3. A new begining - Os sobreviventes

Fury já estava com os ouvidos cansados de tanto ouvir. Mas, mais do que isso, queixava-se do que aconteceria dali em diante. Raymond abrira os portões para Quassia e seu bando, como se os estoques e dispensas já não fossem insuficientes até mesmo para os poucos residentes anteriores. Agora, com tanta gente e a eminente vinda dos Guardiões, era questão de tempo até tudo virar um inferno. — O velho Raymond tá ficando caduco. Doc pensa mais com a cabeça de baixo do que com a de cima. Os irmãos são três idiotas. O Alma... — Fury olhou para os lados, percebendo a ausência de Will. Continuou procurando por alguns segundos, como se a mínima menção ao sujeito fosse suficiente para materializa-lo, saindo das sombras, como sempre parecia fazer. Já aborrecido com isso tudo, decidiu por ir a torre de vigia. Fury passava a maior parte do tempo lá, longe de todos ao mesmo tempo próximo de tudo. Mas, antes que pudesse se retirar, Raymond se aproximou pedindo por sua ajuda. — Vamos selar esse portão até parecer uma muralha. Me ajude com isso. — Fury concordou com um aceno, enquanto o velho dirigia outras ordens para Quassia e Doc. — Vocês! Achem a Alma Penada e vejam se vale a pena tentar chegar ao Setor Sul. Gen, Den e Ken vão recepcionar as comitiva de Quassia e alocá-las nos espaços que temos. — Havia uma porta no Setor Sul que Raymond e o grupo falhara diversas vezes em abrir, sempre curiosos sobre o quê estaria do outro lado. E havia outras partes inexploradas do Lixão que só eram acessadas por uma senha. Se Quassia as tivesse, bem, ao menos sua visita não teria sido completamente inútil. — E então, como você pretende selar esse portão? — Fury perguntou a Raymond, enquanto via Doc flertar com uma das recém-chegadas.

- Meu caminhão chegará em 2 horas se nada der errado no caminho. Os guardiões que nos seguiam não possuem veículos portanto devem estar chegando ao refúgio em 3 ou 4 dias. Tempo mais que suficiente para que prepare o portão. - responde Quasia.

A mulher que estava na sua garupa ouve a proposta de Doc e sorri piscando para ele e responde.

- Claro que podemos, Doc.... Mas só se você deixar eu me divertir com você um pouco também... Pode me chamar de Sharon.

A resposta da mulher para Doc fez com que Quasia e suas meninas gargalhassem.

Enquanto Sharon desmonta da moto com um sorrido sarcástico, Doc a pega pela cintura:

- Ora, é claro! Que tipo de cavalheiro eu seria se quisesse me divertir sozinho, sem pensar na felicidade das damas?

Alex começava pensar com a cabeça de baixo, mas enquanto Ray reclamava:

- Tá certo Ray, precisamos fechar o portão, mas achar um lugar para esconder de máquinas e tão ou mais importante quanto. As máquinas são mais fortes e mais rápidas que nós, a única coisa que elas não têm é criatividade. Mesmo com inteligência artificial, elas seguem protocolos programados. Sendo assim, se conseguirmos que elas não vejam o calor de nossos corpos, a probabilidade de acharem que não tem ninguém aqui é grande. Já fiz algo parecido usando gelo no C.C. da WhitePaper e deu certo, as próteses cyber não conseguiam "ver" membros se não emitiam calor. Claro que com guardiões a coisa ainda é teórica, mas é uma boa teoria.

Pelo menos a cabeça de baixo do Doc era inteligente.

- Portanto caso o corno tenha deixado as chaves e/ou códigos com a Quassia, verificar o setor sul vai ser tão importante quanto proteger muros e portões. - ele vira para a bunduda - Então oh tanajura, ele deixou com vocês as chaves ou vou ter que revistá-las? Se for, espero que estejam com a Sharon.

– Mãos à obra! – Disse Raymond, enquanto caminhava de um lado para o outro, carregando peças e outros materiais necessários para fechar o portão. Doc continuava preocupado em flertar com as recém-chegadas, mas a insistência em verificar o Setor Sul tinha bons motivos, por mais que Fury achasse que o principal deles fosse apenas para ter algum momento a sós com uma das garotas. – Quassia, aproveite e chame todas as mulheres que não estiverem feridas e qualquer criança capaz de carregar essas coisas. – Ele disse, enquanto ajudava Raymond a carregar as peças. – Vamos, essa merda não vai ficar pronta sozinha.

Alma está na plenitude do seu êxtase, sua mente está aberta e uma consciência superior o dirige, ele não sabe se é ele mesmo ou alguma inteligência externa. De repente a ideia das turbas a frente lhe vêm à mente e a imagem à sua frente se estreita repentinamente assumindo uma forma tubular e ele se vê arremessado para dentro e desce pela tubulação como em um tobogã.

Logo o tubo se estreita lhe proporcionando um desconforto crescente e quando ele jura que será seu fim, tudo fica escuro e parece que se desconectou de tudo, não existe nenhuma informação sensorial e ele não sente dor, nem a si mesmo e esta sensação é estranha e nova para ele pois ao mesmo tempo ele não é nada e também é tudo e uma sensação de expansão lhe invade e toma conta do seu ser, até que seus olhos se desvelam e a sua frente está a poeira e o horizonte com as duas turbas se aproximando e uma energia imensa se agita dentro de si e sai na forma de um grito gutural e seus sentidos se expandem no mundo real.

Alma ouviu a ordem de Ray para que começassem a fazer alguma coisa, que ele ignorava completamente, mas do alto da torre ele via a nuvem de poeira se aproximar e o bando de motoqueiras próximas ao portão com uma delas caída morta um pouco mais afastada. O que ele mais estranhou foi a líder do bando e sua companheira estarem entrando no refúgio.

Parecia que Ray e os outros a conhecia. Mas daquela posição que estava não conseguia ver seu rosto para poder saber se ele também a conhecia.


Quasia e Sharon desmontavam da moto e entravam no refúgio, elas eram mulheres bem constituídas e saudáveis. Quasia pouco lembrava a mulher que saiu do refúgio tempos atrás. Ela já era muito bela, mas parecia frágil e extremamente dependente do antigo Líder. Agora ela se portava com atitude andava de cabeça levantada e de maneira orgulhosa. Mesmo mostrando as marcas do que lhe fora cobrado para ter esta posição.

Quasia trazia nas costas uma grande cicatriz que percorria-lhe toda a coluna, Fury foi o primeiro a reparar na cicatriz uma vez que ele que abriu o portão para que elas entrassem. Ela seguiu em direção a Raymond e lhe deu um sorriso ferino.

- Então Ray, nos diga o que devemos fazer. Sharon vá com o doutor e ajude-o com a porta. Temos menos de duas horas para que os outros cheguem, então acho que poderemos começar a pegar as coisas e trazer para cá.

Ela então tira a jaqueta que usava e agora todos podem ver que ela tinha vários conectores espalhados pelo corpo (como os que os humanos tinham no filme matrix). Aquilo chega a impressionar até mesmo Doc. Alexander, pois os os conectores estavam espalhados por pontos que os ancestrais do oriente chamavam de pontos de energia.

Alex e Sharon seguem para a região onde tudo estava trancada e a bela mulher tira do pescoço um colar com um pingente que era a chave que ele esperava.

- Está pronto doutor...

Alex observa aqueles conectores e pensa se ela os teria colocado por vontade própria ou não. Já tinha visto coisa parecida na WhitePaper, mas não naquela disposição, talvez seria interessante estudar depois, no momento fica calado.

Naquele mundo todo mundo já sofreu uma ou outra intervenção cirúrgica, Doc teve o privilégio de ter as suas disfarçadas por baixo da pele. Ele também fica se roendo por dentro de curiosidade sobre o que o grupo da Quasia trouxe com o selo da WhitePaper. Ele se sentia meio envergonhado consigo mesmo, mas desde que Quasia sugeriu algo com o logo da empresa que ele trabalhava que a boca de Alexandre ficou salivando de vontade de uma dose de OM3.

Claro que toda tecnologia que viesse além das drogas seria bem vinda. Falando nisto ele precisava dar uma puladinha na sua enfermaria também, seus ajudantes, se os conhecia bem, deviam estar escondidos embaixo do Analisador de Próteses de Weniburg de Sistema Isotópico Não Eletro-Negativo (ou só ANEN) o ANEN era a mais alta (no dois sentidos) tecnologia que Alexandre Capareli tinha conseguido resgatar quando foi resgatado das ruínas do "hospital" da WhitePaper para aquele lixão ali. A tecnologia Não Eletro-Negativo era a única resistente a PEM e que não influenciava outras máquinas elétricas (ou seja, não podia ser "lida" por outras máquinas também). Claro que o ANEN tinha uma reforçada blindagem anti tecnologia reversa e Doc Alex não deixava ninguém ter ideias de tentar desmontar seu celuprocessador. Mas quem sabe o bando da Quasia trouxe alguma peça NEN com eles...

Por sorte a enfermaria ficava no meio do caminho.

- Danny, Junis, cadê vocês seus inúteis? - Como desconfiado eles tinham escondido logo depois da primeira explosão - Mas como são covardes... - Como se Doc não tivesse a pouco segurando o "ás de copas" antes de saber que o grupo era de Quasia e que seu grande plano não fosse justamente achar um lugar pra esconder, mas ninguém precisava saber disto - Junis, Ray e Fury precisam de ajuda no portão, e Danny, chegou um pessoal ai, provavelmente vai dar muuito trabalho, vai vendo quem está em risco vermelho e fazendo uma pré-triagem.

- Quem é esta? - Pergunta Danny vendo o Doc acompanhando a Sharon.

"Se eu der sorte, é meu jantar" - pensa o "anjo".

- É uma das que chegaram com a Quasia. Vai ver se tem muita gente quebrada. Ou melhor, se tem gente muito quebrada.

- Que Quasia? Aquela chata magrela que deixou a gente há um ano atrás?

- É, ela não tá mais tão magrela.

"E precisa ver o tamanho da bunda dela! Se colocar um localizador em cada bolso vai acusar que eles estão em cidades diferentes."

Ele então vai com Sharon até a porta da zona sul, mesmo antes do cretino do antigo dono os abandonar ali, aquela área costumava ficar fechada. Se Ray ou Fury sabiam o que tinha ali, Doc não tinha certeza. Mas ao ver a porta enorme com reforço de chumbo ele fica animado, mesmo se fosse um único e enorme galpão vazio, nenhuma máquina seria capaz de ler traços de calor ali dentro, e se mantivessem a energia lá dentro desligada, nenhuma máquina poderia ve-los. Até onde Doc sabia, a última tecnologia de I.A. antes de tudo dar merda era baseada 80% em busca de calor e 50% em fontes de eletricidade.

- Está pronto doutor...

- Por uma gatinha como você, estarei sempre pronto. Quer fazer as honras, Minha Dama?

Fury observou Quassia retirar a jaqueta que usava, expondo para todos seu vigoroso corpo repleto de conectores, bem como suas mazelas, explícitas e marcadas na pele, com cicatrizes e estigmas que davam a volta nas costas e se perdiam por partes que o Doctor Alexandre só sonhara em ver.

Fury se questionou como uma mulher como ela poderia ter tido acesso a tal tipo de tecnologia, mas evitou tomar julgamentos prévios. — Talvez ela não tenha tido o acesso e nem o desejo de tê-la. — Histórias eram contadas e conhecidas sobre pessoas que eram submetidas a experimentos contra a própria vontade, só para terem seus corpos violados e modificados ao bel prazer de algum cientista louco. Se Quassia era uma dessas pessoas ou não, Fury só descobriria depois que ela respondesse as perguntas de Raymond, que agora tateava a mulher e seus conectores como se analisasse alguma quinquilharia que encontrara no Lixão.

Depois que Doc e Sharon saíram em direção ao Setor Sul, na tentativa de destrancar a área, Raymond passou as instruções para os presentes, indicando quais peças deveriam ser recolhidas e quais não. Fury acenou num acordo e, então, fez a melhor coisa que sabia - depois de matar - e obedeceu, caminhando pesadamente pela floresta de tralhas e entulho que era o Lixão, em busca das peças de metal apropriadas.

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Ação: