Sor Abdall Karsten era um homem feliz, casado com a mulher que amava desde jovem, lady Alles Karsten, e com quem teve três filhos: Boros, Baddard, e Mestor. Contudo, Abdall era um jogador… Perdia grandes somas de direito em jogos, ao mesmo tempo em que se afundava em conflitos com selvagens e bandoleiros em suas terras.
Boa parte de seus problemas foi a solução apontada pelo Meistre à serviço na época, e por sua sugestão Abdall contratou os selvagens e prometeu-lhes uma pequena porção de terras distantes onde não seriam importunados.
Os selvagens fizeram um bom serviço e pouco a pouco a paz foi reestabelecida em seu território. O líder do bando, Kordnor, tornou-se amigo da família e algumas vezes até esteve presente a mesa nas ceias.
Ainda que tudo estivesse indo bem, Sor Abdall continuou a perder boas somas nas mesas de jogos e a distanciar-se da família… Foi quando a senhora Alles encontrou conforto nos braços do selvagem Kordnor, e desse erro gerando uma criança.
O senhor Abdall ficou transtornado, mas reconhecendo os próprios erros, por amar sua esposa, e para evitar escândalos com o nome de sua família, expulsou o selvagem de suas terras e tomou a criança como sua bastarda.
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Vaelle cresceu sem o amor do pai, e nunca entendeu como tinha apenas o amor da senhora Aelles, sendo uma bastarda. Foi uma menina voluntariosa durante toda a infância, o que lhe rendeu muitas escoriações e machucados.
Num rigoroso inverno, quando tinha 11 anos, Aelles partiu, vítima de pneumonia. Houve silêncio durante semanas, e seu pai tornou-se ainda mais distante.
No ano seguinte, Abdall casou-se novamente, com a senhora Haenna. Dessa união, foi gerado o pequeno Dohor, e por um período breve a casa se encheu de alegria novamente.
Alguns meses mais tarde, o selvagem Kordnor retornou para as terras, convocado pelo próprio senhor da casa. Vaelle foi chamada, e comunicada que partiria com o estranho, e nada mais foi dito. A menina chorou e esperneou, mas a decisão foi final. No fim da tarde, foi levada na garupa de um cavalo, juntamente com algumas riquezas de pagamento.
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Vaelle teve que se conformar com sua nova condição, vivendo entre selvagens, e que aquele era seu verdadeiro pai. A educação que recebeu durante seus 12 anos anteriores, era incompatível com o convívio do bando, deixando a menina sempre deslocada. Até mesmo seu verdadeiro pai caçoava de seus modos e do modo como chorava o tempo todo.
O primeiro ano foi o mais difícil, mas nos seguintes Vaelle foi aceita. Tornou-se uma mulher bonita e destoava bastantes dos demais por estar sempre alinhada e vestir-se mais dignamente, motivos que lhe renderam o apelido de “Lady do mato” entre os seus. Afim de suprir seus gostos, Vaelle encontrou o furto como solução, e se tornou boa nisso. Por vezes usava a distração que os selvagens causavam por onde passavam para fazer ela própria uma discreta pilhagem, rendendo-lhe constantemente algumas pratas.
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Vivendo entre seus companheiros selvagens, deixou de ser uma menina assustada e tomou o mundo para si. Jamais amaldiçoou sua sorte, e passou a se interessar pelas histórias contadas pela rainha dos dragões, admirando a heroína que reconhecia nela, e almejando que um dia pudesse conhecê-la. Era uma mãe para fugitivos e escravos… Talvez ela não a recusasse, como as outras pessoas que amou.