Kang virou-se para o amigo ao ouvir aquilo. Estava com uma expressão um pouco chateada por ter que fazer dez páginas em três dias, durante um tempo que não tinha, mas estava decidido a se virar. As palavras de Jae-Ki, contudo, fizeram com que ele arregalasse um pouco os olhos e sorrisse de modo sincero.
- Sério? Ah, não precisa, Jae-Ki-Shi! Não seria correto, mas acho que seria uma boa você fazer por conta mesmo. Vai que ele cobra isso na prova. - Coçou a nuca. - É, eu acho que todos nós sabemos agora que você ia gabaritar, mas ele ficou bem irritado. - Dava seu ponto de vista. - Nem todos sabem como nossas vidas são complicadas, mas se assumimos o desafio, temos que arcar com as consequências, né?
Disse de modo quase sábio. Quase, porque, afinal, era Kang quem estava falando! A sabedoria passava longe ali por conta de seu jeito muitas vezes impulsivo, espontâneo e atrapalhado. Logo ele sorriu de novo e emendou.
- Tipo eu. Fui rir do professor, porque realmente foi engraçado, mas agora tenho dez páginas pra fazer. Esse colégio tem uma mão pesada mesmo. Será que todos vão pedir uma pilha de dever de casa? Aish, não vai dar pra dormir mais.
Comentou e começou a caminhar para fora da sala. Olhou para a mochila sem entender porque a estava levando consigo se iam deixar ali, mas resolveu que a deixaria no armário durante o intervalo. Vai que né? Jae-Ki era o paranoico do trio, mas não custava nada ficar ligado em algumas coisas. O e-mail do diretor tinha deixado a todos meio atentos...Maldades aconteciam ali.
- O Won-Bin deve estar ali fora, vamos achá-lo e...
Kang travou quando Bo-Mi entrou daquele jeito na sala. Conseguia entender porque Won-Bin tinha vontade de se esconder, era vergonhoso demais corar por conta da beleza daquela menina. Ela era tão fofinha que dava vontade de colocar num pote e levar pra casa. Mas se um deles fizesse isso, seria sequestro e ninguém queria terminar preso, né? Bo-Mi não parecia ter nenhum pingo de medo de Jae-Ki, apesar de toda a aura de badboy dele e do vídeo.
Sabia que as pessoas podiam ser exageradas e suas amigas eram bem dramáticas. Além do que, a mídia sempre retratava apenas um quadrado de um mundo vasto e redondo. Era óbvio que dependia do referencial, do ponto de vista. Por isso mesmo ela estava agindo de modo neutro, como agiria com qualquer pessoa. Até porque, que mal Jae-Ki poderia fazer a ela ali no colégio? Não era nem louco! Né? Esquentado, talvez. Louco, não parecia.
- Porque ontem só você falou. - Foi bem direta em sua resposta. - Não foi? Talvez hoje ela queira dar a versão dela, depois que todos os ânimos se acalmaram. E olha que para a Eun-Bi-ya não explodir na hora, é uma grande evolução. Você deu sorte ou... - Mexeu na ponta do rabo de cavalo. - Ela quis te preservar.
Sorriu de modo neutro. Kang nem prestava atenção no contexto, só na forma com que ela se movia e falava, realmente atraindo as atenções para si e encantando com aquele jeitinho dela.
- Ah, mas se você prefere fingir que não a conhece...Eu vou lá dizer a ela que você não vai e...- Bo-Mi já estava se virando para ir embora, mas quando Jae-Ki disse que ia, ela deu outro sorrisinho. Que morreu quando ele a ameaçou tacar no lago. - Eu juro que não é um trote, não precisa me ameaçar! Aish, só quero ajudar.
Fez um bicão de ingratidão.
- Você que sabe. Vou ver onde ela está. - Sacou o celular e mandou uma mensagem para Eun-Bi, bem na frente de Jae-Ki, como se não estivesse nada a esconder.
Kang só ouviu mesmo a última parte e precisou virar para encarar Jae-Ki.
- Que?
- Ela está no refeitório, mas lá deve ter muita gente. Se você gritar de novo com ela ou ela com você, é bom que seja longe da vista das pessoas, hm? Falei pra ela ir pro lago. Vamos. - E logo fez sinal para que Jae-Ki a seguisse, saindo mexendo o rabo de cavalo de um lado pro outro.
Kang foi logo atrás de Jae-Ki.
Won Bin não estava longe, muito pelo contrário. Ele estava no fim do corredor, a menos de 10 metros da sala, conversando com Kim. Ele era observado, de modo pouco discreto, pela menina de bochechas grandes. Bo-Mi parou por um instante, vendo para onde Ye-Ji olhava. Quando viu Won-Bin ali, ela encarou o rapaz, arqueando mais uma das sobrancelhas e fazendo um.
- Hunf. Vamos, Jae-Ki.
Kang ficou parado na porta, levando a mão até o peito. Caso Won-Bin olhasse pra ele, diria.
- Ele vai falar com a bonitona lá no lago. Se você terminou aí, não acha uma boa irmos também?
Gyu-Sik encarou com bastante atenção aquela cara de bravinha. Felizmente, ele era o tipo de pessoa que conseguia se controlar com facilidade, mas qualquer um acharia aquela cara muito fofinha. Ele, contudo, ergueu o indicador até a bochecha dela e meio que pressionou, como se estivesse "estourando uma bola com um alfinete", mas no caso era só pra ela soltar o ar mesmo.
- Você ficou bem exigente com o que come. Antigamente a gente podia comer qualquer coisa. - Foi um comentário pontual, não para ofender. - Continua com aquelas dietas super rigorosas? Pra que? Você está tão...
Nesse instante, Gyu-Sik sentiu os olhares de Mia e Eun-Bi sobre ele. Ele olhou para as duas, dando de ombros.
- Tão...? - Mia o incitou a falar.
- Tsc. Ótima.
- Tão ótima? A frase não parecia terminar assim. - Mia continuou.
Gyu-Sik deu as costas e começou a caminhar na frente, sem muita vontade de prolongar aquela conversa desnecessária. Porém, quando ouviu a resposta de Eun-Bi acerca de BoMi, ele olhou desconfiado para a cara de MiSoo também. Cerrou os olhos, achando que tinha algo de errado, mas...Sabia que a irmã tinha algum juízo e não faria nada inconsequente. E também imaginava que ela não estava sofrendo nas mãos de ninguém, até porque, as amigas não estariam tranquilas se Bo-Mi estivesse com problemas graves.
Enquanto desciam as escadas, Hyun Hee passou por eles como um trovão e MiSoo saiu com aquele comentário divertido. Eles conseguiram se conter um pouco e riram longe dos ouvidos do menino. Não por ele, mas pela forma como a garota falou. Também passaram por Jung Mi e Hyemin e Gyu-Sik fez sinal de que estavam descendo. Jung só meneou positivamente, mas não saiu de onde estava.
Os garotos seguiam na frente enquanto Mia era a última e ouvia, em partes a conversa. Eun-Bi parecia um pouco melhor depois de ter levado a cara no banheiro, mas estava ansiosa pelo resultado da busca de Bo-Mi. Quando chegaram de braços dados no refeitório, elas viram que o lugar já estava consideravelmente cheio. Mas ainda assim, MiSoo conseguiu identificar a menina nova com Stella. Eun-Bi também a encarou, mas MiSoo a emendava.
- Ahm...Eu acho que... - O celular de Eun-Bi tocava com a mensagem de Bo-Mi. - Oh meu Deus... - Levou a mão até o peito. - Não vai dar...- Começou a digitar que estavam no refeitório e Bo-Mi disse que o levaria até o lago, para terem um pouco de privacidade. Eun-Bi ponderou e olhou para a amiga. - MiSoo-ya....- Falou baixinho. - Eu estou um pouco nervosa, mas acho que eu deveria ir sozinha. Quer dizer, eu não vou demorar muito, prometo. Mas eu queria tentar conversar sozinha. Será que você...se importa em ficar? Eu juro que não vou deixar nada de mal acontecer.
Mas Eun-Bi achava, pelo pouco que conhecia Jae-Ki, que ele acharia que estava num ambiente hostil se MiSoo fosse junto. Não queria passar a impressão de Gangue ou coisa do tipo.
- Eu deixo o celular ligado pra você ouvir a conversa, se quiser... - Propôs.
- O que foi? - Gyu-Sik voltou porque elas tinham parado.
Mia estava por fora da ideia, por isso fazia uma cara de paisagem, olhando as pessoas que estavam por ali.
- Nada. - Eun-Bi comentou e esperava pela resposta de MiSoo.
Quando Jae-Ki desceu o fim das escadas com Bo-Mi, ele encostou Eun-Bi parada perto da porta, de braços cruzados. A menina estava com o celular e um chá gelado na mão. Tinha deixado a carteira com MiSoo que também estava ao lado dela. As duas voltaram o olhar na direção dele quando ele chegou. Bo-Mi tombou um pouco a cabeça e quando se aproximou, Eun-Bi olhou fixamente para Jae-Ki antes de falar com Bo-Mi.
- Não vamos demorar muito, meninas. Fiquem tranquilas. Vamos?
Olhou para Jae-Ki e deu as costas o convidando a caminhar ao lado dela. Os dois manteriam uma distância respeitosa enquanto seguiam para o lago que não ficava tão longe dali, mas que custariam algum tempo do intervalo deles. Como ele bem podia perceber, o que Bo-Mi tinha dito, era verdade: Eun-Bi parecia um pouco envergonhada, sem saber o que dizer à principio.
Já dentro do prédio, Mia se aproximou das meninas com um café gelado.
- O que houve? - Perguntou.
- Quantos passos você acha o ideal para começar a seguir? - Bo-Mi perguntou mais para MiSoo do que para Mia, até porque, se agarrou ao braço da amiga. - 20 tá bom? Eles já deram 13...
- Eu sou muito grande para me esconder. Mas ficarei daqui vendo, qualquer coisa me gritem.
Jung Mi deixou que Hyemin o interrompesse naquele momento e falasse aquilo. Porém, ele apenas meneou negativamente.
- Não interessa agora, mas a pessoa estava certa. Acho que fui um robô desde que tudo aconteceu, mas...Eu percebi à tempo de tentar mudar. Porque eu não quero passar a minha vida sendo assim, como eles. - Nesse caso, ele falava dos responsáveis.
E talvez Hyemin entendesse melhor do que ninguém como era ruim conviver com um "robô". O seu pai podia ser maravilhoso, mas ele tinha lapsos de momentos carinhosos. Apesar de sempre estar presente, acompanhando as notas e os cursos que Hyemin fazia, além de dar tudo o que ela queria, ele era fisicamente ausente. E muito frio, na maioria das vezes. A última noite tinha sido uma das "exceções" quando ele queria agradá-la e passar um tempo diferente.
Mas quantas coisas ela não sabia de seu pai?
Quantas coisas ele não sabia dela? Tudo porque ele agia daquele modo mecânico, indiferente, ainda que estivesse preocupado. Era o mesmo modo, de certa forma, que Jung Mi vinha agindo. Parecia que ambos tinham optado por abdicar dos sentimentos diante de uma perda irreparável. A diferença consistia no fato de que Jung Mi, com apenas 16 anos e sem uma filha, percebeu que não dava para viver assim.
Porque isso não era vida, era sobrevida.
E isso não fazia sentido para ele.
- Eu fui obrigado a amadurecer, mas ainda só tenho 16 anos e o peso do mundo nas minhas costas agora, Hyemin-Ah. - Suspirou. - Eu fui obrigado a mudar, mas não quero ser alguém que aparenta não se importar com os outros. E é por isso que estou falando com você agora. Estou correndo o risco de você ficar chateada comigo, mas eu sou seu amigo e seria uma omissão terrível minha permitir que isso passasse em branco.
Ajeitou-se no mesmo lugar e permitiu que Hyemin tomasse sua vez de falar. Concordava, em partes, com o discurso dela mas não totalmente. Franziu as sobrancelhas e quando ela terminou, um brilho emocionado surgiu em seu rosto. Ele mordeu o lábio internamente, enfiando as mãos nos bolsos, fechando o punho e meneou positivamente.
- Não tem como te odiar, Hyemin-Ah. Você foi o meu primeiro amor platônico e hoje em dia é uma das pessoas mais importantes da minha vida. Uma das poucas com quem me preocupo. - Suspirou. - Desculpe por ter dado a entender que você seja influenciável. Tudo bem, eu não dei a entender, eu afirmei. Mas é porque eu conheço sua cabeça deslumbrada, Hyemin...E sei que você dá muito valor a "coisas" e gestos que, para os outros, não é tão importante assim. E quando você dá valor, você se doa demais e nem percebe.
Jung Mi mirava numa coisa, mas nem percebia que acertava em outra completamente diferente.
- Não conheço Yerin de modo intimo. Não somos amigos, apesar de eu respeitá-la bastante. Acho que ela sabe se impor e sabe qual é o lugar dela no mundo, age como uma rainha. Mas...Se você olhar com uma lente para os olhos dela... - Jung encarou bem Hyemin. - Eu não vejo a indiferença que ela passa. Eu vejo uma guerra acontecendo dentro dela. E isso me faz ter uma mistura de pena e raiva. Porque ela desconta nos outros que não merecem.
Tirou as mãos dos bolsos e cruzou.
- Mas fato é que...Avise à sua amiga que eu não quero que episódios como esses se repitam. E se eu souber que ela mexeu com um nome em particular, ela vai ter que se ver comigo. - Que nome particular? Ele não disse porque não queria que ela mexesse com ninguém. - Ou talvez eu mesmo vá ter uma conversa com ela muito em breve. Ela pode ser a rainha da sala, mas é bom saber que o rei também despertou.