Sabia que Muriel tinha lá suas crenças pouco ortodoxas, mas isso fazia parte da vida, não era? O mundo era repleto de Deuses e adoradores, aquela necessidade fugaz de ter no que acreditar, no que se agarrar nas horas de desespero e dor. Admirava quem conhecia seguir com isso, a ausência de crença talvez transformasse a pessoa em um pote vazio... Como às vezes Jake se sentia. Seus lábios se curvaram em um leve sorriso, ao ouvir Muriel reafirmar que sabia o que ele queria naquele instante.
Ficou ali, enquanto Muriel se aproximava e encostava sua boca na dele, sua reação era apenas observar a jovem, não negaria de forma alguma que gostava do que estava acontecendo, ainda que duvidas pairassem como uma nuvem negra de tempestade em sua cabeça. Suas recordações da clareira ainda lhe eram borrões de incerteza e duvidas... Mas o que elas importavam agora? Jake voltou a sorrir de leve, ele começou a se curvar na direção dela, quando ela se afastou, manteve o olhar fixo em Muriel do mesmo jeito que ela fazia com ele.
Sequer tinha notado, mas a música mudara subtamente para uma que ele não tinha posto na playlist
Crazy, some would say
Where is the life that I recognize?
Gone away
Ele aproximou o rosto do de Muriel, encostou a testa na dela com o olhar fixo nos olhos da jovem bruxa, existia algo ali, Muriel pode ver, um brilho diferente do que se via nos humanos comuns, mas talvez pela primeira vez desde então Muriel não se assustava ou temia. Ele era o que era e ela sabia disso.
Once prompted you to say
Pride will tear us both apart
Well, now pride's gone out the window
Cross the rooftops
Run away
Left me in the vacuum of my heart
As chamas nos potes do lado de fora da casa acenderam-se violentamente, Jake não viu, Muriel não viu, mas Eluna estava na janela da frente da casa, observando o exterior.
- Eu acho que você quer também. - Ele disse e sua voz pareceu distante e abafada, mas isso não importava, porque quando ele se aproximou, quando os lábios do caçador tocaram o seu e a língua invadiu sua boca, quando as mãos apertaram sua cintura e a puxaram para mais perto, o mundo tudo ficou em silêncio.
There's an ordinary world
Somehow I have to find
And as I try to make my way
To the ordinary world
I will learn to survive
Então aquela sala se desfez, desaparecendo, transformando-se em algo que não era. Aquela casa retornou e retornou. Os moveis eram antigos a lareira era de pedra e a lenha queimava. Não havia mais música nem vinho e nem livros. Muriel era Dorothia e Jake era Kraine e eles estavam lá, abraçados à sombra do fogo da lareira, os corpos tão próximos que podiam sentir o coração um do outro. "Eles estão vindo" - Sussurrou Muriel que era Dorothia. "Vocês tem que fugir, sobreviver. Por mim." - E Jake que era Kraine baixou os olhos para ela, um olhar repleto de dor, pesar e ódio, Muriel que era Dorothia sentiu seu coração se partir em milhões de pedaços, como podiam? Como podiam ceifar a felicidade de alguém? Como podiam ser tão cruéis, ela o beijou de novo e então o abraço se desfez. "Vá, agora." - Muriel/Dorothia disse, Kraine/Jake moveu a cabeça e pegou a cesta de vime no chão ele a olhou pela última vez - elas sabiam que seria a última vez - e então saiu porta à fora. Dorothia não chorou, sabia que as duas coisas que mais amava naquele mundo - e em qualquer outro - estariam a salvos.
Dorothia fechou os olhos e Muriel os abriu.
O beijo tinha sido... Um beijo intenso, a visão veio tão rápido que se perdeu em meio ao modo como ambos estavam envolvidos naquilo. Jake tinha Muriel perto do corpo, ela podia sentir a respiração dele intensa e o coração acelerado no peito - tinha ele visto o mesmo? - não sabia com certeza, quando ele afastou os lábios dos dela e enfiou a cabeça entre seus ombros, a bruxa pode sentir o aroma da pele dele, o modo como queria mantê-la perto - e ela queria o mesmo - ele suspirou levemente. - Eu acho que você queria também. - Se Jake tinha visto algo, estava disfarçando muito bem.