próximo o bastante da lareira, onde podia escutar o crepitar das brasas e seus olhos chegavam a ficar sensíveis diante de tamanha claridade. Assim que sentou-se, notou que a cadeira tinha uma pelagem servindo como estofo, dando a ela mais conforto. Quando pensou em agradecer, uma tigela quente foi oferecida a ele, juntamente com um generoso pedaço de pão. Sem jeito, assentiu com a cabeça e pegou o alimento oferecido, podendo enfim agradecer, com uma voz baixa e trêmula.
- Obrigado…A fala do líder complementou apenas as certezas que Jone tinha: exaustão e fome. O Cavaleiro, por sua vez, não fez cerimônias e começou a comer. Não deixou de notar, é claro, que muitos dos aldeões o observavam, com curiosidade, e embora não tentasse transparecer, Jone também tinha curiosidade em relação a eles. Sabia, é claro, da existência dos Clãs das Montanhas, mas nunca imaginou que tivessem tamanha estrutura, não só hierárquica, mas também física, a partir do que viu das casas e, principalmente, do Salão.
Antes que o líder se fosse, Jone fez uma pausa em seu jantar para, de boca cheia, questionar o líder:
- Não sei seu nome…Caso respondesse, Jone levantaria-se e estenderia a mão à Clay.
- Jone Felinight. Obrigado.Jone havia se identificado, inicialmente, apenas como um Cavaleiro da Casa Felinight. Não sabia se o conheciam de rosto e já sabiam quem ele era, e por isso a ajuda, ou se foram apenas generosos em ajudar um Cavaleiro perdido em meio ao caos de seu ataque. Esperava que, ao ter se identificado de fato, não gerasse quaisquer problemas.
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A sensação, no momento, era de mais tranquilidade e menos tensão, já que o receio de ser morto parecia ter se esvaído com a demonstração de hospitalidade. É claro que isso não era garantia alguma de que não tramariam nada por suas costas, mas se aquilo tudo fosse um grande teatro para cortarem-lhe a garganta mais tarde, ao menos morreria quente e de estômago cheio.
“Talvez tenha sido uma ajuda genuína”, pensou consigo. De toda forma, assim que terminou de comer, permaneceu na cadeira sentado, um tanto inquieto, atento aos olhares que caiam sobre si, e da mesma forma buscava observar aqueles que estavam, discretamente, à sua volta. Aos poucos, as pessoas iam se dispersando e, quando pôde ficar sozinho, a calmaria veio de vez, dando lugar ao sono, e tão logo pudesse se dar conta, Jone finalmente descansou, fechando os olhos e dormindo um sono tão pesado quanto tinha em sua confortável cama, com sua confortável lareira e suas confortáveis mulheres.