Prólogo

O feral Grimlock veio a descobrir que o sentido de rapidez para ele era diferente da do Arthminos. O barão foi, de fato, até uma adega nos limites meridionais do mercado, onde foi recebido de braços abertos pelo proprietário da loja, um homem gordo e com um bigode rechonchudo. Naturalmente eram velhos conhecidos, e Arthminos ficou batendo um longo papo com o vendedor de vinhos. O barão parecia querer saber de todas as novidades da cidade nos últimos dois anos, período este em que ele visitara a cidade pela última vez. Nenhum dos dois pareceu se preocupar com a presença inquietante do feral, e a conversa prosseguiu por vários minutos. Por fim Arthminos comprou o melhor vinho da adega, e para se desculpar com Grimlock, comprou para ele uma garrafa vinda de Suzail, capital do reino de Cormyr.

Depois ambos partiram para a estalagem que supostamente Shaíra estava. Era de manhãzinha e o lugar estava pouco movimentado. Arthminos foi até o estalajadeiro e perguntou:

- Com licença, estamos procurando por uma mulher chamada Shaíra, me disseram que ela estava neste local, você a viu por aí?

O estalajadeiro estava ocupado demais separando uns molhos de chaves e nem se deu o trabalho de olhar aos seus interlocutores.

- Não, com certeza ela não é hóspede daqui.  

Virando-se para o feral, Arthmins disse entre cochichos.

- Vamos ter que procurar por ela por nós mesmos. Eu vou procurar no andar de cima, e você procura por ela no térreo. Ela se destaca bem entre as mulheres daqui, não vai ser difícil reconhecê-la.

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- Hm... Shaíra? Nunca ouvi falar nesse nome antes - respondeu o guarda da estalagem parecendo sincero.

O homem então reparou na imundice que a mulher a sua frente se encontrava. Uma noite na prisão havia sido o suficiente para sujas as roupas e o corpo de Shaira, fazendo ela parecer uma moradora de rua. O guarda foi gentil ao oferecer um banho a ela.

- Vou mandar o criado preparar uma tina de água quente para você, e vou ver se o anfitrião pode lhe emprestar roupas novas. Hm... você deve estar com fome também, não?

Shaira parecia que não tinha uma refeição decente a séculos.

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Logo após Alfador sair do quarto na torre, Janus conjurou uma magia sobre si mesmo que deixou ele com uma máscara de sombras em sua face. O mago não precisou trancar a porta do quarto por que ela já estava trancada. Ele começou a procurar por coisas que lhe fossem úteis, mas pouco encontrou. Aquele quarto apertado definitivamente não era o quarto de Zankharon, mas através de uma carta de nomeação que achou, o mago ficou sabendo que o homem que dormia ali era algum sub-comandante do exército que o bárbaro formou. A coisa de mais valor monetário que havia ali era um pingente de opala ígnea preso a uma fina corrente de ouro. Era um objeto um tanto valioso, e isso significava que Zankharon estava pagando bem aos seus homens.

- Não se preocupe com isso, mulher, vou providenciar o seu banho - disse o guarda saindo pela porta do quarto e deixando Shaíra a sós. Ele voltou alguns instantes depois dizendo que sala de banhos estava preparada para recebê-la. Shaíra não faria essa desfeita ao homem, e ela sabia que precisava mesmo se limpar, então se encaminhou para a sala dos banhos que ficava do outro lado do saguão da taverna.

Uma criada abriu a porta para Shaíra e ela se viu numa sala com vários biombos de madeira. A criada apresentou o biombo de Shaíra, que tinha uma tina cheia d'água exalando vapor quente.

Nesse meio-tempo, Grimlock perguntava para as pessoas que acordavam e desciam ao saguão sobre uma mulher com certas características, mas ninguém a tinha visto, até que um homem simplesmente disse:

- A mulher que você procura está na sala de banhos, que é a segunda porta à direita.

Arthminos ouviu os chamados de Grimlock - assim como praticamente todos os demais hospedeiros do lugar - e foi se encontrar com o feral aos pés da escada. Grimlock o comunicou que tinha encontrado a mulher que procuravam, e o barão sorriu em satisfação.

- Vamos vê-la agora mesmo.

Os dois atravessaram o saguão da estalagem e dirigiram-se até a sala de banhos que estava sendo guardada por uma criada jovem e tímida. Arthminos tirou o chapéu de pena em sinal de cumprimento.

- Olá - disse o barão -, eu e meu amigo aqui queremos lavar as sujeiras de nosso corpo. A senhora teria dois biombos vagos para o nosso propósito?

A moça fez que sim com a cabeça, e perguntou em seguida:

- Os senhores querem que ferva a água?

- Não será preciso, senhora - tratou logo de responder Arthminos sabendo que eles poderiam perder alguns minutos preciosos esperando  a água ser esquentada.

Após dizer que iria encher as tinas de água, a criada entrou na sala de banhos e voltou algum momento depois dizendo que estava tudo pronto. O feral e o barão entraram na sala de banhos com vários biombos separados por cortinas espessas e coloridas. A criada apresentou os biombos reservados aos dois e depois voltou a se retirar do local. Eles deram uma boa olhada no lugar, e apenas num dos biombos saía um vapor quente por baixo da cortina. Era o biombo que Shaíra tomava o seu banho. Ela havia ouvido homens entrarem no lugar, mas até aí não havia motivos para se preocupar. Arthminos olhou para Grimlock e apontou para as cortinas, indicando que ele caminharia até lá. O barão aproximou do biombo em que estava Shaíra, agachando-se em seguida e colocando a cabeça rente a cortina. Ele então disse em voz baixa:

- Senhora Shaíra, é você que está aí? Não precisa se preocupar, eu não sou um dos captores de Maptys. Eu vim aqui para salvá-la.

Arthminos faz um sinal para Grimlock ficar onde estava. Em seguida ele se vira novamente para a cortina.

- Eu tenho notícias de Mirabelle para dar a senhora Shaira - disse o barão. - Com todo o respeito, senhora, a minha magia indicou que você é a pessoa que procuro, aquela que se chama Shaíra. Tenho alguns assuntos urgentes a tratar-lhe. Nada tema, se eu fosse inimigo já há muito tempo teria arrancado fora essas cortinas. Eu me chamo Barão Arthminos, talvez a senhora já tenha ouvido falar de mim.

- Acalme-se, eu não fiz n... - O Barão Arthminos foi surpreendido pela cortina ter sido aberta abruptamente e revelando em seguida uma mulher das tribos nortenhas de Faêrun totalmente como veio ao mundo. Arthminos pareceu constrangido com a situação. - Minha senhora, por favor, cubra-se - disse ele terminando de arrancar as cortinas do biombo e enrolando o pedaço de pano sobre o corpo de Shaíra. O Barão esperou até as partes íntimas da mulher estivessem devidamente acobertadas para prosseguir. - Sei que esse não é um melhor propício, ou talvez seja por não haver ouvidos suspeitos por aqui, mas tenho que lhe contar que a sua amante ou esposa ou seja lá o que as duas são sumiu. Depois que o guarda da cidade prendeu você atrás das grades, Mirabelle não foi mais vista desde então. Aparentemente desapareceu misteriosamente.

Arthminos suspirou - ele havia falado as últimas frases rápido demais como se tivesse se precavendo para Shaíra não ter um novo acesso indevido de fúria.

- A questão é que eu... nós - ele então olhou para Grimlock, o ser feral que se encontrava a poucos passos de distância - estamos dispostos a ajudá-la se você nos ajudar. Não há ninguém, seja na Terra dos Vales ou em Sembia, que conheça melhor Maptys do que eu, Barão Arthminos. Você precisará da minha ajuda, acredite.

- Já vi muitas mulheres nuas, senhora, mas em todas às vezes elas tiraram as roupas porque quiseram, e não por algum homem ter invadido o seu local de privacidade - disse Barão Arthminos, completando: - Ainda tá aparecendo as suas coxas e um pedaço do seu seio, puxe mais a cortina para se cobrir, se não vista a minha capa.

O barão tirou o broche que prendia a capa envolta do pescoço e ofereceu o manto à Shaíra. Ele deu alguns segundos para a mulher se vestir, e então respondeu aos questionamentos.

- Maptys tem mais influência nessa região do que você deve imaginar, senhora. Ele está envolvido em vários crimes e conspirações. O seu nome às vezes passa desapercebido pelas pessoas, mas não por mim, acredite. Eu já fui conselheiro de Maptys quando ele participava da corte de Suzail, e nessa época fiz coisas que me arrependo até hoje. Poderei falar mais sobre isso em outro momento, agora devemos partir. Você deve retornar à Terra dos Vales. Nós ajudaremos a achar Mirabelle, e você nos ajudará a achar... uns itens perdidos. Uma troca de favores bastante justa, não?

Arthminos era convincente em suas palavras, apesar de Shaíra nunca ter ouvido falar que Maptys alguma vez tivesse saído dos domínios de Mulhorand. Mas pensando com mais calma ela se deu conta de épocas em que a ausência de Maptys era sentida dentro do palácio a qual havia se tornado prisioneira.