Boros Yronwood fazia jus à sua grandeza e ao título de Lorde e Protetor do Caminho dos Ossos.
Era um homem alto e corpulento; não tinha mais os grandes músculos de outrora, verdade, e ostentava agora uma saliente barriga, no entanto, era coberto por uma aura de presença digna de respeito. Vestia-se sempre com roupas nobres da mais delicada seda, geralmente cravejadas com adornos de prata, material este que também estavam em seus grossos anéis, colares e brincos. Fazia questão de valorizar a cultura do lugar que, por anos, estivera distante. Além disso, trazia consigo tatuagens em rosto, peito e mãos, sempre expostos, uma última lembrança de Morgouse e de seu Deus R’hllor. Era, de fato, uma figura que jamais seria ignorada onde quer que fosse.
Nos últimos anos, Paloferro parecia ter se tornado o lugar que sempre desejou que fosse. Khalid, seu primogênito, graças aos seus dotes para os estudos militares, havia sido colocado como seu Comandante, responsável pelas tropas da região. Ainda que fosse muito jovem e até mesmo recebesse conselhos contrários à sua decisão, Boros ignorou quaisquer orientações que não fossem de encontro à sua ordem.
Gwyneth, por outro lado, era uma amante das artes. Tanto visuais quanto políticas. Não apenas suas pinturas eram dignas de admiração, como também sua habilidade com as palavras. Devido ao seu manejo à política, era comum que o próprio Boros, em suas viagens diplomáticas, levasse a filha, que em grande maioria das vezes se fazia como voz ativa nas reuniões e conselhos que o Lorde organizava ou participava.
Por fim, havia ainda Quentyn Martell, seu grande trunfo estratégico como Lorde de Paloferro. Borus foi quem costurou o principal acordo da Casa Yronwood com os Martell, garantindo-lhe a “custódia” do jovem e uma trégua à “guerra fria” entre as Casas. O que seria apenas uma condição política acabou se tornando um laço paternal, tão recíproco pelo jovem à ponto do mesmo pedir para que fosse sagrado cavaleiro pelo próprio Lorde Yronwood.
Apesar de seus feitos, Borus temia que, cedo ou tarde, morresse. Nos últimos anos, criou em sua mente um cenário em que seus inimigos, principalmente em Alcanceleste, de alguma forma enviariam, em algum momento, assassinos para matá-lo ou envenená-lo ou que os Fowler simplesmente invadissem suas terras, declarando Guerra abertamente. Assim, era comum ele desconfiar de todos que não estivessem dentro do círculo de confiança que havia criado para si, que consistia basicamente em seus filhos e servos diretos.
Sabia, no entanto, que não poderia evitar O Estranho ou A Vontade de R’hllor.
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Naquela manhã, não tão diferente das outras, acordou antes do primeiro raio de sol surgir por entre as montanhas. Era comum assistir o sol nascer e ordenar que seu desjejum fosse entregue em seu quarto em seguida, o que foi criteriosamente feito. Em seguida, banhou-se em água quente, num grande ofurô que ficava ao lado de seu quarto. Ficou lá por um bom tempo, emergindo e submergindo diversas vezes, como uma criança que brinca efusivamente com a água. Por fim, ordenou que o jovem Gaston, o faz-tudo, convocasse seus filhos, Quentyn, o pequeno Conselho e as Espadas Juradas, pois desejava falar à eles. Gaston, obedientemente, acatou às ordens.
A água já estava completamente fria quando Borus saiu e secou-se. Vestiu-se com uma longa, porém leve, túnica branca com pequenos botões dourados na frente, que estavam perfeitamente abotoados do tórax à cintura. Colocou ainda uma sandália de couro de búfalo, decorada com pequenos entalhes feitos à mão nas tiras que subiam e fixavam-se firmemente até suas canelas. Alinhou a barba com a mão, passando uma cera à base dos favos de mel produzidos por abelhas e aromatizada com hortelã. Por fim, colocou os grossos anéis de prata, adornados de pedras esmeraldas e escarlates.
Ao sair de seus aposentos, o Naja d’Areia estava à sua porta, como sempre, em prontidão e passou a seguir seu lorde, à medida que o mesmo deslocava-se para o salão. Seus passos eram tão firmes e pesados que faziam com que o solado de suas sandálias ecoassem pelos corredores. No caminho, Xaros já o aguardava e Boros cumprimentou o amigo e conselheiro com um forte e demorado abraço.
Sua chegada ao grande salão foi anunciada e, assim que entrou, dirigiu-se para o centro do mesmo, enquanto observava à todos os presentes ali. Percerreu os olhos pelos filhos, pelos membros do pequeno conselho, pelas Espadas Juradas, pelo Meistre e por alguns outros servos que ali estavam. Notou, porém, uma ausência.
- Onde está Quentyn? Tragam-no aqui.A voz do Lorde era forte e ressoou com potência no salão. Alguns servos começaram a se mexer antes mesmo que ele ordenasse que trouxessem o jovem Martell. Não gostava de esperar, mas não ignoraria a ausência do protegido, ainda mais para aquele momento e assim que Quentyn estivesse presente, passou a falar.
- Quando voltei a Paloferro, voltei para seguir o legado de meu pai. Legado esse que, com muito trabalho, diplomacia e rigidez, pude honrar. A Casa Yronwood tem um nome a zelar. Uma grandeza que em outros tempos muitos tentaram derrubar. Mas sempre estivemos firmes, jamais tombados. Vocês que estão aqui fazem parte disso. São a engrenagem que tornam nossa grandeza realidade.Fez uma pausa.
- Mas podemos mais… Chegou a hora de darmos o passo adiante, de consolidarmos nosso poder em Dorne para nos tornarmos a potência política, econômica e militar que fomos Eras atrás.Começou a caminhar, afastando-se de Xaros e de Naja d’Areia.
- É claro que isso não será feito da noite para o dia, mas nos últimos dias pensei muito em como daremos esse passo para nossa expansão. Um passo que talvez leve gerações para conquistarmos.Voltou os olhos aos filhos e retomou a palavra.
- Mas antes quero ouvir meu Comandante e minha Diplomata.A voz grave de Boros retumbou pelo salão enquanto seus olhos, agora, encaravam energicamente ambos os filhos, esperando que eles tomassem a palavra. Os filhos, por outro lado, sabiam que aquela era uma convocação, uma ordem para que colocassem suas perspectivas a respeito do assunto para seu Lorde.