Base Providência
23 de outubro | 22h
Hana Choi escreveu:"Ah, então você se apaixonou por um mi'wanish? Você é muito fofa, Mila, definitivamente muito doce também, talvez bem mais do que os caramelos que tanto gosta... Mas agora você quer saber como agir certo com o JP"
Acenei positivamente com a cabeça, bagunçando novamente o cabelo que Hana tinha acabado de ajeitar atrás da minha orelha. Eu sabia que estava roxa de vergonha, mas era aquilo o que eu queria saber, sim.
Hana Choi escreveu:"Quer que ele saiba tudo o que você sente, e agora mesmo é como se o ar faltasse e seu coração parecesse que vai sair pela boca... Você só precisa ser você mesma, é minha primeira dica..."
"Aiden falou a mesma coisa" — eu dei um sorrisinho, pensando no significado por trás daquilo. Talvez os mi'wanish tivessem dificuldades de se vulnerabilizar diante uns dos outros. Talvez por isso, ao contrário de lynnish e ke'tanish, não tivessem desenvolvido Telepatia: viveram tanto tempo por trás de muros e defesas mentais erguidas contra seus semelhantes que esqueceram o caminho para fora de si mesmos.
Hana Choi escreveu:"Se você quer viver a vida como nós aqui na Terra, vai acabar se deixando levar pelos sabores que só os mi'wanish têm. Eles são bobos, às vezes nem sabem o que querem realmente, pensam com... pensam com os hormônios. Tudo neles vibra rápido, com o estímulo certo eles esquecem até que precisam respirar... Mas você é tão fofa, está querendo saber sobre beijos, sobre como deixar o JP animado?"
"Não, eu já sei sobre beijos... Ele..." — será que eu podia contar que tínhamos nos beijado na biblioteca? Troquei o peso de uma perna para a outra. Hana era minha amiga, certo? E, para amigas, podemos contar coisas, certo? Mas as palavras não saíram. Por sorte, ela continuou:
Hana Choi escreveu:"Garanto que você já tira ele de órbita, Mila, só ficando perto dele. Vocês dois formam um casal bonito, assim como o HB e a Kima."
Eu sorri. "Tirar de órbita" era algo bom? Aparentemente, a maior dica sobre romance era ser eu mesma e ficar perto dele. Só isso. Parecia simples, na verdade. Estava quase convencida disso quando Hana emendou:
Hana Choi escreveu:"Você sabe como funciona o sexo aqui na Terra?"
Corei tão forte que fiquei púrpura. Minhas mãos foram direto para a barra da blusa, apertando nervosamente.
"Eu sei o básico... Sei que sexo faz bebês... Os machos têm uma... uma särka que coloca material genético nas fêmeas. Uma... cobra?" — eu queria sair voando dali, mas fiquei —
"A cobra faz algumas mi'wanish sangrarem, em alguns filmes... Mas eu não sei como e nem porque só acontece com algumas..." — parecia algo violento e aterrorizante, para mim —
"Também sei que sexo é parecido com dançar, mas sem roupas. E... parece ser uma atividade que se faz deitado, e não em pé."Tudo bem que o termo que Hana me ensinou para aquele sentimento fosse "atração sexual", mas...
"Você não acha que o John Pablo vai querer fazer isso comigo, né Hana? Eu sou resistente em combate, mas..." — juntei bem as pernas, cruzando os pés um atrás do outro —
"Isso não machuca a t'kha?"
Base Providência
24 de outubro | Madrugada
A conversa que tive com a Hana não me deixava dormir.
Não encontrei John Pablo ao retornar para a base. Poderia pedir ao computador que o localizasse, mas não o fiz. Também não vi Matt, no caminho que tomei. Ainda queria falar com ele sobre ter nos espiado na biblioteca. Porém, fui direto para o quarto.
Depois de tomar a terceira chuveirada e de ter morfado minhas roupas em três modelos diferentes de pijamas, decidi simplesmente caminhar um pouco. A verdade é que eu queria procurar John Pablo, mas tinha medo de invadir o quarto dele e ele querer...
aquilo. Nos filmes mi'wanish, parecia ser um bom momento, mas eu não entendia bem porquê. Mãos dadas eram um bom momento. Beijos eram um bom momento. Dançar juntos, comer, conversar, abraçar: todos bons momentos. Mas ser picada por uma särka no meio da t'kha? Não parecia um bom momento, não.
Conversar com Hana tinha me deixado ainda mais aflita. E se minha fisiologia lynnish não fosse feita para apreciar a
coisa toda? E se tivesse sido por isso que minha espécie evoluiu para eliminar a necessidade de um macho para procriação? Será que John Pablo perderia o interesse em mim se eu dissesse que tinha medo de fazer
aquilo com ele?
Base Providência
24 de outubro | 08h
Eu mal havia dormido e estava uma pilha de nervos. Seria minha primeira vez numa escola mi'wanish. O uniforme estava em cima da cama quando saí do banho. Lembrei das roupas de Mi'wan que Til'andsia guardava em sua casa, de como ela me dizia que eram um tesouro. Ela me aconselhou a usar roupas orgânicas o mínimo possível e ir às compras com amigas sempre que pudesse: aqueles tecidos mortos eram na verdade retratos de uma época feliz, ela dizia. Vesti meu uniforme, sabendo que um dia seria eu a pensar o mesmo.
Peguei uma fita de tecido orgânico, para emergências, e fiz com ela um laço à guisa de gravata. Mudei minha pele para o tom terroso típico de Mi'wan e fui para a sala, encontrar com todos. Cheguei exatamente quando...
Narrador escreveu:Antes de deixarem a base pela manhã, Ly'ra entregou um crachá laranja para Matt e um crachá amarelo para Hana Choi.
Matt Calaghan escreveu:— Senhorita Lyra, com licença, vocês conseguiriam produzir mais cargas para isso aqui? Foi Mila que fez pra mim. Ele permite que eu oculte minha forma aberrante que chamaria muita atenção na escola. Digo, seria muito fácil para a Tríade me localizar se eu fosse assim. Disfarçado eu consigo passar minimamente despercebido, mas acho que a bateria restante vai me garantir no máximo chegar até o final do dia sem me expor. É muito arriscado.
Matt estava com a aparência
humana comum, mas tinha deixado algumas mechas verdes no cabelo. Eu vi isso como um bom sinal, uma pequena parcela de autoaceitação. Ainda queria falar com ele sobre a noite anterior, mas não era o momento. O que ele disse para Lyra fazia sentido e eu esperava que a Base Providência pudesser ser de fato providencial, nesse caso.
Vi Lyra distribuir crachás de permissão, laranja e amarelo, para Matt e Hana. Sutilmente, me aproximei de John Pablo e entrelacei meus dedos aos dele, com delicadeza. Onde estava o crachá dele? Será que Lyra tinha entregado durante a conversa na sala da Diretora, a portas fechadas, no dia anterior? E, se tinha, de que cor era?
Narrador escreveu:— Venham comigo, quero lhes mostrar a sala que a antiga equipe chamou de Buraco de Minhoca. — Ela se deteve diante de um terminal e olhou para Jhon Pablo. — Pablo Kayden, acione o mecanismo. — Vocês chegarão rapidamente a cidade.
Apertei levemente a mão dele na minha e me aconcheguei ao braço do garoto, segurando-o com minha mão livre, quase abraçando, enquanto acompánhavamos Lyra. E estava assim agarrada quando Lyra se referiu a ele como "Pablo-kayden". Apertei o braço dele com mais força, meus olhos cravados nos dele. Pelas Sete Coroas sobre o Trono! Eu sorri e meus olhos cintilaram forte. Beijei-o no rosto antes de soltá-lo, para dar espaço para que acionasse o tal mecanismo. Kayden! Olhei para Lyra e agradeci telepaticamente. Ela tinha nomeado John Pablo como meu Guardião.
\"Narrador escreveu:Jhon Pablo (
@vontheevil), Matthew (
@mun), Hana (
@thendara_selune) e Mi'la (
@Mellorienna) foram transportados da base para um galpão abandonado no centro da cidade através de uma passagem na sala Buraco de Minhoca. A experiência de atravessar a parede de gel foi estranha, como se fossem imersos em um líquido viscoso, mas foi rápida. Ao chegarem no galpão, perceberam que não havia como voltar.
Matt escreveu:— Lembrem-se que não podemos chamar atenção. Se a Tríade nos encontrou antes, ela pode nos encontrar de novo, e precisamos ganhar o máximo de tempo possível para treinarmos individualmente e em equipe. Improviso nos salvou até agora, mas isso sozinho uma hora não vai mais ser o suficiente. Alguém teve notícia de Alex e Kima? Eu queria marcar uma reunião depois da escola para organizarmos a equipe, mas sem eles dois não vai dar.
A sensação de atravessar o Buraco de Minhoca era conhecida por mim: usávamos aquela tecnologia para pontes entre mundos. Apesar disso, eu não gostava. Sacudi o corpo e ajeitei o cabelo como pude depois da experiência. Ouvi Matt e gostei de vê-lo se posicionar de maneira tão prática e assertiva.
"A Hyperwoman fez muita questão de destacar a importância de irmos para a escola e mantermos vidas cotidianas, como parte de um plano para garantir nossa segurança. Acho que Alex e Kima estarão lá."Queria estar mais preocupada com os dois, mas a entrevista na televisão ainda me caía mal, e eu estava nervosa diante do primeiro dia de aula. Ainda não sabia se deveria simplesmente fingir que era surda, como na interação com a vendedora na loja de bikinis da praia, ou se apenas me mostrar muito tímida e vocalizar o mínimo possível já seria suficiente. Eu tinha muito em que pensar e o caminho até a escola não era tão longo quanto eu gostaria.
Peguei a mão de John Pablo de novo — e entraria de mãos dadas com ele na escola, caso ele não se afastasse. Eu queria muito que ele ficasse perto de mim, me dando apoio. Mas aquela era a escola dele, onde ele tinha amigos e... se quiser se afastar, eu não o impediria (só torcia muito para que não acontecesse).
Escola Secundária
24 de outubro | 09h
Aqueles que tinham a mesma idade estavam na mesma
home room — o que me deixava na sala de John Pablo, algo que agradeci mentalmente por acontecer. Porém, durante as aulas específicas, as turmas se misturavam com o ano seguinte, o que foi ainda melhor: na sala de Matemática, a equipe estava inteira unida. Ao ver Alex e Kima, corri para abraçar a garota.
"Estou feliz que vocês estejam bem!"Toquei no ombro de Alex, sorrindo, e fui encontrar uma carteira onde me sentar. Perto da equipe, de preferência. Matt teria sua reunião mais fácil do que pensava, pelo visto. Comecei a ter esperanças de que tudo se encaminharia bem, no fim das contas.
Eu estava atenta ao professor, e me perguntava porque ele não havia feito esse procedimento de me apresentar, se eu era uma aluna nova também (não que eu quisesse isso, longe de mim!). Mas, por isso, vi bem quando ele abriu a porta e os dois novos alunos entraram.
Eu literalmente dei um pulinho na minha cadeira.
Narrador escreveu:Kyon, um jovem com cabelos vermelhos e olhos penetrantes, entrou na sala com um sorriso confiante. Ele olhou diretamente para Mi'larhys.
— Olá pessoal, me chamo Kyon e sou novo na cidade. Depois me apresentem, belê? — Ele sorriu, e algumas garotas da sala suspiraram.
Eu o conhecia com a pele verde. Mas não poderia confundi-lo, mesmo naquele tom terroso mi'wanish, com as sardas se destacando ainda mais sobre o nariz e as bochechas. Kyon Rakmar estava em Mi'wan! Eu sorri abertamente, meio dançando na cadeira, de tanta animação! Ele era meu melhor amigo em Ke'tan!
Narrador escreveu:Enquanto ele caminhava até uma carteira próxima, passando ao lado de Mi'larhys, ele sussurrou telepaticamente para ela, diretamente em sua mente.
— Olá, Lhys.
As outras meninas da sala, notando a atenção que Kyon dava a Mi'la, imediatamente o interceptaram e se mostraram curiosas para saber de onde ele veio e algumas se ofereciam para dar um tour pelo colegio.
"Drak, Kyon-kän." — eu o saudei em ke'tanish e, no elo telepático, estava rindo de felicidade —
"Nem acredito que você está mesmo aqui! Minha mãe vai surtar!" — no bom sentido, e ele sabia.
Ele se sentou por ali e as garotas caíram matando — muito similar ao comportamento da ruiva mascarada com John Pablo, na tarde anterior. Ao meu ver, aquele estava se tornando o padrão normal das fêmeas mi'wanish: caçarem implacavelmente.
"Faz quanto tempo que você em Mi'wan? Eu cheguei no sábado."Abrindo outro canal telepático, isolado, liguei a equipe:
"Eu conheço o Kyon. Ele é ke'tanish. Do planeta que vocês chamam de Marte. Somos amigos desde que erámos crianças bem pequenas."Vi que o outro garoto novato parecia conhecer Matt, porque estavam se falando de uma forma amigável, até bem próxima. Coincidências felizes, certo?
"O Taylor é seu amigo, Matt? Podemos almoçar todos juntos! O que vocês acham?"No elo telepático com Kyon, perguntei:
"Quero te apresentar pro pessoal! Você almoça com a gente?"