Sankar Nassam
O Senhor do Tor não parecia partilhar de toda a certeza que Sankar quanto aos "inimigos" da Campina. Talvez fosse possível classifica-lo como paranoico ou incitador de uma guerra contra os vizinhos de Dorne, mas Trebor parecia basear-se em algo mais. Fato era que, tratando-se de um ataque das forças da Campina às terras fronteiriças de Dorne, o único real empecilho atualmente existente era a maior fragilidade das Terras da Tempestade. Por outro lado, terras dornesas nunca foram alvos fáceis e a Campina saíra recentemente de um conflito, além do problema com as rebeliões restantes.
Quando Sankar levantou-se, dando a entender que já estava disposta a acompanhar o anfitrião, Trebor caminhou sem pressa até a porta pela qual o convidado entrara e a abriu, sempre certificando-se de que Sankar estaria próximo o suficiente para ouvi-lo quando falava. Sequer deu-se ao trabalho de alertar aos serviçais que já estava se retirando para que tirassem a mesa, talvez por esquecimento ou desleixe.
Quando o herdeiro dos Portões do Inferno disse o que pensava sobre as possibilidades da Campina em resposta à pergunta feita, Trebor limitou-se a desviar o olhar. Não desaprovou ou concordou, reagiu como se a resposta estivesse dentro do esperado ou não fosse de se estranhar, mas voltou a encarar Sankar com aprovação nos olhos ao ouvi-lo opinar sobre a abordagem de Dorne em relação às Terras da Tempestade.
- Estou certo disso, Sir Sankar. Espero que você possa falar a respeito com os Príncipes também, quando encontra-los em breve.- Respondeu com vigor e ênfase no pedido indireto, pausando ao fim. Encarou o chão por alguns instantes, pensativo, para depois erguer os olhos com decisividade.
- De qualquer modo, tens em Tor um aliado para quando a hora de enfrentar os de fora chegar. Seja em nossas terras ou nas deles.Com o assunto parcialmente encerrado, Trebor e Sankar seguiram pelas escadas rumo ao calabouço onde poderiam lidar com os prisioneiros como fosse necessário. Ficara claro que ambos tinham diferenças básicas na maneira de encarar deveres,
lealdade e também em suas respectivas visões a respeito dos movimentos inimigos, mas partilhavam de uma boa semelhança na maneira e determinação com que abordavam os conflitos.
Talvez o cenário apontado por Sankar fosse o mais provável, mas restava saber o quanto ter um Targaryen no
jogo mudaria as coisas. Afinal, com as revoltas de Renly e Stannis terminadas, as grandes ameaças para a coroa vinham do Norte e principalmente do sangue do dragão. Lorra, a partir de então, era
posse valiosa.
Tomados por seus pensamentos, ambos, Trebor e Sankar, teriam um bom tempo de caminhada sem que uma palavra sequer fosse dita a menos que o Nassam quebrasse tal silêncio. Deixaram o prédio pelo mesmo caminho de cedo que daria nos portões de Tor, mas obviamente não dirigiam-se exatamente para lá, vez ou outra sendo abordados por soldados ou serviçais que educadamente os reverenciavam. O Herdeiro Nassam poderia estranhar mais uma vez a atitude de Trebor, que não exigira nenhum soldado para acompanha-los, embora estivessem dentro de Tor e ele fosse o Senhor.
Sankar permanecia envolvido com dúvidas e informações com as quais tentava montar a retrato completo da situação atual, chegando a estar com a mente bem distante em alguns momentos. Foi quando a voz de Trebor, ainda baixa e rouca, chamou-lhe a atenção. Não havia entendido o que o velho dissera, mas bastou olhar para onde os olhos do Jordayne miravam para encontrar o motivo da distração: Lyla.
A bela dornesa quase esbarrara nos dois, parecendo vir exatamente da direção para a qual os dois rumavam, acompanhada por dois soldados. A luz ali era pouca e a movimentação menor ainda, basicamente algumas tochas em paredes distantes e alguns outros soldados no topo da guarda nos portões, além de dois vassalos carregando tecidos. O contraste entre a luz noturna e a das chamas nas tochas fazia parecer com que a hora não fosse tão avançada, mas ainda assim a visão de Trebor merecia elogios por ter identificado Lyla.
Estavam há aproximadamente vinte metros da entrada na qual Sankar e Lorra foram recebidos pela manhã, indicando que o calabouço realmente deveria estar localizado em uma das estruturas da muralha, subterrânea, além de que com certeza estavam perto de chegar lá.
- O que faz aqui?- Perguntou Trebor autoritário e com indícios de raiva na voz, como um guarda que encontra um vagabundo em aposentos reais. Era claro pela reação do Lorde que sua serva não deveria estar ali.
Surpresa, Lyla observou a face de seu velho Senhor com estranhamento, perdeu a postura por alguns instantes e voltou sua atenção para Sankar. Realmente, era deveras estranho encontrar o Senhor de Tor e o herdeiro dos Portões do Inferno passeando por ali. Quando relaxou, já convencida de que o que via era real, a primeira coisa que fez foi sorrir com a leveza e beleza que lhe eram naturais.
- Meu Senhor.- Reverenciou, sem voltar a erguer a cabeça. Não havia nervosismo em sua voz ou em seu comportamento, portava-se como lhe era habitual, porém a resposta para a pergunta do Lorde não veio.
Ela ergueu a mão esquerda, ainda com os olhos no chão, e sinalizou para que os soldados que a acompanhavam se fossem. Talvez ganhasse tempo para pensar no que diria ou só não queria espectadores para assistir suas desculpas, porém, estranhamente ignorando a ordem, um soldado permaneceu. A atenção de Trebor era dividida pelo ousado soldado e sua serva, que até então só fizera envergonha-lo com sua incompetência. Primeiro com o pertence de Sankar e agora ali, "perdida" próxima aos portões.
Já impaciente, Trebor deu um passo a frente e repetiu a pergunta. Em resposta, sua serva Lyla, respirou fundo e ergueu a cabeça para visualizar os dois nobres.
- Libertando um dos seus prisioneiros.- Sorriu leve, pronta para divertir-se com a reação dos dois. O soldado ameaçava levar a mão até a espada.