Hyemin só observou a situação com Hayoung se resolver. Por um momento tinha esquecido que a menina estava por ali, apesar de senti-la e isso fazer com que estivesse em um estado de espírito bem menos deplorável quando Yerin surgiu.
Prontamente emprestou seu álcool-gel. A bronca mais uma vez parecia valer para si. Não conseguiu encará-la, só assistindo às reações de Hayoung e definindo bem o tipo de pessoa que não queria ser, mas sem querer acabou naquela situação. Tinha medo. Será que a amiga tinha percebido toda sua fraqueza? Estava com imensa vergonha do que tinha feito agora. Poderia ter simplesmente ficado quieta e invisível, mas de repente estava com um ovo podre na mão e no momento seguinte a mesma mão estava suja.
Definitivamente não queria ser disciplinada, embora tivesse certeza de que Yerin jamais faria algo assim com ela, achava que merecia. Talvez devesse ter levado aqueles restos de peixe na cara, por ter fraquejado naquele momento e agido de uma forma inexplicável.
No dia seguinte teria mais, mas com as meninas que faltaram à brincadeira. De alguma forma não estava com energia para pensar nisso. Teria que mostrar serviço e uma postura completamente nova, para não demonstrar o quanto estava abalada. Aliás, qual era seu problema? Por que exatamente estava com medo de fazer traquinagens com as novatas? Geralmente daria risada. Era como se tivesse participado do paredão também. Não entendia por que estava tão incomodada.
Lançou um olhar de canto para Hayoung, mas não fez mais do que um aceno leve, seguindo a amiga. Quando estava começando a sentir-se mais leve, elas encontraram o grupinho de Jung Mi e a vergonha subiu de uma vez. Sabia que tinha feito algo errado e, aparentemente, eles também. Seu rosto empalideceu um pouco mais. Não gostava de ser pega fazendo bobagem e agora queria enterrar o rosto debaixo da grama de Wangjo. Seus olhos encontraram rapidamente o do rapaz, mas ela só fez uma reverência bem profunda, praticamente escondendo o rosto e acompanhou Yerin a passos rápidos.
Como faria para explicar sua cena para as outras pessoas? Tinha medo do que eventualmente pensariam dela por causa daquilo. Não queria que ninguém assumisse nada a seu respeito em relação ao garoto. Na verdade, preferia que ninguém nunca os ligasse. Afinal, tinha acabado de quebrar a relação passada entre eles, mas para os outros tinha ficado aquela surpresa geral.
Entrou no carro e ficou olhando para o amigo pela janela, parecendo apreensiva, declarando-se completamente culpada em sua reflexão. Mesmo assim, forçou um sorrisinho e deu de ombros, acenando.
Lá dentro suspirou profundamente. Agora estava livre? Não. Arregalou os olhos e virou assustada para a amiga inquisidora. Sentiu o estômago revirar de novo e o pavor de ser descoberta. Nem conseguia ser menos transparente e confirmava em sua reação tudo que ela desconfiava.
Abriu a boca para se justificar, mas a amiga lhe contava o quanto confiava nela. Sentiu uma imensa culpa. Nem adiantava tentar mentir muito. Abaixou o rosto e concordou com a cabeça de leve, mas não teve coragem em falar mais nada. Estava sentindo-se a pior amiga do mundo, além de todos os outros sentimentos negativos pelo “aniversário” de Eunjoo. Falhava logo com Yerin, que sempre tinha sido tão protetora em todos os momentos. Ela estava chateada com razão.
Ficou brincando com os dedos da mão e cabisbaixa pensando a respeito. Yerin já sabia de tudo. Tudo quanto? Será que já a achava patética e ridícula por ter uma reação tão forte por causa de um amigo de infância tão antigo e que nunca mais falou com ela? Fez uma careta, sentindo vontade de chorar de novo. Não poderia ser pior! A amiga odiava gente que chorava. Engoliu e respirou fundo. De repente não queria mais tê-la convidado para casa, mas sabia que seria tudo muito pior de enfrentar sozinha. Olhou para cima, nervosamente. Tinha muito medo de contar tudo e ser desprezada como Hayoung, porque não conseguia controlar seus sentimentos. Aquele garoto extraia dela seu pior lado, o mais fraco e idiota. Há muito anos não era mais assim. Pelo menos, não de forma explícita. Sempre tentava acompanhar Yerin.
Queria pedir desculpas, mas isso era mais uma atitude de fraqueza que ela jamais poderia admitir na frente da outra. Estava naquela situação péssima na qual era impossível fazer a coisa certa. Yerin confiava nela, mas ainda assim… não conseguia contar. Era uma parte de si tão íntima e preservada, um lado seu muito mais pueril do que jamais tinha mostrado.
Seu silêncio durou todo o caminho até o casarão Seo. Levou a amiga direto para o quarto e distraiu o assunto com o propósito de ficarem limpas e tranquilas. Ligou a banheira, preparada com uma bomba efervescente para eliminar completamente qualquer odor que pudesse tê-las contaminado. O primeiro banho seria para a amiga. Já tinha roupão e mudas de roupa para ela reservadas especialmente em sua casa. Ela ficou um tempo explicando onde tinha comprado a essência e do que ela era feita, depois a deixou em privacidade. Obviamente estava tentando alegrar o ambiente e tentando mudar o foco da conversa. Em nenhum momento comentou o quanto a amiga era “incrível” por sua coragem na cena, o que ela geralmente fazia em cada uma das vezes que a via agindo.
Nesse meio tempo, a garota sacou o diário, onde tentou desopilar sua mente confusa para encarar a conversa com a amiga de forma menos desesperada. Isso a ajudou a se acalmar um pouco, mas quando ouviu o mínimo barulho de que ela tinha terminado, guardou o diário e foi sua vez de tomar banho.
A água foi capaz de relaxá-la, mas quando fechava os olhos, lembrava das expressões negativas que Kim Joo Hyuk tinha direcionado a ela. Desde quando era digna de tanta pena, raiva e desprezo? Sentia-se péssima por ser tratada assim. Tudo seria diferente se ele apenas tivesse dito “oi”, mas o fato que era mais difícil de aceitar era que tinha dado muito mais importância para o filho da funcionária de seu pai do que ele merecia.
Dava-se conta agora de como seus caminhos tinham se separado completamente e não sabia nada sobre ele, diferentemente daquela menina estúpida, quem ele defendia e parecia conhecê-lo tão bem. Era natural que fosse assim, pois eram muito novos mesmo, mas não queria. Não sabia até então, mas nunca tinha matado de vez aquela amizade.
No fundo, não esperava passar por essa situação de novo e era isso que realmente doía: a indiferença com que tinha sido deixada e a frieza com que foi recebida depois, o que confirmava sua falta de importância. Partia de alguém que ela tinha confiado sem barreiras e sem medo, pois era criança, e por isso era tão difícil contar agora, muitos anos depois, o quanto tinha sido burra e por que era tão importante. Nem ela mesma conseguia entender o motivo de lhe incomodar tanto. Ia muito além de sua capacidade de compreender sentimentos, mas o fato é que a época tinha sido fundamental.
Foi só quando conseguiu tirar todas as lágrimas possíveis de seus olhos, mesmo forçando algumas para não ter nenhuma chance de chorar com a amiga, que terminou o seu banho e saiu com uma roupa fresca de casa, com os cabelos presos em uma touca. Yerin era uma das poucas pessoas que a conhecia sem maquiagem e com uma aparência daquelas.
Sentou-se na cama com um sorrisinho sem graça. A amiga tinha acesso ao laptop se quisesse, deixava a senha compartilhada, afinal não fazia nada demais ali dentro. Também tinha intimidade o bastante para pegar qualquer produto de beleza de Hyemin ou roupas. Sentou-se na cama, preparando para dar um jeito nos cabelos.
- O que ficou fazendo? Ah, bem melhor agora, não é? - sorriu, mas não muito. Sentia o olhar certeiro da amiga cair sobre ela e isso a fazia sentir-se muito culpada. Não queria falar sobre Joo Hyuk, seria possível? Só queria matá-lo de seu coração para sempre e aceitar que os tempos eram outros.
- Será que dá pra tirar cheiro de peixe do cabelo? Nossa, as unnies capricharam mesmo. Você foi muito corajosa! - comentou, parcialmente natural. - Estou com fome. Acabou que não comemos nada, vamos para a cozinha? Até prepararem dá para eu secar o cabelo
Hyemin providenciou a comunicação entre os empregados. Dessa vez não cozinharia, por uma questão de tempo mesmo. Quando terminou de secar os cabelos, já a levou para a sala de jantar montada para elas.
Estava se esforçando, muito, para não falar especificamente do “orelhudo”. Falou que não entregou o presente no fim das contas, comentou dos professores novos, até tentou emplacar a conversa do noivo, mas nada funcionou para que ela sentisse que estava sendo honesta e conseguisse olhar no rosto da amiga. Afinal, não havia assunto maior naquele dia que outro conseguisse ofuscar.
Levou o almoço todo com essa culpa, até ficarem a sós de novo, dessa vez na sala, quando voltou para o longo silêncio, até ter coragem de falar algo.
- ...Mian..Yerin. Eu confio muito em você. De verdade. Você é a minha melhor amiga do universo todo. Mas… Bem, a verdade é que… isso não tem importância. Mesmo. Não sei nem por que eu fiz aquilo. Eu só… fiquei com muita raiva. Desculpa se eu decepcionei você. Eu não gostei do jeito atrevido que aquele garoto apareceu. - baixou um pouco o olhar. - Se fosse alguém importante eu te contaria. De verdade. Mas ele é só … - parou um pouco para pensar em como definir e tornou a olhá-la. - É um conhecido do meu pai, entende? Ou melhor… a mãe dele que é. Ele é só um porcariazinha filho de uma funcionária do papai. Um vassalo qualquer. Só não esperava vê-lo nesse ambiente, sabe? Um nerd espiando a gente. Foi isso que eu senti. Ele devia estar naquele paredão desde o começo, mas anda por aí cheio de orgulho. Não gosto do jeito superior que ele olha pra gente. Você viu como trombou na Won-a? Desculpe esconder isso de você, mas é que realmente não tinha a menor importância...