O humor de Hyun Hee era bastante instável, e não era como se se ele soubesse se comportar muito melhor do que Misoo naquele meio de herdeiros. Um embate entre duas pessoas inconsequentes não era realmente algo que deveria ser feito em um ambiente daqueles.
Observar a expressão confiante da menina oscilar por um segundo agradava bastante seu ego, mas o fato de que ela continuava firme apesar de tudo o deixava interessado. Até onde iria toda aquela coragem de falar daquele jeito? Ele gostava de testar limites e foi por isso que deu um passo a mais em sua direção e mais outro, notando que ela continuava imóvel. Era um tanto engraçado como ela se fazia de durona apesar de estar toda montada como uma boneca. Poderia ser uma ótima amiga para Chaeyoung, aquela louca. Será que era um fraco da família Park se interessar por garotas insanas? Talvez fosse por isso que Jung Mi tivesse se sentindo atraído por aquela garota, se os boatos estivessem certos.
- Eu joguei? Tch - deu um meio sorriso. Incomodava a forma como ela falava, provocando um pouco apesar de estar em uma posição desfavorável. Não tinha medo não? De qualquer forma, agora estava explicado. Foi tudo culpa daquela maluca da filha do dono do Banco, que tinha acabado de incriminá-lo arremessando o broche. Com aquela carinha de santa… quem é que jogaria a culpa nela, não é mesmo?
Então o amigo de Jung se meteu na frente, e ele ergueu o rosto para enfrentá-lo, ficando mais sério, mas Gyu-Sik o tratava respeitosamente, como a pessoa mais velha que era, mesmo estando na mesma sala. Isso o acalmou um pouco. Então alguém ali sabia seu lugar. Sim, era um mal entendido. Mas não era culpa dele. Era daquela joaninha traiçoeira, que fez a bobeira e saiu voando. Ouviu o que ele tinha a dizer em silêncio, tendo o orgulho amaciado com sucesso quando ele pediu desculpas.
Hyun Hee assentiu, mas antes que falasse algo, a senhora Yeun apareceu em cena. Fez uma reverência respeitosa a ela quando foi citado e devolveu um meio sorriso. Trocou um olhar com Gyu-Sik. Compreendeu na hora que uma fala sua poderia fazer a menina ter os cabelos arrancados em plena Ópera ou algum tipo de castigo idiota, que no caso de seu avô poderiam ser bengaladas. Ele bem sabia como funcionava aquele código de aparências, só não sabia o que ela de fato sofria.
- Na verdade… - espiou Misoo por um momento e sentiu um pouco de pena da situação. Não fazia ideia realmente do que ela sofreria a seguir longe de seu olhar, mas sabia perfeitamente que uma pergunta como aquela era apenas um aval que estaria dando para que a mulher destratasse sua cria. Não era esse tipo de pessoa. Ainda que não se importasse.
- Eu só vim cumprimentar a senhorita Yeun por sua incrível beleza nesta noite. - fez um meneio educado para a garota e manteve o broche bem escondido no bolso do paletó. Deu um sorriso discreto, quase tímido, por ter ‘confessado’ seu elogio na frente da garota.
- Bem, meu avô está aguardando. Divirtam-se. - fez uma reverência breve e saiu do lugar.
Hyun Hee detestava aquele tipo de ambiente que tinha crescido. Quando era mais novo, na presença dos pais, nunca tinha sentido aquele tipo de pressão, achava-se acima de tudo aquilo, como se não acontecesse jamais com eles. Afinal, não era da parte exilada da família, não era bastardo, não era adotado, muito pelo contrário. Era popular, bom aluno, com uma boa namorada, esportista, família margarina, um hyung modelo. Por esse motivo nunca reparou ou tentou ajudar antes as pessoas que não estavam naquela situação, exceto, é claro, seu irmão, que sempre protegeu. Talvez fosse novo demais para captar aquele tipo de coisa, ou a mãe resolvesse protegê-los, mas era engraçado como bastava o escudo da presença dos pais sumir e de repente ele era atingido por todas aquelas situações sociais diretamente, o julgamento dos outros sem um filtro de adulto para consertar, tornando-se responsável por suas próprias ações, que por mais mínimas que fossem, ressoariam por um longo período… era complicado daquele jeito ser um herdeiro e agora, quando era quase um pária, que compreendia a importância de andar na linha, ou pelo menos parecer que andava.
Ninguém ligava realmente para quem tinha jogado o broche, apenas para quem
parecia que tinha jogado, ou quem era melhor de botar a culpa. A senhora Yeun não fazia a menor ideia de que ele tinha jogado garrafa nas pessoas, mas o tratava como um rapaz modelo, superior a sua própria filha, simplesmente por seu status de herdeiro. Ele poderia tê-la humilhado naquele momento e dito que Misoo teria jogado suco nele, sem nem ter um copo na mão, que a mulher provavelmente acreditaria. Era um sistema nojento daquele jeito.
Notar essa diferença de tratamento de quem sabia ou não o que ele tinha feito era o que começava a martelar algumas ideias em sua cabeça, especialmente quando encontrou o avô semi-orgulhoso e sorridente para ele. Ele mal desconfiava de toda a cena “vergonhosa” que tinha acabado de acontecer.
Não conseguiu sorrir de volta. Aquele sorriso não era para ele, mas para quem o avô achava que ele tinha se tornado, um neto modelo, não o rapaz que gritou com a filha do dono do Banco coreano e quase agrediu o filho do promotor. Assentiu apenas e seguiu. No fim, acabou sem falar com seus amigos naquele lugar, mas era melhor mesmo que isso não acontecesse por enquanto.
Hyun Hee já estava de saco cheio daquele evento cheio de situações as quais não queria enfrentar quando teve que encarar os pais orgulhosos de sua ex namorada. Lembrou-se imediatamente de um jantar na casa dela e do quanto eles tinham tudo para achar que a filha estava muito bem garantida com o herdeiro do império de produtos alimentícios. Tinha um pouco de receito de que a garota tivesse choramingado para o pai, então entrou um tanto cuidadoso, mas pela forma como eles o trataram, tudo ainda era segredo. Sorriu, educadamente e trocou meia dúzia de palavras elogiosas para a família Moon. Não podia simplesmente ignorar Eunjoo, então forçou seu sorriso mais cretino para ela e disse que ela era a jovem mais bela da noite, antes de sentar-se na fileira da frente.
Quando achou que tudo ficaria tranquilo e só precisaria aguentar mais algumas horas antes da festa, viu JongIn com sua nova presa no camarote da frente. Teria sido simples assim se essa garota não fosse Chaeyoung, que ele tentara inutilmente proteger. Estreitou os olhos, fechando a cara no mesmo instante em que houve o mínimo de aproximação. Jongin… esse puto.
Sentiu uma pontada na cabeça e percebeu que provavelmente já estava encubando aquela dor de cabeça que o acompanhava desde que tinha largado os remédios, mas não tinha dado importância para aquilo com tanta adrenalina correndo no corpo. Agora podia sentir o lado direito do rosto pulsando à vontade, talvez o perfume forte da ex fortalecesse o incômodo e a memória afetiva. Segurou o apoio da mão com firmeza, visto que a mão começava a tremer de ódio. Queria arremessar o amigo no meio do palco e arrancar Chaeyoung daquele lugar. Não lhe parecia nada errado agarrá-la pelo braço e tirá-la daquele camarote, embora soubesse que não podia fazer isso.
Sua única sorte naquele instante era que a ópera começaria de verdade e então ninguém repararia nos espasmos que sua bochecha dava em um tique nervoso. Após uma hora e meia, seu sentimento foi sendo distraído um pouco, ainda que ele tentasse, em vão enxergar o que acontecia naquele camarote.
Hyun Hee foi para aquele evento sem grandes expectativas, mas não era avesso à cultura. A história era de fato interessante e de alguma forma ele conseguia se colocar nela. Sentia-se no próprio inferno, em busca de liberdade, mas não tinha uma Beatrice para inspirar seu caminho. Esse fato o deixava melancólico durante todo o ato. O sentimento de afundar cada vez mais retratado naquele palco era mais efetivo do que a terapia a qual foi submetido. Um personagem fictício entendia sua dor. Quão surreal era isso? Sentia-se ouvido naquele meio e compreendia a metáfora visual do que tinha sentido naqueles dias, então assistia ao espetáculo como se fosse o próprio Dante, sofrendo sua própria infelicidade e caindo em uma tristeza profunda até a salva de palmas e o fim da primeira parte.
Quando as luzes acenderam para a pausa, Hyun Hee sentia-se um tanto letárgico. Não queria papo com a família Moon, muito menos Eunjoo ou qualquer pessoa. Sentiu necessidade de escapar daquele camarote o quanto antes. A cabeça ainda doía e o deixava parcialmente irritado. Estava com raiva da história porque não tinha uma Beatrice para inspirá-lo então isso tornava sua luta mais impossível de vencer? Fez uma reverência rápida aos familiares e saiu para passear no corredor, com o único objetivo de parecer ocupado e evitar conversas. Daria tudo por um remedinho agora.