Rachel novamente via-se em um local escuro. O cheiro de sangue, suor e desespero permeava o ar quando ela era levada até outra sala. Pelo canto dos olhos ela podia ver seus raptores, um casal. O homem, mais à frente, possuía olhos azuis como pedras de gelo, já a mulher era mais difícil de se ver. Mas no fundo, ela sabia tratarem-se de seres abomináveis escondidos por trás de disfarces, como lobos em pele de cordeiro.
A outra sala era ainda mais escura e desarrumada, mas o pior de tudo era que lá havia mais alguém. Dentro de um círculo negro riscado a giz no chão, encontrava-se uma garotinha de não mais de 7 ou 8 anos. Vendada e amordaçada. Ferida e chorando. Seus cabelos ruivos lhe eram familiares, quando Rachel finalmente percebia que a menina era ela mesma...
Em seu quarto, Rachel acordava gritando. Sonhos como este a atormentavam há muito tempo. Ás vezes o cenário era outro, muitas vezes envolvendo um clarão, um estouro que logo se transformava num redemoinho, uma imagem belíssima, colorida, que remetia às fotografias, que vira nos livros, de galáxias e supernovas. Então, uma menina em tons difusos aparecia levitando à sua frente. Nestes sonhos, a garota surgia como um fantasma. Os longos cabelos oscilavam numa agitação aquática, enquanto o rosto aparecia translúcido. Devia ter uns sete ou oito anos, não mais que isso. Ás vezes segurava na mão direita um ursinho de pelúcia encardido, de grandes olhos pretos, nariz longo e focinho esférico. De boca aberta, a menina flutuante pedia ajuda - foi o que Rachel concluiu. As palavras eram arrastadas, e o som, abafado. Atrás dela, um túnel tentava sugá-la, mas alguma coisa a mantinha segura, fixa no lugar. Parecia ligada ao quarto por uma corrente, ou talvez fosse um fio, parte metálico, parte orgânico. O estranho cordão sempre saía do umbigo e descia, entrando profundamente no ventre da própria Rachel! Mas a menina também era Rachel...
O cheiro de enxofre desviava a atenção da jovem, e ela percebia que havia uma espécie de fumaça saindo de suas mãos. Ocasionalmente algo semelhante ocorria em dias muitos frios, vapor gelado saía de sua boca, mas isso era diferente. Seus dedos estavam quentes, avermelhados.
Por anos ela fez terapia para se livrar de seus traumas, e conseguiu levar uma vida relativamente normal, mas os sonhos ainda a atormentavam ocasionalmente, tanto que ela estudou muito sobre sonhos lúcidos, adquirindo um formidável controle de seus próprios sonhos. Mas os sonhos envolvendo a menina (a si mesma quando pequena) por alguma razão, bem... ela não tinha controle deles.
Os sonhos, misturados a outros fatores (como o cheiro de enxofre, cabeça quente e náuseas ao se alimentar se congelados, hamburguer, refrigerantes e semelhantes) fizeram com que algumas vezes fosse diagnosticada com conversão histérica, mas em seus exames, sua saúde (tanto física quanto psicológica) parecia ótima.
Rachel se levantava, limpava o suor da testa e seguia até a cozinha para tomar um copo de água. Ao voltar para seu quarto, ela abria a janela. Estava um dia lindo lá fora, talvez ela devesse fazer uma caminhada para espairecer? Ao mesmo tempo, ela via seu notebook sobre a mesinha e se lembrava de seu último trabalho inacabado que precisaria ser entregue em dois dias. Ainda na mesa, via seu celular, indicando mensagens não lidas.
OFF: Inicialmente será uma narrativa mais ao estilo sandbox. Pode interagir com o cenário como desejar.